Poetrix

Prezados amigos, por acreditar ser um dos grandes admiradores do Poetrix, gostaria de registrar algumas observações a respeito de suas regras e derivações. Sei que existem debates de toda ordem nas redes sociais, mas gostaria de deixar claras as minhas percepções para que possamos discuti-las e até aprimorá-las no que for necessário.

1 - Nesses quase vinte anos de existência o nosso terceto agregou um número significativo de poetas em torno da ideia proposta pelo poeta baiano Goulart Gomes. Esse fato, por si só, é de suma importância em um país onde se diz que o "brasileiro não lê" e que, 28% da população alfabetizada não tem o hábito, ou mesmo tempo, para leitura.

Acredito que o Poetrix possa vencer, pelo menos em parte, essas barreiras, graças a sua concisão e leveza. Por ser um poema extremamente pequeno, o leitor não precisa ter mais que um olhar cuidadoso para os três versos que afloram depois de um título que o complementa e dá significado ao texto.

O Poetrix tem em suas regras amarras simples e de fácil aceitação. Não exige, de quem o escreve, conhecimentos tão aprimorados para sua elaboração. Afora isto, o movimento como um todo, funciona como uma oficina literária incansável. Quem se aventura na arte dessa escrita, encontra um forte apoio dos que já estão neste processo por mais tempo.

2 - Muito se diz que o Poetrix não é uma frase fragmentada em três partes. Vejam que isto é apenas uma contra-indicação. Tenho comigo que uma frase bem elaborada pode vir a ser um Poetrix como um outro qualquer, sem a perda de qualidade e beleza.

Vejam dois exemplos de frases conhecidas:

Deus está morto

Oh,

my

God!

ou ainda

Eis a questão,

ser

ou

não ser?!

Vejam que aqui estão contemplados quase todos os requisitos de um bom Poetrix: temos o título, os três versos, a concisão, o susto, a rapidez, o minimalismo e assim por diante. Na minha visão o que está em jogo é a percepção do leitor, é a leitura que ele faz e não o fato de ser uma frase dividida em três partes. Estes exemplos transmitem mensagens gigantescas com um número ínfimo de palavras e sílabas. As estrofes são riquíssimas em conteúdo e forma.

É fato: "Ser ou não Ser, eis a questão" é uma frase que foi dita por Hamlet durante o monólogo da primeira cena do terceiro ato na peça homônima de William Shakespeare.

Por outro lado me parece que podemos estar sim, diante de dois Poetrix mais-que-perfeitos.

Observem este outro exemplo:

Devolva-me

AS

AS

AS

De Sonia Godoy.

Vejam que neste caso específico não temos sequer uma frase, porém a composição em si vai muito além da escrita pura e simples. É de uma simbologia gritante e ousada, ainda que os seus versos sejam repetitivos e pobres.

Mais um...

Círculo vicioso

s

s o s

s

Vejam o Comentário do Goulart Gomes, o criador do Poetrix, em 10/05/2011.

"Excelente, Pedro! Um dos melhores de sua safra! Transmite a ideia/sensação de alguém andando em círculo, sozinho e pedindo socorro. A onomatopeia Ssssss remete a sussurro, ou pedido de silêncio. É o ápice do minimalismo! Genial. Esse Poetrix visual eu queria ter escrito!"

3 - Para uma terceira reflexão, gostaria de tecer alguns paralelos entre o Poetrix e o Hai-cai. Ambos são tercetos, muito embora suas características sejam diferentes.

O Hai-cai está consagrado historicamente com três versos de 17 sílabas poéticas. Porém, não raro, vemos estes tercetos com 14, 15 e até 18 sílabas. O que demonstra que está havendo uma mudança importante na sua estrutura. Neste ponto o Poetrix é mais flexível, nos permite até 30 sílabas poéticas. O que, a meu ver, nem faz tanto sentido, uma vez que o que se busca, com mais ênfase, é a concisão. Raramente nos deparamos com um Poetrix que tenha as trinta sílabas.

Entendo que todo Hai-cai pode vir a ser um Poetrix. Basta que acrescentemos a ele um título. Guilherme de Almeida, por exemplo, escreveu alguns "Hai-cais" com título. Entendo como se fossem então, Poetrix. Porém a recíproca não é verdadeira uma vez que o Poetrix exige o título. Esta é uma das diferenças mais significativas entre esses gêneros. Por isso eles não se misturam.

4 - Muitos dos que escrevem Poetrix têm questionado as derivações que foram surgindo com o passar dos anos. Creio que algumas vão se perder pelo meio do caminho, mas a maioria haverá de encontrar o seu próprio destino. A primeira dessas vertentes foi o Duplix, que nada mais é do que a junção de dois Poetrix que caminham lado a lado.

