A seca
O ano de 1953 foi um ano devastado pela seca que atingiu o coração do sertão, deixando sua marca incrustada no solo e principalmente, na vida desse bravo povo nordestinho. O sol de tórrida tenacidade havia devorado toda a vegetação, onde um dia fora verde, agora se encontrava seco feito palha. E mesmo nas primícias daquele ano de 1954, o solo continuava árido e o sol abrasador. A terra ressequida sofria com a erosão que lhe causava rachadura, logo transformadas em fendas profundas. O cacto de mandacaru estendia suas ramificações aos céus pedindo súplica ao astro rei, enquanto a palma mesmo mucha era a única que teimava em se manter verde.
Foi neste cenário do sertão, ali na curva onde se tocam e se apartam começo, meio e fim, e enfim o que já aconteceu ainda esta por vir a ser, um nome diferente do fim do mundo, em que nasceu aquele garoto franzino que viria a se transformar: “num futuro não muito distante”, em um tenaz ativista do sertão sergipano com grande repercussão nacional: Carlos Soares de Meneses, o protagonista desta história.
Neste sertão de clima seco e solo sofrido, numa comunidade denominada de Augustinho, situado no município de Nossa Senhora da Glória, ladrilhado pelo mais belo bosque repleto de arvores nativas do mais resistente dos biomas; a “caatinga”, com as suas coroa-de-frade, os seus xique-xique, juazeiros, umbuzeiros, e o fabuloso mandacaru-azul, uma espécie do gênero Pilosocereus da família das cactáceas. Este tipo de facheiro atinge até dez metros de altura, a sua ramificação verde-escuro contém bastantes espinhos, sendo muito usado pelos pequenos agricultores por servir de suplemento alimentar para os animais, esse motivo o tornava “sagrado”. Aquela comunidade extremamente rural não possuía nenhuma escola por perto. A maioria de seus habitantes não sabia ler nem escrever por nunca terem oportunidade de freqüentar uma sala de aula, o que na época era uma verdadeira raridade: “quando muito tinham por perto, seria uma professorinha que ensinava o ABC”.
Em sua grande maioria eram famílias simples que viviam do trabalho braçal, extraindo das vísceras da terra a sua subsistência. Ali naquelas cercanias morava uma pequena família de agricultores composta pelo patriarca João de Biana, sua esposa Dona Conceição e um filho recém-nascido. Fora nesse típico cenário nordestino, em meio ao nada, e talvez além do fim do mundo, na esquina da superação, defronte com a travessa da perseverança que se encontrava àquele imponente casebre de taipa.
Tendo ele sido elevado com varas de madeira entrelaçadas verticalmente fixada no solo, e vigas horizontais amarradas entre si por cipós, dando origem a um grande painel perfurado que, após ter seu vão preenchido com barro, transformado em parede, uma técnica que atravessou o milênio, sinalizando a liberdade criadora do lar próprio numa intensa relação entre o ser humano e a natureza que o cerca.
Aquela pequena casa de pau-a-pique que estava dividida em três cômodos, uma sala, um quarto, uma cozinha, e dentro dela uma brava família morando. Na cozinha, num canto isolado estavam um rústico fogão à lenha, e sobre ele duas panelas de barro. Naqueles inócuos recipientes construídos a partir da argila e fogo, tinham alguns poucos grãos de feijão de corda, e maxixes cozido na água e sal. No outro canto, um porão e um pote que serviam de reservatório contendo água para beber e cozinhar. Na sala, uma mesa de madeira tosca coberta com uma toalha de renda branca, quão alva quanto o algodão, e sobre ela um pires de alumínio junto à imagem de Nossa Senhora Aparecida, indicando ser aquele “cantinho” sagrado e servia de oratório. Ao lado da mesa, dois pequenos tamboretes de madeira ajudavam a ornamentar aquela sala. A mobília do quarto consistia num caixote de madeira utilizado como guarda-roupas, no outro extremo do recinto uma cama, e sobre ela um surrado colchão de capim onde dormia Dona Conceição e a criança de colo. Havia uma esteira enrolada encostada no outro recanto daquele escuro e úmido cômodo. A mesma esteira seria estirada durante a noite sobre o chão de massapê, onde dormira seu João.
