O gênio criativo e a doença espiritual de uma gente
Carlos Drummond de Andrade é um dos maiores gênios criativos da humanidade. Falou aos poetas, filósofos, cientistas, e falou ao povo, ao trabalhador, ao homem da lida diária das repartições públicas e das ruas de Itabira, do Rio e do mundo. O poeta é traduzido para mais de dez idiomas, e estudado em universidades de todo o mundo. Em qualquer lugar do planeta, entre as pessoas de maior erudição e sensibilidade, sua obra é conhecida e reconhecida. Seus versos penetrantes cortam profundo a matéria de que é feita a alma humana, revelando-lhe os segredos, e contando-lhe tantos outros. Em 2017 celebramos seus 115 anos de nascimento. Nasceu numa cidade de ferro, com ruas de ferro, ares de ferro, e pessoas de ferro. Itabira deu ao mundo um gênio criativo.
O gênio criativo não é uma pessoa, mas uma qualidade, uma força, cultivada por algumas pessoas. O gênio criativo é uma herança. Cada época herda, de seus antepassados, as mais sublimes, e nefastas, criações do espírito. Em toda parte onde há memória, saúde espiritual, um mínimo de erudição, os gênios criativos não são idolatrados, mas amados. Devemos amá-los e sermos profundamente gratos, porque a cada poesia, a cada sinfonia, equação, pintura, composição, a cada teoria, teorema, romance, construção, em todos os campos das ciências, das artes, dos saberes populares e das letras, seculares ou sacras, estes homens e mulheres do passado criaram o mundo que hoje habitamos. Esse mundo é perverso, horrível, injusto, pela obra dos gênios destrutivos e dos homens mesquinhos, mas é igualmente belo, vibrante, pulsante, porque nele existem também as marcas deixadas pelos criadores.
O que fazemos em memória de nossos gênios criativos? Villa-Lobos, Nazareth, Guerra Peixe, Machado de Assis, Dumont e Drummond e tantos outros? Não há resposta simples. Mandamos edificar monumentos, promovemos eventos, publicamos livros, rendemos justas e insuficientes homenagens. Mas também, embrutecidos, bestializados e emburrecidos, depredamos, pichamos, destruímos. Sem memória, sem amor, sem honra e sem inteligência. E além do atentado intangível ao legado espiritual de nossos antepassados criadores, lesamos o erário público em milhares de reais, para que a tia da favela que levanta às quatro da manhã para enfrentar um extenuante dia de trabalho pague a conta com seus impostos dilacerantes, para que eu, tú, eles, nós, paguemos a conta de tamanha "choldrice". Além de insensível e desrespeitoso, além de descerebrado e bestial, o comportamento é estúpico e ataca o próprio bolso.