HERANÇAS DA INQUISIÇÃO- COMO COMBATÊ-LAS

Encontre o inquisidor que há em você e subjugue-o

Reflexos do monoteísmo nas relações sociais

*Por Antônio F. Bispo

Boa parte dos segmentos religiosos e políticos são como grandes fábricas para criar gente abobalhadas, geradores de suas próprias verdades, que se acham donos de toda verdade universal, que se isolam em seus castelos ou ficam de tocaia em trincheiras, à espreita de inimigos que só existe na cabeça de quem os criou para os massacrar caso não concordem com o ponto de vistas destes. Um dos meios mais comuns de evitar combate direto com essas pessoas é se juntando aquele reino de fantasia, tornando-se de igual modo um militante de ideologias sem sentido ou auto anulatórias. Outro meio seria ignorá-las ou por meio de argumentos sólidos leva-los a fazer uso da razão. Essa última opção é a mais difícil de todas, porém não é impossível.

Tais segmentos criam sistemas que servem mais para dividir do que para somar indivíduos por objetivos comum a todos. Pessoas que vivem em função de construir um falso ego, tentando converter sempre o outro ao seu ponto de vista, sem nem analisar o sistema qual seguem inserido há anos. Indivíduos com comportamento de rebanho que mal conhecem os próprios sentimentos, mas julgam conhecer os profundos mistérios e desejos de suas divindades e líderes humanos. Sujeitos com fortes tendências a julgamentos precipitados, com um medo ferrenho de estarem errados, um desejo profundo de estarem certos sempre, uma negação total à realidade a sua volta e uma imersão completa no campo do surreal para inibir os próprios medos e viver numa realidade paralela. Isso são traços da herança da inquisição, que por sua vez tem parte de seus fundamentos na ideia da monoteísmo judaico-cristão-mulçumano. Toda vez que vires alguém numa tentativa desesperada de subjugar o outro ao seu ponto de vista, e que quando falta argumentos para dialogar ou exprimir suas ideias, parte logo para a agressão física ou verbal, ali estar o reflexo do pensamento inquisidor no modelo medieval.

O sentido original de inquisidor, deveria ser segundo o dicionário, aquele que investiga, que busca, que procura a lógica e prova dos fatos antes de decretar uma sentença a quem quer que seja, mas depois da idade média no mundo ocidental, parece que essa palavra mudou um pouco o sentido, e as pessoas que agem assim, parecem já ter uma verdade pronta sobre tudo e sobre todos sem averiguar nada, baseado nos próprios “achismos” ou em sentenças compradas para determinados fins. Calar o outro é o que importa, mesmo que o outro apenas esteja tentando alertá-los de um mal maior. São policiais, juízes e carrascos, tudo ao mesmo tempo. Prendem, julgam condenam e “matam” quem quer seja, baseado em argumentos tão profundos quanto a superfície de um pires de uma xícara. O sistema religioso é o que mais de produz inquisidores nesse sentido.

Comparo a um inquisidor nesse texto, pessoas que já tem um julgamento pronto para qualquer pessoa ao seu redor, que são incapazes de manter um diálogo sadio com quem quer que seja, partindo logo para agressão verbal, julgamento precitado, condenação e menosprezo eterno pelo outro, pelo simples fato de este, uma vez na vida em algum momento não ter concordado com sua opinião, principalmente se for de um ponto de vista relacionado a um modelo de crença ou rito religioso. Pessoas que não leem sobre nada, não pesquisam sobre nada, não gastam tempo em busca de novos conhecimentos, mas julgam saber sobre tudo, entender sobre tudo, e ter sempre a palavra final sobre qualquer assunto sempre. Pessoas que parecem ter pós-doutorado em todos os campos do conhecimento humano, mesmo sem nunca ter concluído o ensino médio. Se comportam como os grandes inquisidores de tribunais da inquisição, caçando, prendendo, torturando e dando sentenças de morte a todos que julgam ter aliança com o demônio, ou não se dobram aos caprichos de sua igreja. Essa herança maldita atravessou séculos e ainda somos afetados por ela. Diariamente somos vítimas ou causadores desse tipo de comportamento e nem nos damos conta disso.

