Terapia sincera
A primeira vez que me submeti a um terapeuta, me senti meio que invadido. Lá se vão três anos ou mais. No começo, me reservei a comentar o que já era público sobre mim, não a deixando aprofundar no que realmente me incomodava na verdade. Foram horas de consultas e oitivas, em que, de minha parte, me mostrava restrito a comentários sobre minha vida, não sentimentos. Recebi alta alguns meses depois de ter iniciado e reconheço minha falha nesta tarefa.
Nos anos seguintes minha vida deu algumas voltas, meio trágicas e duras, me forçando a ir para o fundo do poço emocional. Não transparecia visivelmente no espelho, mas à minha volta já era perceptível. Sou músico, baterista, e já descontei nos tambores e pratos minhas frustrações. Com heavy metal no fone de ouvido enquanto corria, fazia meus vinte quilômetros a passos largos, forçava meu corpo numa atitude autodestrutiva, na verdade.
Minha formação cristã não me permitia abusar do álcool ou drogas, não me permitia no sentido de não querer, pois me conheço, e quando experimentei estas substâncias, quando adolescente, me esbaldei até ter em mim a desrealização, a desconexão da realidade, me sentir imortal. Graças a Deus saí disso a tempo.
Neste período, isto é, nos anos recentes, enfrentei doença na família e vários fatos que me poderiam deixar louco, literalmente.
Tive que voltar para a terapia.
Voltei, acompanhado de medicamentos, menos do que da primeira vez. Minha psiquiatra, já mais confiante em mim, me receitou drogas diferentes.
Comecei a terapia resoluto em ser mais profundo desta vez. Já não falei de comportamentos, mas de sentimentos profundos que carregava em mim. Não sei se por causa do efeito dos medicamentos prescritos ou não, a terapia começou a funcionar, e bem.
Discorria sobre o que sentia, o que sinto e o que sentirei. Abri minha alma à terapeuta.
A evolução na terapia para mim já era perceptível, em pensamentos, em eliminação de obsessões, na maneira de encarar comportamentos de outros em relação a mim.
Percebi que eu existo dentro de minha pele, e que, fora dela, não tenho domínio algum sobre o que os outros pensam, interpretam ou me julgam. Vi que meus limites são definidos, ora por mim como opção ou limitação mesmo. Não posso fazer o impossível.
Entendi que o que posso esperar de seres humanos apenas reações e sentimentos humanos apenas, e isso inclui a raiva, antipatia, ingratidão, violência e incompreensão, e isto não está sob meu domínio, então não tenho poderes sobre essas coisas e nem elas sobre mim.
O que parte de mim está sujeito a interpretações das mais diversas, das mais díspares, não é matemática exata, é humano. Não sou responsável pelas suas abstrações. A verdade interessa primeiro a mim, e sei que pode não ser aceita por todos.
Vi em mim transformação. Ainda tenho um longo caminho a percorrer, mas sei que está mais claro.