UMA ERA DE INCERTEZAS E ANGÚSTIAS
Na época em que vivemos, numa era governada pela técnica e pela ditadura do neoliberalismo, é muito comum as pessoas naufragarem no abismo das doenças psíquicas, doenças bem típicas de uma sociedade quase desintegrada pela falta de justiça e de ética (a ética que vem a ser entendida como o senso crítico e a atitude reflexiva que temos frente aos costumes de uma nação ou então a moralidade instituída por uma determinada cultura).
Nunca houve tanta depressão e sintomas de ansiedade como nos dias de hoje, onde as pessoas deixaram de viver o seu momento presente para viver amargamente na esperança da chegada do instante que ainda não existe; também na expectativa de que o presente passe depressa; e o porvir, tão incerto e imprevisível, possa trazer boas novas, bem melhores do que o instante vivido na pressa do dia a dia.
A correria abarca a vida da grande maioria da população e poucas são as pessoas que pararam para se perguntar para si mesmas, numa atitude de auto-reflexão, se valeu a pena tanto desperdício gasto numa pressa desesperada, sem terem consciência de que a correria nem sempre é salutar para a vida.
Os manuais de psicopatologia não deixam dúvidas do quanto são diversificadas as doenças psíquicas que afetam os seres humanos, doenças para todos os perfis e que combinam como roupas a depender da disposição e da história de cada um no que diz respeito à doença. Embora haja um eclipse dos valores tradicionais em nossos dias, o que mais há nessa sociedade são pessoas em busca de cura espiritual; de certa maneira, as igrejas viraram grandes centros de procura de ajuda para almas atormentadas; pessoas na plenitude do desespero em que mergulharam.
Uma excelente obra que retrata a situação vivida por muitos, imersos numa condição muitas vezes deplorável, é a de Samuel Beckett, dramaturgo inglês e autor de uma obra que inaugurou o teatro do absurdo: ''ESPERANDO GODOT''. Nessa excelente peça da dramaturgia, há a todo momento a expectativa de alguns personagens da chegada de uma pessoa ilustre, Godot. Mas é em vão: o personagem principal, e muito aguardado, não aparece, frustrando a ânsia dos demais personagens da obra pela sua ausência, que persistem o tempo todo, em que a peça é encenada, nessa espera desesperada...mas nada pode apascentar tamanha inquietação e frustração!
Rollo May, psicólogo humanista e de grande sensibilidade, na sua obra ''Éros e Repressão'', soube extrair dessa fábula uma profunda reflexão acerca da época em que viveu, um tempo marcado por diversas crises de valores, mas que ressoa tão bem para os nossos dias! Vivemos numa era cheio de esperas mal-sucedidas, esperas que frustram a todo momento nossas vidas, mas, mesmo assim, muitos persistem na estrada da vida à espera de uma redenção que nunca chega... e aqueles que por acaso cansaram de tamanha busca sucumbem a doenças psíquicas oportunistas que flagelam o seu ser, muitas vezes com poucas chances de convalescência.
Porém, a busca pelo amor e pelo discernimento que promana de Deus é a cada dia que passa uma alavanca para quem tem sede de verdade; há, de fato, uma demanda de pessoas em busca de um significado para suas vidas, uma demanda que tem se proliferado nos quatro cantos da terra, uma vez que ninguém mais sabe o que esperar para a supressão de uma necessidade imediata... Mas em meio a tanta desesperança e aflição, Deus acaba sendo uma única alternativa para o coração desesperado de muitos, o que é muito importante: pois sempre alivia a ansiedade e a expectativa de um porvir envolto em neblinas espessas...
A demanda por psicólogos e psiquiatras, bem como de outros profissionais da saúde não menos importantes, não para de crescer, e a cada dia que passa mais e mais a psicologia se diversifica, a fim de dar conta de abarcar todas as esferas sociais e organizações, hoje em dia tão complexas que não podemos cair na ingenuidade de achar que é uma tarefa fácil de ser resolvida se queremos pelo menos amenizar a desintegração de nossos valores. É incrível o quanto os manuais de psicopatologia como DSM, por exemplo, tem se desenvolvido para dar conta de abarcar e explicar uma diversidade de transtornos de personalidade e doenças de um modo geral, cada uma delas com sua peculiaridade... e que assusta até os mais preparados e os mais indiferentes pela gravidade de alguns casos psiquiátricos!
Somos, por tudo o que vivemos (pois somos marcados por uma fatalidade quase invencível; porém a transcendência não deixa de ser possível), os anti-heróis de uma era sempre em busca de boas novas, na espera de algo que nos fortaleça; somos, tal como um personagem de Beckett, os Godots da vida pós-moderna, personagens trágicos e ao mesmo tempo impregnados pelo absurdo (semelhantes aos personagens de uma obra de grande teor sombrio!). Muitos indivíduos, perdidos no impessoal, não sabem como definir o que esperam e procuram, e pelo simples motivo: não sabem o que buscam, o que não quer dizer que não buscam alguma coisa, apenas esperam ansiosos, sem ter consciência, por uma vinda que nunca acontece enquanto buscam por sinais impacientemente