Não quero dizer com essas poucas linhas, que devemos ser criaturas abobalhadas, concordando com tudo que nos dizem por ai. Intento levar o leitor a refletir como esse comportamento nos afeta, e apontar que a construção de argumentos verbais sólidos é o melhor caminho para se construir pontes entre as pessoas e elevar para um nível maior o ambiente em que vivemos. Não deixo de ressaltar que em certos casos se tornar impossível manter um diálogo coerente com pessoas semelhantes a bestas quadradas. Nesses casos outras habilidades são necessárias.

Julgo de certa forma que o comportamento de um sujeito com tendências inquisidoras venha ser resultados acumulados de sistemas de crenças, baseadas em leis “sagradas”, muito comuns em culturas monoteístas. A falsa certeza de estarem servindo a um deus certo e de modo certo, reflete não apenas na vida religiosa do sujeito, mas em toda sua vida social e em seus relacionamentos. Quanto mais eles se dividem, mas eles se combatem entre si e mais se acham certos em seus mundos particulares e mais querem subjugar outros ao seu próprio modo. Não exalto com isso a necessidade de se adorar a vários deuses para ser mais pacífico na forma de diálogo. Todo tipo de adoração a seres completos e perfeitos como dizem ser os deuses é um desperdício de energia, tempo e dinheiro. Algo totalmente desnecessário.

Citando os “livros sagrados” como base primordial para alguns comportamentos inquisidores, temos não apenas exemplos da inquisição católica, mas também na bíblia e no alcorão, vemos exemplos constante do comportamento inquisidor de indivíduos, que viviam em função de monitorar outros, para que encontrando-os infringindo “a lei” tinha o prazer de delatá-los, para que os mesmo fossem julgados e condenados, e estes (o delator) fossem tratados como heróis por delatarem um herege, retirarem o impuro do meio deles e assim, “agradar ao senhor”. Quando não achavam provas concretas contra um indivíduo, inventando-as com outras três pessoas de mesma índole, era suficiente para levar a morte uma pessoa inocente. Deus estava mais preocupado em registrar quem pegou alguns gravetos de lenha em pleno sábado para ascender um fogo e se aquecer ou quem falou mal do seu servo Moisés, do que em dar moradia digna e segurança ao povo que ele dizia ser sua propriedade particular.

Todo inquisidor perde tempo monitorando coisas fúteis e gastando tempo útil para gerar o que realmente se faz necessário. Tomam conta da vida dos outros procurando erros, e esquece de cuidar da própria vida.

Isso se reflete hoje em dia inclusive nos tribunais, onde algumas pessoas mal intencionadas, se comungam com outros “homens da leis” também mal intencionados e sem nenhum senso de justiça, processam e tiram vantagem de outros, ou simplesmente prejudicam, denegrindo sua imagem no meio em que vivem. Nesse estilo de trabalho, há quem viva hoje, em constante estado de praga biológica, se beneficiando da desgraça alheia por meio de construção surreais de fatos inventados ou omitidos. Para esse tipo de gente não existe certo ou errado, injusto ou justo, existe apenas a questão de encontrar falhas que permitam reinterpretar um mesmo paragrafo da lei de modo diferente quantas vezes forem necessária para tirar vantagem alheia.

É pelo compartilhamento de ideias e aperfeiçoamento das mesmas que evoluímos como pessoas e melhoramos nossas sociedades. E pela imposição forçada da crença alheia que tudo desmorona, torna-se uma ditadura, perde-se a criatividade e as pessoas tendem a viver como gado em currais, servindo apenas para determinados fins de quem os lidera. Quem sabe se não fosse o comportamento inquisidor dos últimos mil anos no ocidente, estaríamos pelos menos 20 séculos adiantados, vivendo numa sociedade mais justa mais auto sustentável sem os atuais regimes políticos, religiosos, jurídicos, militares e econômicos que conhecemos atualmente.

Somente pessoas tolas querem estar sempre certas o tempo inteiro em todos os aspectos mesmo não sabendo nada sobre o assunto em questão. Quase todos nós temos sido treinados a ser tolos, tentando subjugar o outro ao nosso ponto de vista apenas no intuito de nos acharmos superiores num debate, inclusive quando estamos discutindo coisas fúteis, como qual o melhor time de futebol, ou o político mais honesto. Esses dois temas por exemplo, depois da religião, em questão de debates fúteis, tem sido os dois campos onde mais se tem gerado problemas e não soluções sociais.

