A TRISTE SAGA DO OURO- Uma reflexão sobre inversão de valores
*Por Antônio F. Bispo
Os recursos naturais básicos para nossa sobrevivência, bem como pedras preciosas encontradas na natureza, existem antes do surgimento do homem, e depois deste os tais ainda continuarão existindo. “Nada se cria, nada se destrói, tudo se transforma”, já dizia um grande Cientista. Os recursos que podem ser usados em favor do homem para o homem, tem sido usado para que aprisionemos uns aos outros, exploremos uns ao outros, e pela busca de tais recursos destruamos uns aos outros não para os consumir, mas para armazenarmos e chamarmos de nosso. Estamos permitindo ser usado pelas coisas aos invés de as usarmos para fins realmente necessários. Esquecemos que nossa estadia aqui é extremamente transitória, e que não significa muita coisa a luta desenfreada pelo acumulo de tantas coisa não essenciais a nossa sobrevivência considerando a fragilidade de nossa estrutura biológica. Uma simples microscópica bactéria, pode nos tirar de circulação e abreviar nossa saga de ganancia.
Mediante os fatos escandalosos que tem se desenrolado em nosso pais nos últimos 5 anos, no que diz respeito a corrupção e desvio de recursos públicos para fins pessoais, tais atos feitos exatamente por aqueles que diante do povo juraram fidelidade ao povo, ponho-me a refletir sobre a triste realidade da condição humana e a inversão de valores. Uma observação local, apesar de perceber que tais fatos acontece em vários outros lugares do planeta desde que gente é gente.
Quem ver cara não ver coração. O conjunto de valores refletidos nas diversas atitudes que tomamos quando estamos a sós ou quando estamos sendo vigiados, declara de modo aberto quem realmente somos e o grau de evolução espiritual em que chegamos. Não me refiro ao espiritual no sentido religioso da palavra. Me refiro a espiritualidade nesse momento como estado de consciência por nós alcançado em relação a nós mesmos e em relação a todas as coisas com as quais nos relacionamos, sejam seres animados ou inanimados.
Baixo, médio, ou alto, todos temos um tipo de consciência que nos define quem somos, o que fazemos e como honramos nossos compromissos, sejam eles verbais ou contratuais, e como respeitamos a vida e as pessoas de modo geral sem que seja necessário sermos coagidos física ou psicologicamente a isso. Não infringir as leis por que é o melhor a ser feito dentro de uma sociedade é um coisa. Não infringir as leis apenas por que estar sendo vigiado é outra. Fazer o que é certo pensando no bem coletivo é uma coisa, fazer o que é certo apenas para receber, elogios, galardão ou recompensas também é outra coisa. Considero a espiritualidade que te ensina fazer o bem com intuito de receber um galardão futuro, semelhante ao sistema de adestramento canino, que são ensinados a mexer o rabinho em troca de um tostão de alimento ou carinho, sem falar que essas pessoas só farão “o bem”, de acordo com o entendimento de bem que seu grupo considera. Explodir a si mesmo e matar o maior número de “infiéis” possíveis é um ato de extrema bondade para os seguidores extremista da crença muçulmana, por exemplo. Fazer o que é bom pensando no resultado coletivo, é outra história. Somente as mentes mais avançadas conseguem chegar a esse estágio. Os demais, talvez tenham de galgar um longo caminho até lá. Já dizia um grande escritor: “vivemos num imenso estado de praga biológica”! Sou obrigado a concordar com ele depois de muito analisar nossa relação com nossos semelhantes e com tudo que nos rodeia.
Exploramos, mentimos, enganamos, conquistamos, para depois deixarmos tudo ai. Na coletividade somos ensinados que os fins justificam os meios. Ao contrário disso, julgo que cada minuto, cada passo que damos, cada relação e o momento presente, estes sim são sagrados. Sacrificamos o presente visando um futuro que talvez nunca chegue pra maioria. E se chegar tal futuro projetado com base na exploração alheia, será que realmente valeu a pena? Boa parte dos recursos naturais disponível, não tem sido usado para beneficiar o homem, antes sim, para oprimi-lo em seu próprio nível de consciência, ou privá-los dos recursos que realmente importam a nossa sobrevivência.
Vejamos por exemplo o ciclo do ouro e de outras pedras preciosas.
