Etimologia da Língua Portuguesa Nº 144

Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva Nº144.

Carteira, hoje designando entre outras coisa pequena bolsa de couro para guardar documentos e dinheiro, veio do Grego khartes, folha de papel. Jeitinho, segundo se diz, “especialidade brasileira”, formou-se de jeito, do Latim jactu, declinação de jactus, jato, arremesso, aparência e aspecto.

Acender: do Latim accendere, queimar, iluminar.Veja-se que está presente neste verbo o mesmo étimo de candeia, vela, lamparina, e também árvore, cujo pau seco dá boa luz, sem fumaça. O verbo está presente em numerosas expressões, como em “ ânimos acesos”, isto é, exaltados, e em “acender uma vela para Deus e outra para o diabo”. A expressão veio da França para Portugal, e daí ao Brasil, mas os personagens foram trocados: na França, diz-se acender uma vela a São Miguel, outra à sua serpente.

Bombástico: do Latim, medieval bombax, algodão, pelo Francês antigo bombace, e daí ao Inglês bombast, servindo o adjetivo bombastic para qualificar a linguagem empolada, sem conteúdo, como as mangas estufadas dos vestidos de algodão. Pode ter tido influência de um dos sobrenomes do médico e alquimista suíço Teofrastus Bombastus von Hohenheim, mais conhecido por Paracelso(1493-1541), porque suas teorias, contrárias à medicina em vigor, produziam polêmicas. Mas bombástico mudou de significado pela semelhança com bomba, do Grego bómbos, ruído do trovão e das tempestades, e máquina para elevar a água, que deu a bomba hidráulica no Português , e do Latim bombus, zumbido das abelhas. Como bomba veio a designar também artefato explosivo, a notícia em destaque, anunciada por antigos jornaleiros, passou a ser chamada bomba, dando bombástico para um assunto que mexe com a vida de muitos .

Carteira: do Grego khártes, folha de papel, originalmente feita de entrecasca do papiro, pelo Latim charta, já designando não só papel, mas também documento e mapa. Carteira tomou no Português dos primeiros tempos o significado de bolsa de couro, de tecido, de papel ou de outro material para guardar joias, documentos, dinheiro. O formato dos primeiros bancos escolares, uma caixa com tampa, sob a qual eram guardados livros, lápis, cadernos etc., ensejou que a mesma palavra os designasse: carteira . E, como os documentos pessoais fossem acomodados em bolsas pequenas, estas também tomaram o nome de carteira de identidade, carteira de motorista, cujas variantes são carteira nacional de habilitação e cédula de identidade. Um dos primeiros dicionários de Português define carteira assim: “ É uma boceta fechada com chave dentro, na qual se mandam cartas de segredo”. Como depois a palavra se tornasse palavrão, passou a ser substituída por outras, como caixa e carteira. Até o mito passou a ser designado caixa de Pandora, quando na verdade o recipiente se parecia com jarro, sendo conhecido em Portugal por jarro de Pandora, a primeira mulher, que, contrariando ordem divina, abriu a caixinha, soltando todos os males, menos a esperança, tida por um mal também porque pode nos enganar a respeito do futuro. Carteirada e carteiraço designam abuso de autoridade mediante o constrangimento imposto por autoridade.

Fértil: do Latim fertile, declinação de fertilis, indicando a fecundação, seja da terra e dos animais, seja das pessoas. A infertilidade de muitos casais levou ao surgimento de clínicas especializadas em fecundação assistidas.

Jeitinho: de jeito, do Latim jactu, declinação de jactus, jato, arremesso, lançamento, aparência, feitio, aspecto. No grau normal está presente em expressões como: “tem jeito de anzol” (parece-se com anzol), “tem jeito para a coisa” (oficio em que a pessoa é hábil), “faz tudo com muito jeito” (com cuidado), “deu um jeito no problema” (encontrou a solução), “vai com jeito” (vai com cuidado). Diz-se ainda no aumentativo, “olha o jeitão dele”. Mas é no diminutivo que se consolidou como recurso e marca do brasileiro., ao designar modo habilidoso de resolver um , o problema, raramente de forma lícita, o clássico jeitinho.

Ponta: do Latim puncta, estocada, picada, mas também extremidade de alguma coisa, como ponta de espada. Está presente em expressões como “ter a lição na ponta da língua” sabê-la bem; “andar na ponta dos pés”, andar com cuidado, para não ser percebido; ponta de estoque restos de mercadoria; segurar as pontas , resistir.Esta última terá nascido das lides náuticas e da pecuária e da pecuária, por designar ato de segurar as pontas ou das cordas às quais está amarrado o barco ou segurar os laços onde estão presos os animais, especialmente os rebeldes, na doma.

Deonísio da Silva da Academia Brasileira de Filologia, é escritor, doutor em Letras pela USP, professor( aposentado ) pela UFSC (SP), autor de textos e vídeos da Universidade Estácio de Sá (RJ), diretor-adjunto da Editora da Unisul (SC) e colunista da BabdNews, com Ricardo Boechat e Pollyanna Bretas. Alguns dos seus romances e contos foram publicados também em Portugal, Cuba, México, Alemanha, Suécia etc., e é autor de De Onde Vêm as Palavras (17ª edição ). www.lexikon.com.br

Revista Caras

2014

Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 16/11/2018
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