Quando fazemos um julgamento precipitado sobre um conceito alheio, sem que antes o outro possa vir a concluir sua linha de raciocínio, estamos agindo como agentes da inquisição. As vezes estamos enterrando ideias valiosas e benéficas a nós mesmo ou a tantos outros, por perdermos a capacidade de dialogar e querermos sempre vencer o outro o tempo inteiro. Vários inventos maravilhosos foram “abortados ainda no útero”, em um momento de baixa estima do inventor mediante pressão de seu prepotente e ignorante inquisidor.

Não quero dizer aqui, que devamos perder nosso tempo para ouvir gente que usa o mesmo discurso há 20 anos baseado apenas no campo do surreal para te intimidar a se converter a crença deste, um sujeito que nem se quer pensa no que estar dizendo e age como papagaio repetindo tudo que ouve por ai, e mesmo assim intenta convencer você a esse modo medíocre de ser. Me refiro a ocasiões em que num primeiro contato com um indivíduo queremos sobrepuja-lo ao máximo, diminui-lo, esmaga-lo e reduzi-lo a nada baseado em nosso próprio conceito de verdade. Dizem que a primeira impressão é a que fica. Isso seria verdade se fosse o receptáculo do saber universal. Motivos diferentes levam pessoas a terem reações diferente num primeiro contato com o outro. Podemos estar perdendo a capacidade de nos relacionarmos com pessoas de mente grandiosas por julgamos em primeira instancia.

As redes sociais é um campo fértil para esse tipo de comportamento, pois o fato de não se estar presente com o outro indivíduo, dar uma confiança maior ao ofensor em descarregar todo um acumulo de lixo tóxico que há em si no outro. Palavrões e xingamentos é o mínimo que se colhe em debates como esses, travados virtualmente por pessoas com tendências inquiridoras.

Pelo modelo social em que vivemos, somos tendenciosos a querer reduzir ou definir uma pessoa com vários anos de existência, experiência e vida particular própria, baseado em apenas 3 ou 4 parágrafos de uma conversa numa tela. Troca de experiências incríveis podem ser deixado de lado por atitudes como essas. Funciona mais ou menos assim: concordou comigo é meu amigo, discordou de mim vá pra PQP! Isso vale para os grandes you tubers, com milhões de seguidores, até pessoas comuns, com apenas 8 contatos em seu perfil. Somos muito mais que símbolos gráficos representados em uma tela ou títulos que nossa sociedade nos impôs a grosso modo.

Se bem que as vezes dá uma vontade enorme de dizer um PQP pra muita gente! Porém ouvir, avaliar e reavaliar a posição do outro pode as vezes nos fazer enxergar um “animal ferido” que estar atacando apenas para manter seu território, por que foi acuado ou para se manter vivo. Isso vale pra vida real também e não apenas virtual.

Uma das armas que nos foi ensinado para manter nossa posição onde estamos, inclusive pela nossa própria natureza animal é a arte de intimidar para se defender, copular ou manter território.

Há pessoas que procuram intimidar outros pelos títulos e posição social que possuem. Outros pelo poder financeiro. Outros pelo porte físico. Outros pelo porte de armas. E outros ainda pela má reputação que possuem. Há ainda outros afortunados cujas características físicas são considerados padrões de beleza para a sociedade qual esteja inserido e por isso conseguem com uma facilidade maior, aquilo que desejam sem muito esforço. Outros usam da manipulação e fazem papel de coitadinhos para mendigar atenção e afeto causando males nos mais diversos níveis quando envolvem outros no seu teatrinho barato.

Existem outras pessoas porém, que fizeram história por onde passaram, foram ícones em sua época e são tidos como exemplos até hoje, não por possuírem todos os atributos acima citados juntos, mas por possuírem um atributo raro e valiosíssimo, que por sinal além de ser raro, o senso religioso comum procura diminui-lo ao máximo.

Me refiro a capacidade argumentativa que poucos indivíduos possuem para defender suas ideias sem se tornarem soberbos ou arrogantes e com esta capacidade conseguem vencer os maiores combates sem precisar dar um tiro, um soco, ou usar de seus títulos para subjugar o outro. A capacidade de lidar com idiotas, sabichões, e pessoas realmente instruídas, sem que seja necessário medir forças com os mais fortes, ou se aproveitar dos mais fracos. Pessoas que não estão preocupadas com a fama ou destaque social, mas que quando entram em um “combate” fazem proezas capaz de elevar o estado espirito de todos ao redor. Uma virtude preciosa aos homens, pouco encontradas nos deuses, pouco incentivadas nas sociedades e quase sempre interpretada como fraqueza. Uma capacidade capaz de destruir e reconstruir reinos e destronar imperadores.

