Thomas Piketty x Nassim Nicholas Taleb
Thomas Piketty: Quem é
Thomas Piketty é um economista, um acadêmico conceituado. É autor do estudo mais completo a respeito da desigualdade já feito. Seu estudo levou em consideração todas as séries históricas confiáveis sobre concentração de renda. O estudo se concentrou nos países com a séries de dados mais antigas. A após a revolução francesa a França passou a registrar as propriedades com bastante cuidado - a fim de realizar a herança de acordo com as leis do novo regime. Inglaterra, EUA e Alemanha também tem séries históricas antigas. Com base em seus estudos Piketty desconstrói a visão anterior. Antes do seu livro, o ‘Capital no século XXI’ acreditava-se que o capitalismo era suficiente para diminuir as desigualdades e trazer a democracia. O maior estudo sobre desigualdade até então era o de Simon Kuznets. Ele defendia que a concentração de renda era maior nos estágios iniciais do capitalismo. À medida em que a educação aumenta e os profissionais qualificados se tornam mais disputados a concorrência pela mão de obra pressionaria os salários para cima. Assim, em estágios avançados do capitalismo, a concentração de renda diminuiria. O estudo extenso e minucioso de Piketty mostrou que o capitalismo (em sua normalidade) leva à extrema concentração de renda. A situação em que o capitalismo levou à prosperidade e razoavelmente bem distribuída foi a do pós-guerra. Uma situação extraordinária. A partir desta percepção Piketty dá sugestões de como o mundo deve ser gerido para que a desigualdade de patrimônio (e de poder) seja controlada em benefício da sociedade: um imposto global.
Nassim Nicholas Taleb: Quem é
Nassim Nicholas Taleb é um livre pensador. O livro que mais o ajudou em sua formação foi escrito por um jornalista na iminência da guerra do Líbano. Enquanto lia percebeu que ninguém previa a sucessão de eventos catastróficos que devastou seu país. Isto contrasta com a narrativa histórica. Historiadores retrospectivamente, desenham uma cadeia de causa e consequência. Assim criam a ilusão de que seriam, caso um observador tivesse as informações suficientes, possíveis de serem previstos. Nos EUA ele foi trabalhar com gerenciamento de riscos. Momento em que desprezou as tentativas de economistas que faziam previsões sobre como o mundo será. Para Taleb o futuro é opaco. O mundo é desenhado por eventos extraordinários e imprevisíveis (os quais chamou de ‘cisnes negros’). A situação normal esconde potenciais cisnes negros. Tornar os métodos de análise mais sofisticados apenas fazem com a instabilidade seja estocada e se torne prejudicial. O método de Taleb se revelou recompensador, a cada crise ele enriquece. Seu sucesso trouxe liberdade e notoriedade. Sua coleção de livros ‘Incerto’ tratam sobre os motivos pelos quais o futuro é imprevisível, sobre o que pode ser feito para tirar proveito da aleatoriedade e de como a ética deve ser levando em conta a aleatoriedade/imprevisibilidade do mundo.
Thomas Piketty: Método e Recomendações
Como acadêmico Piketty tem preocupação metodológica. A força de suas afirmações vem de embasamento de dados escolhidos e depurados através do rigor da metodologia acadêmica. Caso um leitor queira poderá conferir e questionar as fontes. Piketty apresentou uma narrativa do capitalismo extremamente diferente da predominante até então: mostrou que a concentração de renda caminha para ser tão grande quanto foi no antigo regime francês. Mostrou que a correlação entre renda e mérito é pouco intensa no topo da pirâmide: herança e rendimento de investimentos são a maior fonte de aumento de riqueza. Os salários do alto da pirâmide também são extremamente altos por motivos políticos mais do que por mérito - são os próprios executivos do topo que decidem seus salários. Piketty identifica o problema: a renda é extremamente desigual e esta desigualdade é dissociada de benefício social. A concentração de renda vai em direção de um planeta controlado por uma pequena oligarquia de pessoas extremamente ricas e poderosas. A recomendação de Piketty vai no sentido de um governo mundial: com imposto mundial.
