Janeiro Peludo

Tem causado certo furor nas redes sociais a notícia de que algumas mulheres criaram um movimento que pode ser entendido como “janeiro peludo”, no qual decidem assumir os pelos que possuem, em vez de continuamente depilá-los. As reações principais têm sido das mais virulentas, inclusive por parte de mulheres. Alguns invocam questões estéticas, mas outros, percebendo que este é um argumento frágil, passam a falar em questões higiênicas.

A higiene pode, de fato, ser um argumento a se considerar na decisão de manter ou não os pelos pelo corpo, mas unicamente se ela não se restringir ao sexo feminino. Ao que me consta, no entanto, os homens têm sido livres, inclusive, para não serem higiênicos. Homens têm mais pelos e, de maneira geral, não veem problema nisso. A sociedade os aceita peludos como são, mesmo que isso não seja tão bonito esteticamente ou que não seja muito higiênico. A cobrança, pois, recai unicamente sobre as mulheres.

Por isso, considero que esta é uma campanha justa. Não se trata de uma campanha para que todas as mulheres, subitamente, passem a deixar os pelos do corpo crescerem, pois isso seria unicamente trocar um padrão pelo outro. O que elas querem, se bem entendi, é a liberdade de escolher ficar com seus pelos, se não tiverem vontade de eliminá-los. No que estão cobertas de razão.

Imagine você, homem, você que não tem a obrigação de parecer bonito para ninguém, o aborrecimento que seria se submeter continuamente à depilação, apenas porque o “padrão” da mulher é esse, muito embora ninguém saiba quem foi que o estabeleceu. Provavelmente, em algum momento você relaxaria e iria querer deixar os pelos mesmo. Pois as mulheres não têm esse direito. Elas serão mal vistas e ridicularizadas se, por um único dia, exporem em público os seus pelos. Você, homem, pode se depilar se quiser, pode não se depilar, pode fazer o que quiser e ninguém irá falar nada a seu respeito. O que as mulheres parecem querer é, também, o direito de, se quiserem, não ter ainda mais essa preocupação com a aparência, que ocupa tempo precioso.

Os argumentos referentes à suposta falta de “beleza” que teriam as mulheres com pelo não conseguem resistir a uma análise mais antropológica. Se hoje a mulher com pelos não parece tão atraente é, unicamente, porque somos herdeiros de uma cultura em que a mulher não tem pelos. A partir do momento em que muda uma cultura, mudam-se, também, os gostos. Se uma mulher com pelos é um dos preços a se pagar para a maior liberdade feminina, eu me submeto.

Reforçando que se tratará, sempre, de uma questão de escolha. Penso que o ideal seria um estágio em que ter ou não pelos fosse uma questão tão pessoal quanto cortar o cabelo desse jeito ou de outro. Podemos preferir um cabelo curto ou comprido, mas não rejeitamos socialmente os que possuem um cabelo de um jeito que a gente não costa.

Poderíamos muito bem agir também dessa maneira em relação aos pelos. A vida já é um fardo pesado demais para que ainda nos sobrecarreguemos com mais esse.

Que as mulheres sejam livres para tê-los ou não.

Frederico Milkau
Enviado por Frederico Milkau em 08/01/2019
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