Do mesmo modo que grandes músicos, pintores, artistas e outros profissionais dedicados transformam coisas simples ao seu redor em obras de arte ou coisas prazerosas de se ver, ouvir, tocar ou sentir, pessoas como esse tipo de capacidade são capazes de redirecionar a bestialidade humana, aproveitando toda energia desperdiçada em coisa fúteis, para ser usada em coisas úteis a todos. Podem se tornar domadores de burros, encantadores de serpentes, ou regentes de coros angelicais. Sempre conseguem se encaixar no perfil do outro, compreender o mundo ao redor deles, e construir um mundo sólido a partir de argumentos subjetivos transformando a realidade ao seu redor.

Essa capacidade, assim como várias outras é como uma faca de dois gumes: se caída em mãos erradas faz vários estragos. Se desenvolvida por pessoas que tenham um auto equilíbrio pessoal e faça um bom uso de suas razões, emoções, e interesses próprios, tais pessoas literalmente fazem história, mudam a face do lugar onde vivem e se tornam imortais, reconhecidas em vários cantos do mundo e por várias gerações. Se há um poder capaz de produzir mudanças profundas, evolutivas e pacificas esse poder se chamar o poder da argumentação.

O pensamento religioso tem sido a força destruidora desse poder individual, construindo nas pessoas um falso ego, baseado na crença de seres imaginários, de como agradá-los e como servi-los melhor. Nesses quesitos, quase toda argumentação construída socialmente gira em torno de criar relações com seres imaginários, desprezando a necessidade de aprimorarmos nossas relações pessoais uns com os outros. Vivemos no meio de mais de 7 bilhões de pessoas reais, mas estamos argumentando o tempo inteiro como nos darmos bem numa relação com um punhado de seres imaginários e como levarmos vantagem sobre outras pessoas por construirmos relações de amizades ou submissões a esses seres. A maior parte de toda literatura produzida no mundo inteiro gira em torno disso nisso. Isso reflete nas relações políticas, empresariais, militares, educacionais ou em qualquer repartição pública social.

Do mesmo modo que as pessoas aprendem a bajular os deuses para se destacarem, passam a bajular seus líderes humanos, e quase sempre o único meio para subir de nível nessas instituições não é pelo mérito adquirido ou pela competência do indivíduo, mas pelos laços de submissão incondicional criado com seus chefes de maior patente. Por isso vemos tolos se achando deuses nos mais diversos segmentos sociais, pessoas que nem em sonho deveriam ocupar tais funções, mas descobriram a fórmula secreta para ali estarem, e não mediram esforço para consegui-lo. Tudo seria diferente, se não trouxéssemos para nossa vida real, o modelo de relações corruptivas que mantemos com seres imaginários, porém o modo como as pessoas se relacionam com seus deuses, refletem o tempo inteiro na vida cotidiana, trazendo prejuízos irreparáveis. A terceirização de culpa é a principal delas. A inercia por achar que há um plano traçado pelos deuses para cada um de nós e nada podemos fazer para mudar isso é outra grande pedra em nosso sapato de ordem e progresso.

Desde os tempos mais remotos que se tem registro da humanidade, vemos o pensamento religioso permeando nosso dia a dia fazendo com que mais de 70% de nossas ações e decisões sejam baseadas num conceito religioso predominante ainda que nem percebamos. Mesmo que um indivíduo não seja religioso ou nunca tenha pisado os pés em igreja nenhuma, não deixa de ter sua vida afetadas pelo campo imaginário produzido pelas religiões em geral. O comercio, os feriados de modo geral, alguns artigos das constituição, a produção de alimentos e o sistema educacional. Tudo isso é afetado diretamente pelo senso religioso, local, estadual ou nacional. Somos mantenedores ou vítima dessa nefasta relação que pouco produz e muito se exige.

