Curso de Filosofia da Vida Prática - parte II
A complexidade da vida não se encontra nos múltiplos problemas que ela apresenta, pois que são eles, os problemas, inerentes ao próprio fato de se estar vivendo; do contrário não seria vida, mas qualquer coisa insignificante, vegetativa. Há, no ser humano, uma espécie de tendência à acomodação. A visão que procura enxergar além fornece, como consequência desta iniciativa, a energia necessária a novas descobertas na vida. Esta é a visão própria dos que deixaram rastros de sabedoria nas tentativas que fizeram, não para se destacarem, creio eu, senão como propósito de saírem da mesmice em que vive o ser humano comum.
As descobertas, os engenhos resultantes da incrível capacidade do cérebro humano estão aí, por todos os lados, dando prova incontestável do poder adormecido, somente à espera do sopro inicial da vontade. Decidir-se por avançar, de não aceitar as teorias já colocadas e aceitas como verdades definitivas deve fazer parte das principais iniciativas que levam a um tipo de esforço. Possui, a filosofia, como premissa insofismável, encher livros e mais livros que abarrotam as bibliotecas mundo a fora, oferecendo ao ser humano não mais do que ideias e pontos de vista de grandes sábios. Só o fato de serem considerados homens sábios já os diferencia da grande gama humana. Porém, não obstante o respeito e a admiração por esses homens diferenciados, tudo o que emitiram de forma oral ou escrita, continua sendo o ponto de vista de cada um deles. Muito respeitado e, por que não, aceito, mas ainda um ponto de vista, uma opinião. Como não deixa de ser, o mundo, da forma que se encontra, em evolução, resultado daqueles que fizeram a diferença, tem-se, na filosofia séria, um verdadeiro guia do presente e abençoada luz para o futuro dos homens.
Portanto, o estudo criterioso e contínuo deve fazer parte da vida dos que, insatisfeitos consigo mesmos, desejam ir além em conhecimento. Muitos não darão a mínima às grandes questões existências; parecem satisfeitos com o mundo e com sua forma de evolução. Esses não devem ser julgados e nem censurados, pois, dentro da lógica de que é falta a própria filosofia em si, não é inadmissível que estejam certos em suas atitudes. Querem simplesmente viver e extrair desta vivência o máximo de gozo e de felicidade. Não deixam de ter suas razões, posto que felicidade vem a ser, no final de todo e qualquer esforço, a meta final do ser humano. É extremamente difícil, senão impossível avaliar o verdadeiro sentimento do outro. No meu lado não consigo imaginar um ser criado, pois admito a existência de uma inteligência superiora, em algum momento da vida, não questionar sobre si mesmo e sobre os mistérios ou origem de sua própria criação.
Mantendo a opinião lógica e coerente de que todo efeito resulta de uma causa que o gerou e toda criação parte de uma origem criadora, vejo-me no direito de questionar essa origem, essa causa primária. Jamais terei a intenção de ir contra a investigação puramente científica cujo princípio norteador se baseia nas provas que surgem diante dos olhos. Mas, quantas e quantas vezes não esbarra a ciência nos limites da sua própria investigação? Quantos, cegos pela metodologia puramente racional e exata, não ficam pelo caminho, vencidos pela encruzilhada do desconhecido? Bastaria a estes uma ligeira aceitação do imponderável e ilógico do ponto de vista puramente científico. Quem sabe não estaríamos muito mais adiantados em sabedoria e, por que não? Em avanço científico, se os grandes manipuladores das ideias científicas dessem a si próprios uma chance de investigação afora os padrões aceitos como únicos e intocáveis? É sabido, por experiência comum a todos, que os fenômenos invisíveis são, por sua natureza desconhecida e misteriosa, imunes ao controle e domínio da força humana limitada.
Quem pode prever a atuação dos ventos, das águas e de outros tantos elementos da natureza? Não seria isto uma prova insofismável de um poder superior que observa, julga e impõe sua lei sobre os homens?
