UMA LENDA SOBRE A BELEZA

“O belo é a unidade na variedade”

No livro sagrado, que os sábios intitulam “O Lótus da Lei Perfeita”, encontrarás, meu amigo, depois da décima quinta página, uma lenda esquecida pelos homens, apesar de estudada por sete profetas. Refiro-me à Lenda da Beleza que venceu o Tédio e conquistou a vida.

Certa vez, por um triste capricho da Fatalidade, o poder do mundo foi cair nas mãos odientas da Vulgaridade.

Que fez a Vulgaridade ao subir ao trono? Resolveu destruir e aniquilar a sua perigosa rival — a Beleza.

Chamando o Tédio, seu servo predileto, disse-lhe a execrável soberana:

— Detesto a Beleza! Quero fazê-la desaparecer da face da terra. Tens ordem para pendê-la e matá-la de qualquer modo.

O tédio respondeu:

— Escuto e obedeço senhora! Mas, afinal, como é a Beleza? Como poderei encontrá-la, se não a conheço?

— Ora, nada mais simples — tornou a Vulgaridade. — Interroga um poeta qualquer e logo saberás como é a Beleza.

Partiu o Tédio. Encontrando um poeta interpelou-o:

— Como é a Beleza?

Sem hesitar, respondeu o poeta:

— Ainda ignoras? A Beleza é loura, de olhos azuis da cor do céu; a sua pele é clara e rosada, as suas mãos...

— Basta! Tudo o mais que disseres seria fastidioso e inútil. Já sei como é a Beleza! Vou descobri-la por mais oculta que esteja.

E o Tédio partiu em busca da Beleza...

Depois de muito caminhar, chegou ao país de Moab, para além do grande deserto. Um camponês repousava sob uma árvore.

— Terás visto, por aqui — perguntou o Tédio — a Beleza que procuro?

— Queres descobrir a Beleza! — exclamou o camponês. — Ei-la precisamente ali, ó forasteiro!

E apontou na direção de uma jovem que se encaminhava para a ponte, levando ao ombro um pequeno cântaro.

O Tédio procurou certificar-se. A graciosa moça era morena, de olhos verdes e cabelos castanhos como as filhas de Judá! Mas como diferia da que fora descrita pelo poeta! Não, não podia ser a Beleza!

— A Beleza fugiu para a China! — informou um peregrino.

Seguiu o Tédio para a China e indagou de um rico mandarim que soltava papagaios de seda:

— Senhor! Teria a Beleza aparecido em vossa terra?

— Apareceu, sim — replicou alegre, o mandarim. — Ei-la!

E com o seu dedo de unha longa e angulada, apontou para uma moça ocupada em fabricar lanternas de papel.

O escravo da Vulgaridade preparou-se para executar a ordem que recebera. Enganara-se, porém, o informante. A jovem que o mandarim indicara era pálida, esguia, tinha os olhos amendoados, os cabelos negros e ondulados. Não; aquela não podia ser a Beleza!

O Tédio deixou o país dos chineses e foi em busca de outros climas. Diante dele a Beleza fugia sempre, ocultando-se astuciosamente. Todo o seu esforço tornou-se inútil. Não conseguiu encontrar e destruir a Beleza!

Mas a eterna e incomparável Beleza só a encontra quem a procura com sabedoria. Sigam esse conselho meus amigos e amigas:

— Eis por que a Beleza floresce e domina, sob aspectos tão diversos, quando a observamos, nos inconquistáveis recantos e países do mundo. Aqui é morena e tem olhos negros, mais adiante é loura, de claros olhos de anil. Aqui é viva e alegre, para, além, surgir sentimental e terna!

É que a Beleza, para fugir do mal do Tédio e ao perigo da Vulgaridade, varia sempre e sem cessar.

In: MINHA VIDA QUERIDA, p. 185 a 188.

Malba Tahan
Enviado por Camilamsn em 04/06/2019
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