O Homem como ser biopsicossocial: reflexões acerca da relação natureza e cultura
Ainda hoje parece persistir uma tensão entre as ciências humanas e as da natureza, em virtude de uma dicotomia estabelecida há tempos: natureza-cultura/ inato-adquirido. Estas duas dimensões do humano são quase sempre colocadas como faces sobrepostas que operam de modo contrário.
Muitos estudiosos, entretanto, tentam pensar um novo modelo de ser humano em que a dualidade, por tanto tempo imperativa, seja extinguída do seio científico, para dar lugar a um novo conceito em que natureza e cultura sejam concebidas como partes integradas e, portanto, interdependentes.
O artigo 'o lugar do biológico na psicologia: o ponto de vista da etologia, de Ana Maria Almeida Carvalho, levanta essa discussão, trazendo a perspectiva etológico para pensar o ser humano como um ser biopsicossocial.
A análise central do texto é a reflexão do comportamento humano. Este pode ser entendido como uma resposta inata do sujeito ou é produto das relações socioculturais que o indivíduo se insere? A tentativa é anular a possibilidade de realizar uma escolha entre as duas 'opções' levantadas. Segundo a perspectiva etológica apresentada no artigo de Carvalho, o comportamento humano é uma resposta gerada a partir de uma relação de complementariedade entre natureza e ambiente. Isso porque o olhar etológico que é dado ao comportamento é de que este é produto da evolução através do mecanismo de seleção natural.
Ora, se as ações humanas são fruto do processo evolutivo, a biologia tem lugar central no processo de hominização. Há aí a possibilidade de tentar enxergar o humano como um ser dotado de uma organização capaz de produzir cultura e , de forma simultânea, a cultura ser o único meio possível para o desenvolvimento da espécie humana - todo o comportamento humano é , pois, selecionado por ser apto, no que tange a sua funcionalidade, a existir em um ambiente sociocultural. A cultura é , então, produzida por um ser que é biológico e este mesmo ser se modifica por sua própria produção.
Pensar dessa forma é admitir o caráter dinâmico do ser humano; é visualizá-lo como um ente dotado de uma maquinaria biológica totalmente organizada para construir todos os processos que constituem o que chamamos de cultura. Afirmar isso é anular todo determinismo e reducionismo que pairam até hoje nas reflexões a repeito da natureza humana.
TEXTO DE REFERÊNCIA: CARVALHO, A.M.A. O lugar do biológico na psicologia: o ponto de vista da etologia. Biotemas, 2(2): 81-92, 1989.