Narrar será uma arte ou um entrelaçar de artes?
Em geral ligamos narração à palavra falada, porém ela pode ocorrer através da linguagem dos gestos, da plasticidade do desenho, da pintura, da dança, aliás, através de um sem fim de formas de expressão. Pensando bem se nos detivermos a escutar o que ocorre ao nosso redor, no nosso entorno, veremos que a natureza toda costuma “narrar“ suas vivências de diversas formas. A expressão nos conta o que ocorre.
Quando pensamos narração humana, recordamos os primeiros relatos dos nossos antepassados, os homens das cavernas, que de uma forma silenciosa nos deixaram a riqueza de suas aventuras num mundo não imaginado por nós. Eles usavam os elementos que tinham ao seu alcance para retratar suas vivências além, é claro da expressão corporal.
Pensemos num grupo de caçadores que retornam de sua empreitada e queiram relatar o que passou. O portador de texto nesta época eram as pedras, as cavernas ou quem sabe o piso arenoso onde caminhavam. Através de suas experimentações foram descobrindo que havia materiais que possuíam a capacidade de fazer traços em cores diferentes umas das outras, aprenderam a usar a pedra como ferramenta de corte e tantos outros recursos que evoluíram e fomos herdando deles. Então este grupo de caçadores procura reproduzir nos seus traços o formato dos animais que encontraram e o que sucedeu com eles neste intercâmbio, nesta vivência diária.
Mais tarde quando fomos desenvolvendo a fala iniciou-se a narração oral satisfazendo aquela mesma necessidade de compartir o fazer diário e isto o fazemos até hoje. Surgiram os causos e todos os contos que se faziam nas diferentes reuniões. Os contos de terror, que muitas vezes não nos deixam dormir, as histórias de pescadores, caçadores e outros narradores.
Até que chegamos àquele momento mágico em que pais, avós e outras pessoas ao colocarem as crianças para dormir contam histórias. Histórias de suas próprias vidas ou contos de fadas ou leem livros que fazem sonhar. O passo seguinte desta caminhada é a escola que também nos nutre de contos e momentos de narração através das distintas formas de expressão. A voz que modela as palavras e vai desenrolando o fio daquele novelo encantado que leva a quem escuta a um voo mágico através da imaginação. As mãos de quem narra; os olhos que demonstram surpresa, alegria, susto, medo, assombro e têm o poder de arremessar o ouvinte para dentro deste redemoinho atemporal e multidimensional que é a vivência do conto.
Habitar o conto é sonhar acordado é navegar através da fantasia.
Então narrar vai muito além do que palavrear um conto, recitar uma história ou uma poesia. Quem narra com o coração transforma palavras em emoção, gestos, melodias, em uma tela onde se possa viver na dimensão da emoção e da criatividade e que de alguma forma permanecerá muito além deste momento mágico, ficará pegado às vivências sutis no imaginário de quem as viveu.
Quem narra é aquele que deseja através da palavra ter o poder de encantar, de arrebatar o outro, hipnotizá-lo como o encantador de serpentes que faz a víbora dançar ao som de sua flauta mágica, nada mais que sua voz e carisma. Então se deve ter muito claro que narrar como qualquer tarefa humana deve ter padrões éticos, compromisso e responsabilidade com quem irá escutar, pois ele, narrador, faz parte da narração, interage com ela e com o autor do texto a ser narrado, seu ou de outros. Exige preparo predisposição, bom senso, uma escolha criteriosa dos textos e preparo muito, preparo. E muito importante: - Quem trabalha com gente tem que gostar de gente!
O contar histórias favorece o encontro entre as pessoas, fenômeno bem oposto ao que vem acontecendo nos últimos tempos com o advento das tecnologias portáteis. É muito comum vermos em bares e restaurantes pessoas de uma mesma família ou grupo de amigos compartindo uma refeição ou um momento descontraído e todos eles consultam e conversam através de seus celulares ou tabletes totalmente desconectados uns dos outros. Costumo dizer que a década da comunicação é poderosamente separatista, pois as pessoas se desencontram.
O contador de histórias favorece o encontro, ele é um cuidador de pessoas, um encantador de sonhos, pois através de suas palavras as pessoas podem subir ao mundo da fantasia e desatar-se em sonhos. Aquele que se permite sonhar devolve as cores à realidade, a sonoridade à vida, os caminhos que levam a todos os lugares e abre as janelas para a dimensão imaginária.
Quando alguém decide dedicar-se à “contação” de histórias deveria olhar-se num espelho e admirar-se. O admirar-se tem a ver com distanciar-se para ver-se de outro ponto de vista. Ele vai ver que suas orelhas são muito grandes - de tudo escutar; seus olhos maiores que o mundo – olhos de tudo ver; sua boca um enorme gramofone - boca de palavra encantar; e uma língua muito grande; língua de tudo dizer; mãos que hipnotizam outros olhos e que seu corpo fala com movimentos.
Acima de tudo um contador é um escutador de pessoas, um olheiro de sonhos, um tecedor de fantasias.