Aquela família de características simples vivia se deslocando de um lado para outro, perambulando pelo sertão afora. A vida dura na qual eram obrigados a viver, por conseqüência da seca, os obrigava a mudar de ares quando ela ficava tenebrosa. E não costumavam criarem raízes nos pés, como se diz no sertão. Haviam chegado ali há poucos mais de seis meses. Seu João, um típico caboclo sertanejo de estatura mediana, cabelos caracolados e crespos, a pele queimada pelo sol era a sua identidade, às mãos calejadas pelo cabo da enxada, a sua carteira de trabalho. Dona Conceição, uma morena cor de canela, de olhos amendoados e negros quanto uma noite sem lua, mas que continha o fulgor da esperança, ela estava com um barrigão enorme e prestes a dar a luz.
Foi naquela vida sofrida de nômade, que em dezembro de 1953, com uns poucos meses de casados, exatamente no dia 29 de dezembro nasceu o primogênito do casal, um filho varão, como ansiava seu pai João de Biana. As dificuldades pelas quais passavam eram enormes. Com o trabalho na agricultura cada vez mais escasso, fato que impossibilitava ao patriarca ganhar o sustento necessário para suprir com as necessidades da família, uma alimentação adequada parecia ser impossível naqueles tempos. Por muitas vezes tendo apenhas raízes de mandioca e ovos de galinha de capoeira para comer, quando muito tinham. O pequeno Carlos, ainda bebe e como toda criança nessa circunstância da vida precisava se alimentar bem, por isso era com ele que a sua mãe mais se preocupava. Devido à comida consumida por ela ser pouca e desprovida dos nutrientes e proteínas extremamente necessárias para uma razoável produção do leite materno, por inúmeras vezes não tinha condições alguma de amamentá-lo. Então o leite materno era substituído por angu de farinha, e assim, neste cenário lastimável, a criança fora crescendo sem nenhuma perspectiva de uma vida digna.
Foi neste cenário do sertão, ali na curva onde se tocam e se apartam começo, meio e fim, e enfim o que já aconteceu ainda esta por vir a ser, um nome diferente do fim do mundo, em que nasceu aquele garoto franzino que viria a se transformar: “num futuro não muito distante”, em um tenaz ativista do sertão sergipano com grande repercussão nacional: Carlos Soares de Meneses, o protagonista desta história.
Neste sertão de clima seco e solo sofrido, numa comunidade denominada de Augustinho, situado no município de Nossa Senhora da Glória, ladrilhado pelo mais belo bosque repleto de arvores nativas do mais resistente dos biomas; a “caatinga”, com as suas coroa-de-frade, os seus xique-xique, juazeiros, umbuzeiros, e o fabuloso mandacaru-azul, uma espécie do gênero Pilosocereus da família das cactáceas. Este tipo de facheiro atinge até dez metros de altura, a sua ramificação verde-escuro contém bastantes espinhos, sendo muito usado pelos pequenos agricultores por servir de suplemento alimentar para os animais, esse motivo o tornava “sagrado”. Aquela comunidade extremamente rural não possuía nenhuma escola por perto. A maioria de seus habitantes não sabia ler nem escrever por nunca terem oportunidade de freqüentar uma sala de aula, o que na época era uma verdadeira raridade: “quando muito tinham por perto, seria uma professorinha que ensinava o ABC”.
