ABISMO SALGADO DOCE AZEDO AMARGO
Primeiro ato.
Era tudo o que eu precisava.
Não. Era só o que eu precisava.
Nada mais.
Ninguém mais.
De repente, fazia sentido acordar, sorrir, comer, dormir, pra logo acordar e dizer pra mim mesma: Era só o que eu precisava.
Segundo ato.
Era só o que eu precisava?
De repente a dúvida surgiu. Quando tudo mudou. Quando a pessoa nao mais sorriu. Ao me ver. Me tocar. Tocar?
Nem me tocava mais. Nao me falava mais. Sobre tudo, o mundo, as cores, o fundos, o tédio, silêncio e logo... as dores...
Só se falava nela, nos problemas, dores, amores e nunca mais amoras, que antes davam o sabor doce, salgado, azedo, amargo e por fim, gosto de nada. O gosto de silêncio ao mastigar e até, ao falar. As bocas se moviam, mas não havia som algum.
Terceiro ato.
Porque ainda estou aqui?
Porque ainda me importo?
Talvez, por me importar demais com o outro
Talvez por importar pra dentro de um lugar onde eu mesma, nao me importo
Fico alí, fixa e imóvel.
O outro é quem pode me mover e me importar pra dentro dele. Mas ele põe os pés sobre, limpa ao redor, faz tiro ao alvo, mas nem sequer me olha. As vezes, é como estar num iceberg. Eu. E o outro, num bote, logo ao lado. Um calor, ou, alguns chamam de raiva inconciente-conciente, faz com que o meu único porto seguro se vá aos poucos, e cada centímetro derretido, dói, e por mais que grite, chame, fale, chore, o bote do outro, parece confortável demais, blindado demais.
Quarto ato.
De repente, um dia, quando abro os olhos, só o que vejo são: Outros botes. Outras pessoas. Eu não quero vê-las. Mas vi. Não quero me interessar. Mas, quando foi mesmo que aquele bote, criou um abismo tão grande que, do meu lado, haviam sorrisos pra mim, flores, amoras, amores?
Do lado do outro, parecia haver o mesmo, mas que atingia outra direção.
Mas, me pergunto o motivo, de um dia, estarmos exatamente, um na direção do outro e agora, não existirmos. Somos estranhos. Me pergunto se o outro sente o mesmo em relação a mim. Me pergunto pois, se sentisse, era sinal de que ao menos eu ainda existia, seja na lembrança ou na vontade de esquecer.
Ato final.
O fim?
Me pergunto, como o outro deixou isso acontecer.
A culpa é do outro. Aliás, a culpa é de quem começa a relação ou de quem termina?
A culpa é de quem deixa acontecer ou de quem evita tudo só com silêncio?
A culpa...é minha?
Também.
Mas culpa é uma palavra forte demais. Nao matei ninguém, nem prejudiquei ninguém além de nós.
Responsabilidade. Essa sim, é minha. É nossa.
Fomos responsáveis?
Ainda somos?
Ainda seremos?
Talvez, eu ainda possa usar pedaços do meu iceberg pra chegar ao outro. E talvez, ele queira o mesmo.
Mas, não posso esperar o abismo entre o orgulho e a responsabilidade em ainda fazer daquilo algo durável, ser consertado com palavras apenas.
Posso pular em seu bote com meu iceberg e enquanto derrete, afundarmos juntos em meio as discussões caladas-internas ou pedir socorro ao outro.
Vou chamar de bismo, a ponte que vai nos fazer sorrir e enfim dizer: Entre nós sempre há bismo, amora, amorismo.
OBRIGADO POR LER.