Sociedades politeístas devido a pluralidade de gostos e características dos ícones venerados, são capazes de produzirem indivíduos mais sociáveis e menos violentos quanto a aceitação de outras “verdades” segundo o seu ponto de vista. As pessoas se metem menos na vida dos outros para tentar impor seu próprio conceito de certo e errado quanto a arte de venerar o imaginário, pois cada um tem o seu conceito próprio de verdade, baseado no deus que decidiu adorar. Se por um lado isso é bom pois reduz em muito os conflitos causados pelas crenças religiosas, por outro lado isso é péssimo, pois cada um pode criar do nada uma nova “verdade” sob um ponto de vista fabricado em sua própria experiência pessoal, e repassar aos outros sem questionamentos nenhum, já que é permitido a criação de verdades particulares em todos os níveis e profundidades que se possa imaginar.

Cria-se desse modo, uma sociedade com pessoas de atitudes abobalhadas, venerando animais, insetos, plantas, gente morta ou que possuam capacidades físicas de elevarem seus corpos até o limite da exaustão sem sofrerem tanto como uma pessoa comum. Nesses recantos do mundo, você verá pessoas que fazem jejuns prolongados, passam anos sem cuidar da própria higiene pessoal, subtrai partes do corpo ou inserem vários objetos no próprios corpos, comem coisas intragáveis ou manipulam suas genitálias como se fossem feitos de elásticos ou de rocha bruta. Tais pessoas se tornam destaques no local onde vivem, são considerado deuses ou manifestações dos mesmos passando a receberem adorações, doações de alimentos ou outros objetos que possivelmente pudessem agradar a divindade ali representada. Isso vale para objetos animais, insetos e plantas também venerados.

Uma sociedade de adoradores não deixa de ser uma sociedade frágil, corrupta e de fácil manipulação não importa o ícone a ser venerado, pois tendem a aprimorar suas relações apenas no intuito de servir as divindades e não de servir uns aos outros. Pouco ou nada se faz para mudar o próprio destino, quando se acredita que tudo nesse mudo já foi traçado por um deus qualquer, inclusive o destino pessoal de cada um.

Nesse modelo, não há questionamentos, nem argumentação, nem lógica e nem se precisa dar explicação a ninguém. Cada um faz o que bem entender, do jeito que entender, desde que não invada a privacidade ou a crença do outro. São criaturas mais propensas a passividade, apesar de perderem seu precioso tempo se relacionando com seres que só existem em suas cabeças.

Por outro lado, temos nas sociedades que se consideram monoteístas o sentimento de inquisidor, manifestado em cada grupo, e repassado individualmente para cada indivíduo. Nesse aspecto, temos cerca de 4 bilhões de pessoas, divididos em 3 principais religiões, com dezenas ou centenas de subgrupos, com milhares de templos e rituais litúrgicos específicos e cada indivíduo, de modo particular professando sua verdade, e digladiando-se com os demais do mesmo e dos demais grupos, para manter viva sua dita verdade. Enquanto nas sociedades politeístas ninguém questiona a verdade do outro, nas sociedades monoteístas, há uma necessidade enorme de sobrepujar a “verdade” alheia.

Assim você pode encontrar um indivíduo que diz estar seguindo a um deus verdadeiro, que se considera estar na religião verdadeira, que acredita estar numa “perna” daquele seguimento verdadeiro, que acredita possuir a liturgia mais correta entre todos, e que entre tantos do seu grupo local, pelo seu modo de ler o livro considerado sagrado a todos, junto com sua experiência pessoal vivida + uma pitada de ignorância e falta de argumentação, e você terá um sujeito santarrão, insuportável que tenta subjugar a todos ao seu ponto de vista, baseado nos próprios medos e experiência pessoais. Um sujeito que apesar de estar numa igreja, ofende e fere a todos ao redor, inclusive os da própria igreja por se achar o mais certo entre os certos. Enquanto no politeísmo deus se agrada de todos em geral, nesse aspecto do monoteísmo, deus se agrada apenas daquele indivíduo chato e medíocre segundo seu próprio modo de ver. Entre 7 bilhões de pessoas, ele é o mais certo do mundo todo e o pai criador anda lado a lado com ele, para cumprir todos os seus gostos pessoais, inclusive lançar doenças terminais aos que discordam desta pobre criatura.