O que é mais significativo é a participação de dois poetas que se juntam para construir um terceiro poema. A ordem em que eles vão se posicionar não importa, pois o segundo autor pode escolher a posição que mais lhe agradar, tanto pode ficar à esquerda como à direita do poema que irá servir de base. A ordem não altera a composição.

Como são dois Poetrix, não existe, a priore, a preocupação quanto ao número de sílabas. Todavia o poema resultante da junção, poderá apresentar mais de 60 sílabas poéticas, o que, teoricamente descaraterizaria o terceiro poema, enquanto Poetrix.

É importante lembrar que no Duplix são usadas barras (//) para deixar clara a divisão dos Poetrix, no intuito de que não percam suas identidades.

Em tempo. Gostaria de lembrar que o poeta Oswaldo Martins publicou na página do MIP um ensaio onde aborda este assunto. Para ele o terceiro poema só será considerado um Poetrix se a soma total das sílabas dos dois Poetrix não ultrapassarem as 30 sílabas poéticas, caso contrário, se configurará como sendo um pseudopoetrix, dado ao número excessivo de sílabas.

Vejam bem, eu ainda não estou de todo convencido desta teoria, uma vez que os poemas apenas se juntam, eles não se fundem. As barras os separam. O "terceiro poema" se dá na leitura, está subentendido, é algo subliminar. Ou seja, se concretiza pela associação de ideias. Por isso não encerro esta questão.

Um Duplix;

Desmatamento//Fobia do Caipora

de//temer

vasta//a

dor//ria

Pedro Cardoso (DF)//Fábio R Vieira

Comentário: de Goulart Gomes

Pedro:mais sintético, impossível! Como você sabe, eu sempre fui a favor da total liberdade de criação em torno do Poetrix. Acredito que tais propostas se solidificam - ou não - com o tempo, a partir da prática dos autores e da aprovação dos leitores, que é maior do que qualquer crítica. Portanto, acho a sua ideia criativa e válida. No mais, Viva a Poesia!

Este Duplix, segundo o poeta Oswaldo Martins, é um exemplar perfeito, pois o terceiro poema está dentro da proposta das 30 sílabas poéticas. Duplix como este é algo raro, vejam que ele foi concebido por dois Palavratrix.

5 - Um dia desses o poeta Marcelo Marques, convidou-me para entrar em um grupo que se chama Poetrix Raiz. De pronto aceitei o convite. Mas em seguida me perguntei: o que vem a ser um Poetrix Raiz? Confesso que tive uma certa dificuldade para digerir a questão que eu mesmo havia me colocado. Com o passar dos dias comecei a crer que seria algo que me remetesse aos primórdios do MIP, ou quem sabe, algum detalhe que pudesse representar a essência do terceto?!

6 - Vou aproveitar para falar um pouco mais sobre algumas variações que acho interessantes.

6.1 - O Grafotrix exige do autor uma dose de imaginação que vai além da poética dos versos. Para tanto, é preciso que se crie na mente a figura que será representada pela escrita em três versos. Ele nos remete aos poemas concretos e ao mesmo tempo às artes plásticas. É uma mistura do imaginário com o realismo advindos do cotidiano. É importante observar que o texto e a figura se completam e que as figuras podem ser repetidas sem a preocupação do plágio.

Exemplo:

1 – Bala perdida

dor que ora me mata

tiro

tiro

6.2 - Palavratrix é mais uma derivação do Poetrix, que foi por mim apresentada, para que possa ser avaliada e criticada, mais uma vez, por aqueles que gostam de desafios poéticos. Esta modalidade consiste em encontrar palavras, do nosso idioma, que apresentem duplo sentido quando fracionadas em três versos. É preciso que se dê um título ao poema para que ele não perca uma das características fundamentais do Poetrix.

Exemplo:

Desamor virtual

com

puta

dor

Kate Weiss

PS: em verdade citei as variações acima só para dizer que estas e todas as demais, se resumem em uma única palavra: POETRIX. Muito embora não deixam de ser algo divertido e poético.

Finalmente, gostaria de deixar registrado mais uma vez a minha vontade de ter escrito pelo menos um desses Poetrix:

1 - (má)(temática)

não adiciono

sou

sub(traída)

Ângela Bretas

2- Encanta(dor)

uma flauta doce

toda furada

deu nova vida ao bambu

Hércio Afonso

3 - Divi_dida

não queria

ser deus,

só duas...

Aila Magalhães

4 - Fugaz

cama desarrumada,

liberdade para as borboletas

estampadas nos lençóis...

Tê Soares

5 - Assalariado

vende a vida inteira

pelo pão de cada dia

a liberdade boia, fria

Goulart Gomes

Em tempo... acredito que estes sejam alguns Poetrix Raiz.

E viva a poesia!!

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 08/07/2018
Reeditado em 08/07/2018
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