Nassim Nicholas Taleb: Método e Recomendações
Taleb é um livre pensador. A força de suas afirmações parte de sua lógica. Os dados que apresenta em seus livros são erráticos, são apresentados de acordo com o devaneio que decidiu escrever na hora. A credibilidade de suas afirmações parte do seu sucesso pessoal como gerente de riscos e da coerência de sua lógica. Taleb faz duras críticas a acadêmicos e burocratas: as pessoas devem compartilhar o resultado das decisões que tomam, caso suas decisões impliquem consequências apenas para terceiros devaneios utópicos os levam a decisões temerárias. Foi o caso quando especialistas aconselharam a criar uma democracia no Iraque: a democracia criada levou a mais violência do que a ditadura de Saddam Husseim. Também é o caso de quando bancos centrais atuam para salvar um banco que está em vias de falir: o BC transfere a fragilidade de uma empresa para o sistema. A recomendação em relação a Estados é que sejam pequenos, de maneira que a comunidade possa gerir a si mesmos. Isto traz uma quantidade maior de erros, mas faz com que cada erro seja pouco prejudicial. Como diz no livro Antifrágil: é impossível o surgimento de um Stalin na Suíça.
A fraqueza de Piketty
O estudo de Piketty é em relação à normalidade do capitalismo. Sua conclusão é a de que, caso o capitalismo siga como é, levará à uma concentração de patrimônio extremamente alta por poucas pessoas. O crescimento do rendimento do capital é exponencial em dois níveis: primeiro porque é com base em juros compostos. Segundo porque é a taxa de crescimento é maior conforme a sua riqueza. A única maneira de fugirmos de uma uma oligarquia mundial dona do mundo é uma regulação internacional, com impostos mundiais. O método e a recomendação do Piketty são exatamente os criticados por Taleb. Piketty analisa a normalidade do capitalismo. Entretanto o mundo é desenhado, segundo Taleb, por eventos grandes, imprevisíveis e transformadores - como foi a segunda guerra mundial. Ou seja, Piketty estaria, segundo esta visão, olhando para tudo fatos insignificantes. As recomendações de Piketty, talvez levem a estocar vulnerabilidades e resulte em catástrofes maiores. Seguir as recomendações de Alan Greespan levou à crise de 2008.
A fraqueza de Taleb
Por ser um livre pensador Taleb pode se dar ao luxo de fugir de exigências acadêmicas. Em seus livros, para defender uma ideia, ele dá um exemplo de um carro e, logo depois, de uma nação. Em seus livros ele talvez incorra do que se chama em inglês de cherry picking. Isto é, ele pega apenas os casos que corroboram sua tese. A mesma liberdade que o permite afirmações revolucionárias, interessantes e originais as tornam opacas a um exame empírico. Desta maneira, o leitor deve se fiar na coerência lógica de seus argumentos e em seu sucesso na vida pessoal para acreditar em suas afirmações.
Piketty & Taleb
Piketty e Taleb são pensadores complementares no que diz respeito ao escopo de seus estudos. São antagônicos em sua metodologia e prescrições. Piketty se preocupa com a normalidade do capitalismo. Taleb se preocupa apenas com o evento extraordinário e transformador que moldará o mundo. Neste sentido se complementam, estudá-los nos leva a olhar dois aspectos do mundo. O aspecto normal (para onde o capitalismo está nos levando) é estudado por Piketty. O aspecto extraordinário e disruptivo (a possibilidade de eventos extraordinários e transformadores) é tratada por Taleb. Em sua metodologia Piketty traz o endosso do corpo acadêmico. Suas afirmações foram postas ao escrutínio de estudiosos em diversos doutorados. Isto traz credibilidade a Piketty. Taleb, como livre pensador, se dá ao luxo de escrever sobre o que quiser e trazer do mundo empírico apenas os fatos que endossam suas teses. Taleb, no livro ‘Skin in the game’ crítica acadêmicos que dão orientações sobre o mundo sem receber as consequências de suas orientações. Assim seus métodos são opostos. Suas recomendações também são opostas: Piketty dá orientações que caminham na direção de um governo mundial. Taleb dá recomendações que caminham na direção de um governo pequeno.