Usado por pessoas e países como moeda de troca, lastro financeiro ou reserva de patrimônio, facilitou em muito o comercio entre os povos que por sua vez influenciou a globalização. Estudado suas propriedades pela ciência, tem sido usado na indústria para fabricação de peças de alta precisão e durabilidade, além de ser um excelente condutor de calor. Há ainda pesquisas voltadas ao campo medicinal feita pelo uso desse material. Entre os aventureiros , piratas e pessoas gananciosas, sua maior função ao longo da história entre os humanos, é a compra de escravos, corrupção de poderosos, motivo de guerras, saques e destruição inteira de vilarejos em busca desse metal. Então me questiono, quanto realmente vale os metais ou pedras preciosas? Só depende do seu nível de consciência, talvez seja uma das respostas. As coisas só tem o valor que damos a ela, ou que socialmente fomos ensinados a enxergar nelas. Em nosso estado de pureza primitiva por exemplo, as coisas nos são boas pela utilidade e não exatamente pelo que elas representam socialmente. Ofereça uma barra de chocolate de 2 reais a uma criança e um anel de diamante de 2 milhões de reais a este pequeno, e me diga o que ela vai escolher. Ofereça um pedaço de terra fértil, pronto para o plantio a um nativo que vive do solo, e ofereça um quadro de um grande pintor renascentista e me diga com o qual ele vai ficar e tirar mais proveito. As coisas nem sempre valem o preço que se põe nelas. Fomos ensinados a dar valor a coisas que pouco importam, ou que não fariam muita diferença se não as tivéssemos sob nosso poder e desprezarmos as coisas realmente desnecessárias.
Vejamos o que fazemos com esse metal, e como ele nos usa ao invés de usarmos a ele. Observe: as pedras preciosas, estão na natureza em seu estado natural, milhões de anos, antes de chegarmos aqui. Muitos de nós andamos por cima delas e nem sabemos. Nada influencia nosso estilo de vida até o dia em que saibamos que ela estar ali. Depois que são descobertas, toda uma sociedade fica em polvorosa. Somos capazes de abrir buracos gigantescos no meio de cidades povoadas ou em campos produtivos, para iniciar a extração desse metal. Bilhões de toneladas de terra, rochas e outros detritos são retirados do solo, em busca de alguns quilos desse metal. Quando sua extração acaba, deixa-se a paisagem natural modificada, enormes buracos, ou terrenos desvalorizados em suas margens. A população local, mesmo saindo no prejuízo a curto e longo prazo, tem o prazer de encher a boca e dizer que foi encontrado ouro em sua cidade, de terem sido uma vez na vida notícia de jornal...Pobres coitados! A falsa sensação de fama de 15 minutos é outra ilusão que criaram, para fazer como que venhamos a sorrir para o mundo enquanto somos explorados. Um escravo que se tornou famoso por trabalhar mais que outro, não o torna um cidadão livre, apenas o torna um escravo mais conhecido. Assim fazemos uns aos outros. O desejo de fama, faz com que venhamos a demonstrar gratidão ao opressor, enquanto estes nos exploram.
Agora observe outra coisa: o metal estava escondido sob vários metros debaixo do solo, foi encontrado, tirado, moldado, lapidado, transformado, comercializado, para depois ser mais uma vez escondido e bem guardado em sua casa em cofres fortemente protegidos ou em alguns dezenas de metros abaixo do sub solo mais uma vez por grandes banqueiros. Percebestes? Estava escondido, nós o encontramos para depois torná-lo a esconder? O que realmente fizemos então? Para que tanto esforço? Se o que faz esse metal ser preciso é o fato de ele estar escondido, por que desenterra-lo pra depois enterrá-lo de novo? Apenas o verbo ter é quem gera uma sensação de segurança naquele que considera ter alguma coisa aqui nessa vida. Nada temos. Apenas fazemos uso das coisas enquanto vivemos ou deixamos que as coisas nos usem.
Veja outro fato que pouca gente percebe: para extração de ouro e outros metais preciosos, muita gente é explorada. A grande maioria pobre, que não recebe nem 0,5% do valor do serviço prestado em relação ao mercador final. Quanto mais trabalho, menos lucro para os que extraem esse minério na linha de frente. É assim nesse triste mercado. Assassinatos, desabamentos, amputações, isolamentos da família, e vários acidentes de trabalhos são constantes para os que se ocupam da extração desse tipo de “riqueza”. Depois que o produto é processado, a maior quantidade dele vai para cofres bancários, de empresas de valores ou grandes fortificações como o Fort Knox nos estados unidos. E quem vai fazer a segurança desse patrimônio? São os grandes multimilionários? Claro que não! Serão peões, como num jogo de xadrez, pessoas comuns, que estarão colocando suas vidas a prêmio, para guardar esses metais, para os mesmos barões que explorou tantas outras pessoas para os tirar do solo. Simples metais! Anda e vira, vemos em noticiários, seguranças de empresas de valores que foram mortos enquanto faziam transportes ou guarda de tal patrimônio. Desde os mais antigos tempos temos relatos de caravanas inteiras e de guarnições militares que foram dizimadas por saqueadores em busca desse vil metal. E o que faz a pessoa que se apossa por meio do roubo desse ouro? Torna a esconder e usar aos poucos, para depois ser roubado de novo e escondido de novo dando seguimento ao ciclo maldito da ganancia. O metal em si é neutro para os que não foram envenenados, ou talvez ele seja a centelha que ativa a alma do ser não evoluído que faz de qualquer objeto produzido a causa final de sua existência terrena.