Por motivos como esses vemos pessoas de 3 religiões diferente que dizem servir a um mesmo deus se digladiando entre si. Pessoas da mesma religião dividindo-se em grupos por se considerarem melhores, e pessoas do mesmo grupo e do mesmo ambiente de culto diário trocando farpas entre si por se acharem mais sábios ou mais santos que os demais.

Do outro lado do mundo vemos pessoas sem capacidade de avaliação, que julgam que todos no mundo em sua forma de crer estão certos, inclusive eles mesmo. Do lado de cá do planeta, encontramos indivíduos que se fecham em seus mundos particulares e se acham mais certos que todos os demais do mundo, e que a divindade o tem como objeto de atenção exclusiva por esse ser mais fiel que os outros ou ter um modelo pessoal de culto superior aos outros.

Saímos de um extremo ao outro num passe de mágica.

Nas sociedades politeístas, perde-se a capacidade argumentativa por considerarem todos os ritos certos, então não há por que argumentar já que todos estão certos. Nas sociedades monoteístas, perde-se a capacidade argumentativa por desejar impor ao outro, seu modo pessoal de ser e desse modo não há espaço para um diálogo sadio. Enquanto um não tem certeza de nada, o outro tem certeza de tudo, de estar certo o tempo inteiro. Um modelo de crença é mais propensa a paz em nome dos deuses. O outro vive em guerras diárias há milhares de anos em nome deles. Todos temos nossa vidas afetadas por um desses modelos. Afetadas para o bem ou para o mal, ainda que o indivíduo em questão não seja nem politeísta ou monoteísta, que seja um agnósticos, ateu ou livre pensador.

Seres imaginários povoam a mente das pessoas e todos somos direta o indiretamente afetados ou influenciados por isso.

O problema da maioria em peso dos indivíduos que seguem uma linha do monoteísmo, é que eles são muitos propensos a serem inquisidores. A falsa certeza de estarem fazendo o certo de modo certo, impede que se mantenham um diálogo sadio com a maioria deles. Ocultam os próprios erros do passado e do presente, para viverem em seus mundos encantados onde seu deus e eles são o retrato um do outro, ambos respirando ou expirando o ódio e maldade que numa simbiose maldita alimenta aos dois.

Outro grande detalhe que passa despercebido por todos, e que não há monoteísmo nas religiões monoteístas. Ainda que assumam adorar apenas um deus, todos são obrigados a venerar e temer seus superiores e jamais discordar de sua linha de raciocínio, por mais esdrúxula que essa venha ser.

Judeus tem de considerar como certos e inquestionáveis os ensinamentos de todos os rabinos de todas as eras. Mulçumanos tem de cumprir á riscas os mandamentos impostos pelos Aiatolás e seus subalternos. Cristãos evangélicos e protestantes, tem de literalmente levar nas costas uma cadeia inteira de líderes ou artistas gospel em suas hierarquias, pagando suas contas, consumindo seus produtos, realizando seus desejos e fazendo-os prosperar em tudo enquanto estes minam até o último centavo de suas ovelhas. Cristãos católicos além de manterem com suas finanças toda uma hierarquia de homens de batina em funcionamento, tem licença gratuita para venerar uma infinidade de ídolos de pedra, madeira ou seja lá do que for sem que isso lhe seja imputado como pecado, desde que seja um dos ícones canonizados pelo líder superior da igreja.

Em todos esses três segmentos do monoteísmo, questionar essas atitudes é pedir para morrer ou ser excomungado da família ou da sociedade em geral. Portanto monoteísmo nessas religiões é utopia. É só um meio para alcançar vários outros fins. Tão estupido quanto se prostrar diante de uma vaca ou macaco para lhes render adoração, é se prostrar diante de homens de ternos, batinas ou talits e deixar que os mesmo controlem suas vidas em todos os aspectos, te sufocando, minando suas forças, seu tempo útil ou seus recursos financeiros. Respeito por alguém ou por seus ensinamentos não tem nada a ver com submissão cega e total aquele mesmo indivíduo. Somos livre para concordar ou discordar de quem quer seja, inclusive de sofrer ou reaprender a viver com os próprios erros se necessário for, sem precisar sermos ameaçados, humilhados ou banidos socialmente por não se deixar ser tratado como rebanho.

