A PRESENÇA DE ELIS OU O DIA EM QUE ELIS REGINA FOI FAZER UMA INALAÇÃO
Uma clínica na esquina da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, próxima à Rua 13 de Maio. 1977. No Teatro Bandeirantes, ali na Brigadeiro, o show “Falso Brilhante”.No Hospital Infantil “Menino Jesus”, na Rua dos Ingleses ali perto, eu fazia a Residência Médica em Pediatria. No coração, a ânsia pelos anos que viriam, desconhecidos, aterradores, e aos 25 anos, a nostalgia da juventude, com a consciência de uma mudança de ciclo. Sim, porque a partir do próximo ano, eu deixaria de ser médico residente para encarar a vida e a profissão com meus próprios meios, sem a assessoria dos mestres e monitores.
Economizando do parco ordenado de médico residente, eu já fora ver Elis duas vezes no show. E a cada apresentação, o êxtase, a vontade de ver de novo aquela mulher pequena com uma voz enorme, dona de técnica ímpar e sensibilidade que arrebatava os meu coração a cada interpretação de “Tatuagem” ao lado do teclado do marido, César Camargo Mariano. Voava no sonho quando ela abria os braços cantando “Gracias a la Vida” e como jovem daquela época, me identificava com “Como nossos pais”, um rock de Belchior.
Para aumentar um pouco meus ganhos, na hora do almoço eu ficava na clínica pediátrica existente na esquina da Pedroso com a Brigadeiro enquanto os médicos iam almoçar.
Um dia, ao entrar no consultório, havia uma ficha sobre a mesa. Li o nome que estava escrito no envelope: Elis Regina Carvalho da Costa. Pensei: esta criança tem o mesmo nome da Elis. Abrindo a ficha, vi a identificação da paciente: profissão, cantora. Senti um frio no estômago. Eu estava com a ficha clínica da Elis Regina nas minhas mãos! Li o histórico feito pelo colega que estava de plantão na noite anterior: “paciente está dando um show no teatro, está rouca, e quer fazer uma inalação.” Pulei da cadeira e chamei a enfermeira.
- A Elis esteve aqui ontem à noite?
- Esteve, e quando o doutor lhe disse que aqui é uma clínica pediátrica, ela disse: me atende, eu sou pequenininha...O doutor atendeu. Ela queria fazer uma inalação.
Fiquei com ficha em minhas mãos todo o tempo que permaneci na clínica. Voltei para o hospital certo de ter vivido a mágica de ficar o mais próximo possível do meu ídolo, a maior cantora do Brasil.