Dezenas ou centenas de pessoas morrem durante a extração dessas pedras. Outras centenas e milhares de pessoas morrerão ao longo da história para transportar ou proteger tais pedras e metais. Até o dia em que elas mais uma vez sejam perdidas, roubadas, emparedadas ou afundadas, para o ciclo de busca, mortes e “aventuras” recomeçar. Há um filme chamado Diamante de sangue, com o ator Leonardo Dícapio, que retrata em partes o que acabei de citar. Vale a pena assistir. Você vai ver quanta gente é morta e explorada pra que uma “madame” da política (carioca), ou uma celebridade venha se adornar com esse material.
A maiores celebridades na mídia mundial, compram por fortunas absurdas, algumas pedras que pesa um pouco mais que um caroço de feijão. A maioria delas, usarão em público aquele objeto uma ou duas vezes na vida, em ocasiões especiais, apenas quando se sentirem seguras, para depois deixar a maior parte do tempo, tais objetos trancafiados na máxima segurança possível. Uma fortuna enorme, por um objeto de pouca utilidade, apenas para viver a ideia de grandeza.
Deveríamos nos perguntar se o valor de um objeto estar na sua serventia, no status que este representa, ou apenas na consciência coletiva do valor que atribuímos a esse objeto. Tem horas que não consigo entender a raça humana. Fazemos coisas fantásticas, somos capazes de voar para outros mundos, explorar os profundos dos oceanos, produzir ferramentas de precisões milimétricas e nos comunicar por milhões de códigos visuais, auditivos ou sinestésicos mas nos deparamos brigando por migalhas...Quando vejo pessoas sendo capazes de matar em coletividade, ou cometer os mais inimagináveis crimes impensáveis, simplesmente para possuir um pedaço de metal, dentro de um cofre inacessível trancado a sete chaves...nessas horas eu me pergunto se realmente evoluímos em alguma coisa ou se não deveríamos voltar a viver em bandos, subindo em árvores nas savanas africanas.
As demais criaturas retiram do ambiente somente aquilo que precisam para sobreviver, naquele instante, naquela hora, ou para atravessar períodos sazonais. Ao invés de possuirmos as coisas, deixamos que elas nos possuam. Tem alguma coisa errada em nossa espécie. Talvez a herança dos deuses que um dia governaram a terra, talvez a manipulação em massa que sofremos, talvez a herança cultural religiosa, talvez tudo junto. Só sei que isso não é normal. É sinal de burrice! Se as coisas existem, elas tem um proposito ou pode ser criado um. Não acredito que a exploração alheia seja o mais virtuoso desses propósitos. Extrair metais de imensas camadas de terra, para depois escondê-los de novo em imensas camadas de terra ou cofres superprotegidos...eu ainda não achei um sentido para isso. Os governos garantem que isso são as reservas do tesouro nacional mas penso que diante de um ataque, em que todos os sistemas de cofres subterrâneos sejam corrompidos, ou todos os envolvidos pela segurança de tais sistemas venham a morrer, qual a serventia de milhares de toneladas de ouro guardada sob 50 metros abaixo do chão sob cofres que suportam armamento nuclear? Nada! Demoraria outros milhares de anos para que os tirássemos de lá, talvez. Um pouco de agua, um pouco de ar, um pouco de alimento, calçados, vestes, uma cama para dormir, e um lar para morar e a companhia de nossos semelhantes é o que realmente precisamos para viver. Só isso e mais nada! Tudo é fútil, tudo é inútil, tudo perde o sentido, quando qualquer objeto ou sistema que criamos não seja para o bem coletivo.
Se existe algo que devemos aprimorar, é os relacionamentos humanos. Toda tecnologia existente deveria ser empregada nisso. O bom é saber que não é necessário tecnologia para esse tipo de aprimoramento. A tecnologia da alma é o bastante! A consciência que todos somos parte de um todo, que o que fazemos no individual afeta o coletivo e vice versa, é a tecnologia necessária para nos curarmos de todo mal social. Todo sistema religioso, jurídico e político iriam se curvar e “pedir a benção” aos seres humanos que entendessem isso. Vários grandes mestres por meio da filosofia e reflexões já falaram sobre isso. Infelizmente o melhor que se é produzido em forma de discurso por nossa espécie, logo vira objeto de culto ou religião, que vira opressão e escravidão. E o sistema religioso faz exatamente o que os sistemas econômicos costumam fazer: põe valor no que nada vale, e desvaloriza o que mais é importante. As religiões “descobrem” os deuses, e os encerram em cofres hermeticamente fechados, para que os que desejam ter acesso a estes, tenham de pagar por isso. Os sistemas econômicos descobrem o ouro, para depois esconde-los de novo, e temos de pagar por isso.
Nós somos as verdadeiras pedras preciosas! Somos nós quem precisamos ser lapidados! As relações entre os povos é o que deve ser guardado e protegido de forma sagrada! É com isso que deveríamos nos importar. Se existe um território que precisa ser garimpado e explorado, é o território de nossa consciência. Quem descobre sua riqueza interior, jamais será seduzido pelas riquezas apresentadas em comum acordo pelos sistemas que nos governam. Pensem nisso!
Texto escrito em 29/4/17
*Antônio F. Bispo é Bacharel em Teologia, Estudante de Religião em Filosofia e Capelão Ev. Sem vínculo com denominações religiosas desde 2013.