DA BAIA DA BABITONGA ÀS TERRAS DO PRÍNCIPE
 
O que leva a um artista tradicional se confrontar com uma nova comunicação da mensagem em seu processo de produção? Existe a busca pela originalidade para o publico consumidor, queiramos ou não é sua meta, mas a que custo? Ao optar pela arte tradicional o artista consegue sua estabilidade, e ao confrontá-la cria um desequilíbrio na percepção de sua obra.
Isso me ocorre diante de um dos recentes projetos de Décio Soncini graças a um patrocinador internacional na China: exposição itinerante pelo país, presença na Shangai Art Fair 2016, livro abrangendo sua carreira, e uma obra mural de grandes dimensões, de todos o mais complexo devido a fatores diversos, e estando ele mesmo relutante em levá-lo à frente; o mural difere de todas as outras formas de arte parietal por estar profundamente vinculado à arquitetura, e cria uma nova forma de exploração do espaço.
Artista visual afeito às telas realizar uma obra mural externa durável, uma vez que estaria exposta às intempéries já era em si um grande desafio; depois o local, pensado em três cidades que tem a ver com sua carreira: São Paulo, a cidade natal, Belém do Pará pelas exposições ocorridas, e Joinville onde morou e em que sua família reside há décadas. Concretizou em Joinville, no prédio da Secretaira de Desenvolvimento Regional, por ser edifício publico do Estado, oferecer rebaixos na fachada adequados à obra, ser via de grande fluxo de trânsito, e principalmente, ter o aval oficial de poder executá-la em caráter de doação à cidade. Evidentemente não foi simples inclusive a criação da obra, Décio em essência é um pintor, desenhista e gravador, criar um mural em pastilhas significa transpor de uma linguagem para outra, dispor de mão de obra especializada, mosaicistas capazes de debater e interpretar as cores de uma pintura em pastilhas, e isso se conseguiu graças a duas profissionais competentes, uma em Joinville, Patricia Nicoluzzi Pfiffer, outra em Curitiba, Marcia Iurk, que abraçaram o projeto.
A proposta inicial é um cenário de água e terra, condizente com as características geográficas de Joinville, assim em seus dois estudos iniciais o primeiro foi: as águas da Babitonga, o segundo: nas terras do Príncipe. A construção do olhar se dá pelo zigue-zagar das águas do fundo para frente, e dos tons frios no horizonte para os quentes do primeiro plano no painel à esquerda; no segundo a visão é muito próxima, como se o observador estivesse envolvido pela mata subtropical dos capões existentes na área urbana, aqui o olhar quase se perde no emaranhado de troncos e folhagens.
Assim, pela existência de rebaixos na fachada se formam automaticamente reservas, e o conjunto se quebra em dois momentos: o observador que “vê” ao longe um cenário, uma vez que ele lá não está - o da água, e no caso da baia da Babitonga; o segundo da terra, absurdamente próximo, e envolvente. Lembremos que a leitura do painel é quebrada pela divisão dos espaços na fachada o que gera uma interrupção na captação visual da imagem, entretanto o título aposto à obra: “Da baia da Babitonga às terras do Príncipe” cria uma interpretação como parte de um drama que se desenrola, ou seja, um momento de uma narrativa muito maior, em que as imagens passam a ser pensativas, elas irão apontar uma subordinação da imagem como um todo ao texto.
A obra, sem querer ter essa intenção, acabou por se tornar uma metáfora das ações da Agência que vão além das divisas do município. Vemos, através de duas janelas, o que o artista propôs sobre uma narrativa, uma mediação entre o visto e o imaginário, uma imagem harmoniosa de um cenário ficcional, diálogo persuasivo entre o real e a fantasia, a que chamamos arte.
 
Walter de Queiroz Guerreiro, Prof. M.A.
Membro da Associação Brasileira e Internacional de Críticos de Arte (ABCA/AICA).
Walter de Queiroz Guerreiro
Enviado por Walter de Queiroz Guerreiro em 14/04/2018
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