O ser humano carece da verdadeira sabedoria. Vive iludido pela roda dos acontecimentos ordinários da vida e não enxerga além. Para ele, perder tempo com questões que não dizem respeito ao imediato ou que não trazem, em suas confrontações, alguma espécie de vantagem material, não vale o esforço e a atenção. Investigar, através da filosofia ou mesmo da religião, as possibilidades de uma existência rica, geradora de uma felicidade diferenciada, cuja conquista englobe, além do conforto material, bens eternos e verdadeiros, deveria fazer parte de todo esforço humano. A sede de conhecer o desconhecido só pode acrescentar à vida sabor e esperança. Tão vasta é a possibilidade de enriquecimento para quem se propõe a deixar de lado a mediocridade e enveredar por caminhos inóspitos e ainda virgens! Quão pouco é usado o poder do cérebro e beira ao nada as tentativas de aprofundamento nos mistérios da mente humana. A própria ciência se ufana das pesquisas e descobertas acerca do corpo físico do homem e vai a uma distância infinita de conhecer, um pouco que sejam, os caminhos que levam à descoberta dos demais corpos desse mesmo homem. A mente, esta complexa fábrica de ideias e criatividade que jaz ainda adormecida, está infinitamente longe de ser conhecida. Os estudos sobre ela vêm de décadas apenas e muito pouco ou quase nada ainda se sabe.
Vivemos em um mundo inacreditavelmente complexo e desconhecido. Tratar de assuntos filosóficos não se restringe a questões meramente transcendentais. O interesse metafísico sempre fará parte das aspirações do homem. Contudo, há, no universo visível lacunas sondáveis, passiveis de estudo sério e aprofundado. Os grandes desbravadores do passado nos deixaram a herança de seus esforços ao tornar conhecido, na geografia do mundo, o que sequer imaginávamos existir. Comparados aos filósofos, são os pioneiros das descobertas que mudaram a face do mundo palpável, da mesma forma que aqueles lutam por nos tornar evidente ou ao menos possível, uma existência rica e feliz a quem se dispuser a procurar por ela. E onde se encontra essa existência? Certamente não está no aspecto do mundo tal como o concebemos; repleto de miséria, doenças e guerras. Pode não estar no aspecto do mundo que concebemos; sendo assim, faz-se necessário conceber outro mundo que não seja este, repleto de sofrimento. Parece uma questão difícil, se analisada pelo senso comum, característica do homem comum. Todavia, desviando o pensamento da imagem do mundo que conhecemos e procurando, metafisicamente focá-lo em um mundo superior a este, tem-se a chance de vislumbrar uma verdade próxima da verdade universal. Urge deixar esclarecido que esta possibilidade encontra-se aqui, no planeta em que habitamos e não em qualquer outro local possível após a morte do corpo físico.
Não existe ser humano, a não ser um louco, que não deseje a felicidade, mas achar que felicidade se encontra em outra vida, que está só é feita de sofrimentos e desgraças já é um passo certo à ruína da existência. À medida que o mundo progride, a humanidade aprende com suas próprias experiências. A guerra é a maior de todas as mazelas. O pensamento otimista visualiza um mundo onde viver em paz e feliz será regra básica. Os esforços da ciência em melhorar o planeta são recebidos sempre com grande alegria porque diminuem o sofrimento. Não é difícil imaginar um mundo onde ciência e religião possam trabalhar em conjunto para o bem geral. O que causa o retardamento dessa boa nova é a mente do homem moderno que ainda não se encontrou com sua verdadeira essência. Há os que acreditam em Deus e os que não acreditam. Essa questão tende a se tornar insignificante no futuro. Baseio essa afirmação na certeza de desenvolvimento do homem como espécie superior. Tudo evolui; num passado remoto havia o homem selvagem que sequer exprimia palavras inteligentes, mas urros de animal. Baseada nisso, a ciência antropológica criou o conceito do homem macaco; começou daí o confronto entre ciência e religião.
Situando agora, como um ser especial, o homem religioso que acredita num criador invisível tem-se a base para as discordâncias. Lutas religiosas, rivalidades de toda espécie marcaram a história do homem sobre a Terra. Pode-se chegar à conclusão de que as religiões sejam a causa primordial do sofrimento humano, mas não é isso. Há um caráter selvagem que permeia o interior do homem e a religião é a forma mais eficiente de controlar esta tendência. O que precisa ser esclarecido é que, por trás dessa necessidade de controle existe a preexistência de um caráter; saber o que fez esse caráter, o que moldou a diferenciação entre um ser humano e outro é que constitui o x da questão. As ciências da mente procuram até hoje resolver a miríade de tendências da mente humana. Penso que se essas ciências colocassem a questão religiosa no centro dos seus estudos elas teriam mais sucesso com as pesquisas. O homem é, por natureza, um ser debatedor, gosta de criar oposições, e para fugir a essas oposições ele se reprime; aí se encontra o atraso na evolução. Somos, por natureza, propensos a fazer críticas, mas dificilmente queremos aceitar as críticas quando elas se voltam em nossa direção, mesmo que sejam para o nosso próprio crescimento. Assim como é no individual também ocorre no universo. A Terra já se encontra em tempo de abrigar seres altamente evoluídos. Os grandes homens trazem sabedoria suficiente para fazer desse mundo um centro de aprendizado para outros de menor evolução. O que acontece é a interferência de ações discordantes com as grandes metas.
