“PENSO, LOGO EXISTO”: O SUJEITO SE DESCOBRE NO MUNDO PELO PENSAMENTO, MAS SE AFIRMA PELA LINGUAGEM

(Fragmento de um livro em construção)

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Por isso, penso que o “cogito” de Descartes pressupõe tanto um sujeito que conhece, quanto o objeto a ser conhecido que é ele próprio. Ora, como pensar em outra coisa que não no fato de que a assertiva (eu) “penso, logo existo” se constitui semântica e sintaticamente por um sujeito e pelo seu predicado? O “eu” dá possibilidade a um sujeito que se auto-descobre no mundo. Seu predicado “penso”, como qualificador, pressupõe um sujeito dotado de movimento e de uma faculdade que o permite tanto se auto-afirmar, quanto se auto-conhecer. Em contrapartida, se apresenta – superficialmente – como um enunciado vazio de contexto, e sugere uma série de questionamentos, como: por que o sujeito pensa? Meus outros semelhantes pensam? Sou apenas pensante?

Portanto, o sujeito se descobre no mundo pelo pensamento, mas se afirma pela linguagem. Além disso, ao afirmar o outro, o sujeito – de forma indireta – se auto-afirma. Ora, ora... peço a atenção do leitor. Eu disse: “o sujeito se descobre no mundo pelo pensamento”, mas antes tinha dito que o “eu penso” “se apresenta – superficialmente – como um enunciado vazio de contexto”. Assim, não podemos ficar apenas no campo da análise objetiva do enunciado, pois podemos cometer erros grotescos de interpretação. É a isto que me refiro quando digo que devemos ultrapassar o enunciado para alcançarmos uma compreensão relevante e segura – embora não totalizante. De onde surge, por exemplo, a categoria de “mundo” que vem à lume quando afirmo que o “eu penso” pressupõe um sujeito que se auto-afirma no mundo? O “mundo” é uma categoria oriunda de nossa interpretação, pois não podemos pensar na afirmação existencial do sujeito sem antes pensarmos em elementos linguísticos que permitam inseri-lo em um determinado contexto. Isso quer dizer que o “eu penso” não se refere a conceitos vazios, sem significação alguma para nosso entendimento, fato este que de alguma forma nos permite dizer que também não pode ser pensado como uma realidade absolutamente vazia de contexto.

Por um lado a razão criou o sujeito, por outro, a sensação criou o mundo. Não poderíamos afirma a existência do mundo sem afirmar a existência do sujeito, como também não podemos afirmar a existência do sujeito sem afirmar a existência do mundo. Senão onde estaria o sujeito? Em alguma realidade paralela que pode ser apenas pensada? Como seria esta realidade? O sujeito seria simplesmente uma partícula dotada de pensamento? Mas como ficaria sua matéria, digo, seu corpo? Em contrapartida, também, ao afirmar a existência do mundo pressupomos a existência de um ser que observa e qualifica o mundo como tal. O mundo se nos apresenta pelos nossos sentidos, portanto, uma realidade visível, assim como o sujeito. Portanto, parece indissociável a ideia de um sujeito existencial com um contexto no qual esteja inserido.

Assim penso que a análise do enunciado não deve presumir um conhecimento totalizante, mas parcial, visto que não podemos conhecer o íntimo de cada coisa, isto é, a coisa em si, tão somente seus fenômenos. No que se refere ao “penso logo existo”, devemos realizar a inserção de um contexto na incompletude, visto que não podemos pensar na afirmação existencial do sujeito sem pressupormos, igualmente, a existência de um contexto no qual ele próprio esteja inserido.

Leon Cardoso
Enviado por Leon Cardoso em 09/12/2016
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