Em sua grande maioria eram famílias simples que viviam do trabalho braçal, extraindo das vísceras da terra a sua subsistência. Ali naquelas cercanias morava uma pequena família de agricultores composta pelo patriarca João de Biana, sua esposa Dona Conceição e um filho recém-nascido. Fora nesse típico cenário nordestino, em meio ao nada, e talvez além do fim do mundo, na esquina da superação, defronte com a travessa da perseverança que se encontrava àquele imponente casebre de taipa.
Tendo ele sido elevado com varas de madeira entrelaçadas verticalmente fixada no solo, e vigas horizontais amarradas entre si por cipós, dando origem a um grande painel perfurado que, após ter seu vão preenchido com barro, transformado em parede, uma técnica que atravessou o milênio, sinalizando a liberdade criadora do lar próprio numa intensa relação entre o ser humano e a natureza que o cerca.
Aquela pequena casa de pau-a-pique que estava dividida em três cômodos, uma sala, um quarto, uma cozinha, e dentro dela uma brava família morando. Na cozinha, num canto isolado estavam um rústico fogão à lenha, e sobre ele duas panelas de barro. Naqueles inócuos recipientes construídos a partir da argila e fogo, tinham alguns poucos grãos de feijão de corda, e maxixes cozido na água e sal. No outro canto, um porão e um pote que serviam de reservatório contendo água para beber e cozinhar. Na sala, uma mesa de madeira tosca coberta com uma toalha de renda branca, quão alva quanto o algodão, e sobre ela um pires de alumínio junto à imagem de Nossa Senhora Aparecida, indicando ser aquele “cantinho” sagrado e servia de oratório. Ao lado da mesa, dois pequenos tamboretes de madeira ajudavam a ornamentar aquela sala. A mobília do quarto consistia num caixote de madeira utilizado como guarda-roupas, no outro extremo do recinto uma cama, e sobre ela um surrado colchão de capim onde dormia Dona Conceição e a criança de colo. Havia uma esteira enrolada encostada no outro recanto daquele escuro e úmido cômodo. A mesma esteira seria estirada durante a noite sobre o chão de massapê, onde dormira seu João.
Aquela família de características simples vivia se deslocando de um lado para outro, perambulando pelo sertão afora. A vida dura na qual eram obrigados a viver, por conseqüência da seca, os obrigava a mudar de ares quando ela ficava tenebrosa. E não costumavam criarem raízes nos pés, como se diz no sertão. Haviam chegado ali há poucos mais de seis meses. Seu João, um típico caboclo sertanejo de estatura mediana, cabelos caracolados e crespos, a pele queimada pelo sol era a sua identidade, às mãos calejadas pelo cabo da enxada, a sua carteira de trabalho. Dona Conceição, uma morena cor de canela, de olhos amendoados e negros quanto uma noite sem lua, mas que continha o fulgor da esperança, ela estava com um barrigão enorme e prestes a dar a luz.
Foi naquela vida sofrida de nômade, que em dezembro de 1953, com uns poucos meses de casados, exatamente no dia 29 de dezembro nasceu o primogênito do casal, um filho varão, como ansiava seu pai João de Biana. As dificuldades pelas quais passavam eram enormes. Com o trabalho na agricultura cada vez mais escasso, fato que impossibilitava ao patriarca ganhar o sustento necessário para suprir com as necessidades da família, uma alimentação adequada parecia ser impossível naqueles tempos. Por muitas vezes tendo apenhas raízes de mandioca e ovos de galinha de capoeira para comer, quando muito tinham. O pequeno Carlos, ainda bebe e como toda criança nessa circunstância da vida precisava se alimentar bem, por isso era com ele que a sua mãe mais se preocupava. Devido à comida consumida por ela ser pouca e desprovida dos nutrientes e proteínas extremamente necessárias para uma razoável produção do leite materno, por inúmeras vezes não tinha condições alguma de amamentá-lo. Então o leite materno era substituído por angu de farinha, e assim, neste cenário lastimável, a criança fora crescendo sem nenhuma perspectiva de uma vida digna.