Ainda no aspecto da construção de um caráter inquisidor dos indivíduos que professam fé monoteísta, judeus, mulçumanos e cristãos, tem seu modo particular de fazer inquisição e julgar todos os que são considerados hereges. A grosso modo todos os 4 bilhões de pessoas que dizem seguir uma dessas 3 crenças monoteístas também são hereges de alguma forma e nem percebem, pois entre eles, duas pessoas podem até concordar em 99% com um ponto de vista um do outro quanto ao ser venerado, suas características ou o modo correto de cultua-lo, mas de modo algum, em nenhuma dessas 3 religiões, se é possível encontrar apenas 2 pessoas que concordem em 100% dum mesmo ponto de vista em tudo, pois os deus nesses casos e suas vontades nesses aspectos, são interpretado de acordo com a experiência pessoal de cada um, incluindo experiências de dor, sofrimento, frustações, ganancia ou ignorância. Assim, todo monoteísta é ateu e ao mesmo tempo herege em algum ponto de sua crença segundo a visão do outro. Temos 4 bilhões de hereges, condenando uns aos outros do mesmo grupo e todas as demais no mundo. Todo monoteísta é um ateu da religião alheia por não acreditar nos demais deuses das crenças politeístas escolhendo apenas um entre tantos para chamar de seus, assim como se torna um herege particular da própria religião por viver em constante conflito uns com os outros para mostrar quem sabe fazer melhor.

Atitudes inquisidoras fazem inflar o ego, e criar no indivíduo a falsa ideia de que tem um nível de comunhão maior com o papaizinho querido. Nos livros sagrados dessas 3 religiões, vemos vários casos de atitudes inquisidoras que são louvadas a grosso modo, fazendo com que atitudes de violência e desafeto sejam consideradas sagradas inclusive nos dias atuais.

Ninguém percebe isso, e os que percebem são convidados a se calaram para não serem punidos pela liderança ou pelo próprio deus. Assim consideram latrocínios, homicídios, estupros, invasão de privacidade, terrorismos, homofobia, xenofobia ou feminicídios como sendo ordens diretas do trono de deus.

Os poucos questionadores que tem surgido nessas 3 religiões, tem enfraquecido de alguma forma o sistema, mas o preço tem sido pago com suas próprias vidas pela ousadia de argumentar contra algo tido como certo e verdadeiro pela grande maioria. Toda verdade é verdadeira até que alguém prove o contrário ou se rebele contra ela. Somente movimentos orquestrados simultaneamente em vários lugares do mundo, poderiam tornar em crimes, atitudes que são totalmente legais nesses países, a exemplo de casamentos de velhos pedófilos com criancinhas indefesas, mutilação genital forçada, entre tantos outros. Tudo é legal e permitido em uma religião ou lei, até que a maioria comece a questionar sobre isso. Questionadores são como a centelha inicial que faz inflamar toda uma floresta enegrecida pela escuridão da ignorância. “Morcegos”, “serpentes” e “insetos peçonhentos” preferem a escuridão da ignorância para manter seus territórios, por isso atacam vorazmente todo que intente ascender algum tipo de luz a humanidade.

No mundo cristão, para quem já leu pelo menos um pouco de história secular, sabe-se mais ou menos como funcionava os tribunais da inquisição católica e protestante. Quem já estudou a fundo a história do cristianismo e se deu conta do que esse mal causou ao mundo, pode até sentir vergonha de se auto intitular cristão.

Nos tribunais da inquisição, acusava-se alguém de heresia, com ou sem provas e praticamente não dava-se se o direito de defesa ao acusado. Tudo era orquestrado para que aquele indivíduo fosse acusado, torturado e morto independente das provas ao seu favor. O pior é que o poder de inquirir, ia além dos oficiais da igreja, e qualquer um poderia acusar outro de heresia baseado em sua própria forma de entender a ideia de deus, e levar a morte uma simples mãe de família que fora flagrada colhendo ervas do campo para curar uma simples diarreia do seu filho moribundo.

Nessa época negra da história, tudo, praticamente tudo era do diabo, feito pelo diabo, ou acontecia em função do diabo. As pessoas enxergavam o diabo em tudo. Numa população com quase 95% das pessoas sendo não alfabetizados valia o que a igreja dizia. Sem falar que o acesso aos livros era limitado e toda forma de conhecimento humano tinha de ser aprovado pela igreja para ser considerado útil e legal. A própria ciência era a principal ferramenta do diabo para afastar as pessoas de deus, segundo as pessoas dessa época.