A crucificação de Cristo, as grandes rivalidades religiosas que resultaram em massacres, a inclinação para a guerra, tudo tem raiz na fraqueza mental. Materialismo e espiritualidade são termos relativos porque dependem da forma como são conduzidos. A mente humana pode alcançar estágios de superioridade que transcendem toda forma de compreensão. O hábito de rotular os comportamentos precisa dar lugar à aceitação passiva e à disposição para a investigação. Estando dentro da normalidade, do que é saudável e aceitável pela sociedade em geral, precisa ganhar chance de se deixar mostrar e acompanhar os verdadeiros benefícios que trazem para a evolução do homem. Filosofia é o conjunto de ideias de homens considerados sábios e que deixaram sua marca no mundo. Logo, deve haver algo de positivo no que escreveram. Volto à verdadeira essência do ser humano. Há uma origem para todas as coisas; o universo não foi criado por uma acaso e nem existe por existir. Está em constante evolução; tudo que nele existe está sob sua influência e nós somos parte do universo. A individualidade é uma maneira de o criador distribuir sua criatividade a todos os homens. Tudo passa a ser muito simples quando analisamos com naturalidade. A finalidade do homem é alcançar a felicidade e ele só conseguirá cumprir o seu propósito se andar em conformidade com as leis do universo. Parece muito claro e óbvio e realmente é. E aí vem a pergunta: e a força do mal, de onde vem?
Tudo que diverge da senda evolutiva e que cria entraves para a evolução do planeta pode ser considerado um mal. Como o homem é criativo ele consegue conviver com o mal. Estaremos posicionados entre os mundos superiores, fazendo parte deles e usufruindo toda felicidade inerente a esses mundos quando conseguirmos, não simplesmente evitar ou conviver com o mal, mas exterminá-lo completamente. É minha convicção que existem mundos assim; e não são poucos, o universo está repleto deles. Diria que os realmente crentes já podem adentrar nesse mundo e desfrutar de tudo de bom que ele pode proporcionar. Isto pode causar a impressão de uma verdadeira Utopia, um sonho impossível de ser realizado, algo fora do comum. Quando se fala em criatividade tem-se a impressão de uma mágica que vai transformar em realidade o que todos julgavam impossível. Mas trata-se de um processo normal de aplicação correta das leis universais. Viver é confrontar-se com opções de praticar o bem ou o mal. Se escolhermos este último teremos uma vida infeliz, mas se optarmos pelo bem seremos felizes. Às vezes somos vítimas de pessoas más, mas isso não quer dizer que a maldade exista de fato. Um mundo realmente evoluído significa um mundo isento de toda forma de mal. Ao compreendermos que o ser criador do ser humano deu a ele uma mente dotada de inteligência, passamos também a ser responsáveis por utilizar essa mente de forma a fazer brotar nela a inteligência superior. Esse tipo de inteligência admite um ser perfeito coordenando um mundo cuja premissa é o bem sob todos os aspectos. Sendo assim tudo o que for feito e pensado deve resultar em bem exclusivamente. E o ser evoluído é responsável por toda e qualquer onda de pensamento e, em consequência disso, por todo e qualquer fato que lhe acontece, de bem ou de mal.
Não é difícil imaginar, no futuro, um mundo completamente isento do mal. A conduta do ser humano está diretamente ligada a sua natureza interior. Aperfeiçoando esta natureza o homem não mais terá do que se envergonhar. Esse raciocínio não deixa de ser lógico; é apenas resultado do reconhecimento do homem como o mais evoluído de todas as espécies. Isto não é por acaso. Falar em Deus é o mesmo que referir-se a uma inteligência superior que ordenou o universo e atribuiu ao homem o topo da escala. O homem consegue pensar, consegue intuir um criador. O crescimento é condição inerente à vida. Chega a ser óbvio o fato de o homem estar caminhando em busca da sua própria perfeição. Isto é tácito e evidente em todos os processos que a esfera terrestre sofreu até os dias de hoje. O que faz o homem ainda cometer atos abaixo da sua condição de criatura superior é a crença errada. O planeta abriga uma soma incontável de elementos ignorantes que não participam do desenvolvimento; tudo o que querem é viver à sombra dos esforçados. Este é um dos maiores fatores do atraso. Se houvesse uma maior contribuição no sentido de apoiar as iniciativas dos grandes homens o mundo avançaria com maior rapidez. Todos têm como missão contribuir com o que é elevado e digno de ser copiado.