Isiara Caruso
Em geral ligamos narração à palavra falada, porém ela pode ocorrer através da linguagem dos gestos, da plasticidade do desenho, da pintura, da dança, aliás, através de um sem fim de formas de expressão. Pensando bem se nos detivermos a escutar o que ocorre ao nosso redor, no nosso entorno, veremos que a natureza toda costuma “narrar“ suas vivências de diversas formas. A expressão nos conta o que ocorre.
Quando pensamos narração humana, recordamos os primeiros relatos dos nossos antepassados, os homens das cavernas, que de uma forma silenciosa nos deixaram a riqueza de suas aventuras num mundo não imaginado por nós. Eles usavam os elementos que tinham ao seu alcance para retratar suas vivências além, é claro da expressão corporal.
Pensemos num grupo de caçadores que retornam de sua empreitada e queiram relatar o que passou. O portador de texto nesta época eram as pedras, as cavernas ou quem sabe o piso arenoso onde caminhavam. Através de suas experimentações foram descobrindo que havia materiais que possuíam a capacidade de fazer traços em cores diferentes umas das outras, aprenderam a usar a pedra como ferramenta de corte e tantos outros recursos que evoluíram e fomos herdando deles. Então este grupo de caçadores procura reproduzir nos seus traços o formato dos animais que encontraram e o que sucedeu com eles neste intercâmbio, nesta vivência diária.
Mais tarde quando fomos desenvolvendo a fala iniciou-se a narração oral satisfazendo aquela mesma necessidade de compartir o fazer diário e isto o fazemos até hoje. Surgiram os causos e todos os contos que se faziam nas diferentes reuniões. Os contos de terror, que muitas vezes não nos deixam dormir, as histórias de pescadores, caçadores e outros narradores.
Até que chegamos àquele momento mágico em que pais, avós e outras pessoas ao colocarem as crianças para dormir contam histórias. Histórias de suas próprias vidas ou contos de fadas ou leem livros que fazem sonhar. O passo seguinte desta caminhada é a escola que também nos nutre de contos e momentos de narração através das distintas formas de expressão. A voz que modela as palavras e vai desenrolando o fio daquele novelo encantado que leva a quem escuta a um voo mágico através da imaginação. As mãos de quem narra; os olhos que demonstram surpresa, alegria, susto, medo, assombro e têm o poder de arremessar o ouvinte para dentro deste redemoinho atemporal e multidimensional que é a vivência do conto.
Habitar o conto é sonhar acordado é navegar através da fantasia.
Então narrar vai muito além do que palavrear um conto, recitar uma história ou uma poesia. Quem narra com o coração transforma palavras em emoção, gestos, melodias, em uma tela onde se possa viver na dimensão da emoção e da criatividade e que de alguma forma permanecerá muito além deste momento mágico, ficará pegado às vivências sutis no imaginário de quem as viveu.
Quem narra é aquele que deseja através da palavra ter o poder de encantar, de arrebatar o outro, hipnotizá-lo como o encantador de serpentes que faz a víbora dançar ao som de sua flauta mágica, nada mais que sua voz e carisma. Então se deve ter muito claro que narrar como qualquer tarefa humana deve ter padrões éticos, compromisso e responsabilidade com quem irá escutar, pois ele, narrador, faz parte da narração, interage com ela e com o autor do texto a ser narrado, seu ou de outros. Exige preparo predisposição, bom senso, uma escolha criteriosa dos textos e preparo muito, preparo. E muito importante: - Quem trabalha com gente tem que gostar de gente!
O contar histórias favorece o encontro entre as pessoas, fenômeno bem oposto ao que vem acontecendo nos últimos tempos com o advento das tecnologias portáteis. É muito comum vermos em bares e restaurantes pessoas de uma mesma família ou grupo de amigos compartindo uma refeição ou um momento descontraído e todos eles consultam e conversam através de seus celulares ou tabletes totalmente desconectados uns dos outros. Costumo dizer que a década da comunicação é poderosamente separatista, pois as pessoas se desencontram.
O contador de histórias favorece o encontro, ele é um cuidador de pessoas, um encantador de sonhos, pois através de suas palavras as pessoas podem subir ao mundo da fantasia e desatar-se em sonhos. Aquele que se permite sonhar devolve as cores à realidade, a sonoridade à vida, os caminhos que levam a todos os lugares e abre as janelas para a dimensão imaginária.
Quando alguém decide dedicar-se à “contação” de histórias deveria olhar-se num espelho e admirar-se. O admirar-se tem a ver com distanciar-se para ver-se de outro ponto de vista. Ele vai ver que suas orelhas são muito grandes - de tudo escutar; seus olhos maiores que o mundo – olhos de tudo ver; sua boca um enorme gramofone - boca de palavra encantar; e uma língua muito grande; língua de tudo dizer; mãos que hipnotizam outros olhos e que seu corpo fala com movimentos.
Acima de tudo um contador é um escutador de pessoas, um olheiro de sonhos, um tecedor de fantasias.
Isiara Caruso