A PRAÇA DOS NOVIÇOS

Novamente o bruxo José Moreira está na praça dos noviços em Poesia. Sim, porque não há como falar em veterano para este bardo que nos vem legando sua palavra lírica.

Dentro dele há um menino sapeca que nos encanta, mercê de seus oitenta outonos. Permeia em sua inteligência de moço-velho tal inquietação espiritual que nunca se sabe como vem o poema e nem a sua temática e roupagem.

É um cata-vento marinho esse pernambucano agauchado. Tão forte é o canto desse pássaro benfazejo que os dias são benesses para os seus milhares de amigos e admiradores.

A poesia moreiriana não se ajusta a nenhuma escola, a nenhum tema destacado ou prevalente enquanto fático, capaz de ser apalpado pelo lugar comum da vida e suas mazelas.

Ele, o serelepe octogenário, sempre está em estado de graça, que é o único que pode vir a produzir um poema com o sotaque popular, meio disrítmico, sem preocupações com formatos.

Em tudo o autor percebe e preconiza o Amor. Este é a sua mola-mestra. Mas não me parece tema prevalente, como já disse acima. Este estado de poesia é a figuração humana da criatura em sua “ars amandi”, não meramente restrita ao ato de amar a luxúria.

Para Moreira, arauto de coisas e fatos, às vezes efêmeros, vezes outras com gosto de permanência, tudo é sacralizado numa visão que majoritariamente se encontra na obra de Vinicius de Moraes: a pátria é mulher, a relva úmida é fêmea, a cidade é fogosa em suas entranhas, ruas vivas de amores e sofrimentos.

Neste livro estranho, formoso e desarticulado quanto a efeitos desejados na cabeça do leitor, a adolescência fálica está nítida.

No entanto, “Do coito das águas/ com a pele nua/ nasce um novo ser/ de calor e sal,/ borbulhante de vida,/ que transcende as palavras”.

E ponha-se em relevo: a palavra está se reconstruindo no coração fogoso de sua terra de frevos, zabumbas e miçangas. É o mar de Olinda no contato corpo-a-corpo.

E “O vento brinca com seus cabelos”, enquanto o personagem lírico “embarca no trem do dia,...”.

(texto publicado nas ‘orelhas’ do CICLO DOS AMANTES, Porto Alegre: Caravela, 2007).

– Do livro DICAS SOBRE POESIA, 2007.

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