O que é arte 6 - Conhecer com o coração x Conhecer com a cabeça
Estou enfrentando alguns problemas pessoais que me angustiam bastante, felizmente tenho dois amigos que me dão uma força neste momento difícil. Há poucos minutos um deles, Antônio, ficou espantado: “Nossa, você tem uma percepção apurada dos seus problemas. A maioria das pessoas passa anos de terapeuta para ter esta percepção.” Realmente tenho dúvidas da correção da linha leitura dos meus problemas. Muitos eu consegui elencar pela conversa com ele. As perguntas e reflexões que fez me guiaram para uma elaboração de uma intuição que - caso contrário - talvez nunca se materializasse em um pensamento racionalizado. Tenho lido livros e visto vídeos que transformaram profundamente a minha visão do mundo. Infelizmente tem sido difícil trazer toda esta mudança para termos práticos.
Antônio: Freud dizia que tentar resolver os próprios problemas apenas com a consciência de que eles existem é o mesmo que matar a fome lendo apenas o cardápio do menu.
Eu: Nossa, esta comparação é incrível! De uma certa maneira eu já sabia disso. Uma vez me chamaram para fazer um documentário sobre exploração sexual. A minha contratante tinha na ponta da língua estatísticas chocantes. As estatísticas, dizia, tinham que alcançar o público para que as pessoas se posicionem. Expliquei que ela estava equivocada. As estatísticas são importantes, mas elas não sensibilizam o público. O dado de que cem, quinhentas ou mil pessoas sofrem exploração sexual é cheio de informação. Mas a carga emocional está em acompanhar apenas uma pessoa. Mostrar em detalhes a vulnerabilidade de alguém (que poderia ser sua filha) sensibiliza o público muito mais do que uma montanha de números.”
Antônio: Chico, é mesmo! A Rachel de Queiroz era até filiada a um partido comunista, mas não era engajada. Ela escreveu um livro que me tocou muitíssimo, O Quinze. Discursos de comunistas criticando os políticos e a situação tocam menos do que este livro. O artista sabe como fazer para sensibilizar! Mas por que você fez esta comparação agora?
Eu: Para uma pessoa saber dos próprios problemas (como uma lista friamente ordenada) é similar a um espectador que vê dados estatísticos em um documentário. É insuficiente para insuflar a emoção necessária à ação.
Antônio: Mas se perceber os próprios problemas não é suficiente, então como transformar as pessoas?
Chico: Cara, acredito que a arte é um caminho de alteração das pessoas. Talvez uma pessoa tenha sido chamada de machista. Talvez ela até concorde, no entanto sem dar a carga emocional que o problema pede. Ao ver alguém em um filme sendo machista a pessoa pode viver o problema através de outra perspectiva, isto pode mudá-la. Conhecer através de uma experiência é diferente de conhecer através de uma comunicação extensiva. Conhecer com o coração é diferente de conhecer com a cabeça.
Conhecer com a cabeça: Conhecimento racional, ter a sabedoria de dados, conhecimento extensível (pode ser posto em palavras).
Conhecer com o coração: Apreensão através da vivência. Conhecimento intuitivo. Se sente e é impossível de se por em palavras. Se relaciona com a empatia, com o reconhecimento, com a antipatia e com demais sentimentos.