Hoje vivemos numa época moderna, a maior parte da população ocidental tem acesso a vários tipos de informação, mas mesmo assim, a influência de líderes eclesiásticos ainda permeia várias das decisões efetuadas pelas pessoas dentro e fora dos recintos religiosos. Ameaça de morte, inferno ou de prosperidade facilitada sem trabalho algum, são as propagandas feitas pela mídia mercantil cristã moderna para manter as pessoas sob seu domínio. O mal de hoje não é falta de acesso as informações disponível, antes sim é falta de procurar conhecer a própria crença, de ler e entender sem “cabrestão” os próprios livros tido como sagrados, e falta de uma sensibilidade tátil para enxergar o mundo em geral além dos quadros fantasiosos que foi pintado pela igreja.

Se por um lado os que estão dentro de sistemas como esses estão presos em ilusões, muitos dos que conseguiram sair, estão se tornando orgulhosos, ocupando boa parte do seu tempo apenas tentando mostrar que o outro estar errado, e não em apontar um caminho superior sem que pra isso seja preciso humilhar ou reduzir o outro a nada. Se retirarmos as muletas de um aleijado e não dermos outro meio de locomoção a ele, podermos deixa-lo rastejando ao invés de torna-lo independente. De lagarta a borboleta se faz necessário o amadurecimento necessário.

Uma pessoa que conseguiu se libertar de sistemas religiosos opressores e se alegra em ver a alienação alheia, pode estar sendo tão masoquista quanto um cristão alienado que conta as horas pra vinda de jesus, para ver seus “inimigos” ardendo no inferno. Pode até ter saído do sistema, mas trouxe aquilo que de pior aprendeu lá dentro.

Outro “ponto cego” que afetam muitos dos que aprenderam fazer uso da argumentação logica, é a incapacidade de se tornarem neutros em certos casos, nos assuntos que pretendem defender, e defendem interesses pessoais, como se fosse a construção de uma verdade universal. Assim usam suas habilidades de oratória, de escrita ou mídia audiovisual para promoverem líderes políticos, religiosos ou do mundo empresarial apenas no intuito de serem agraciados por estes.

Que sejam testemunhas disso os marqueteiros políticos que pintam um quadro paradisíaco de um cenário semana antes da eleições para que depois o povo encontrem um “inferno” apenas um dia após o candidato em questão ter sido eleito. Que sejam testemunhas disso, os que fazem propagandas de alimentos doentios e causadores de uma série de doenças como se fossem um manjar dos deuses. Que sejam provas disso todos os obreiros e subalternos de líderes eclesiásticos que com suas habilidades de oratória e persuasão pintam um quadro angelical de seus líderes para subirem de cargos, enquanto escondem o roubo, adultério, pedofilia, corrupção, manipulação intencional de informações, apropriação indébita de bens alheios e vários outros abusos. “Assim na terra como nos céus...” Do mesmo modo que as pessoas bajulam os deuses para estreitar relações com esses, bajulam também seus líderes em troca de posições elevadas. Traidores da pátria, da ordem, da saúde, da justiça e da liberdade.

Se libertar de um sistema opressor é uma conquista. Se libertar das mazelas que interiormente adquirimos nesses sistemas é questão de honra. Conhecer a nós mesmos e os motivos que nos movem é fundamental para conhecermos o outro e construir argumentos sólidos para causar mudanças sociais profundas.

Não tanto aos céus, não tanto a terra. A busca pelo equilíbrio é uma constante que não deve ser ignorada. A consciência de que não somos perfeitos mas podemos completar e aperfeiçoar um ao outro, faz minimizar a arrogância que há em nós. A inércia nada produz. É nos embalos da vida que podemos retirar lições valiosas de aprendizado. Um aprendizado constante e prazeroso. Se desapegarmos apenas um pouquinho das relações com o imaginário, pode nos render tempo e compressão o suficiente para vivermos e aprimorar nossas relações com pessoas reais.

Sanidade e saúde a todos!

Texto escrito em 7/9/17

*Antônio F. Bispo é Bacharel em Teologia, Estudante de Religião em Filosofia e Capelão Ev. Sem vínculo com denominações religiosas desde 2013.

Ferreira Bispo
Enviado por Ferreira Bispo em 07/09/2017
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