A CORRIDA MALUCA- Quando a chegada vale mais que o percurso

Estrelada por nossa sociedade

Para quem tem entre 10 e 40 anos de idade, já viu com certeza na TV aquele desenho animado, chamado a “corrida maluca”, em que mostra as várias tentativas do personagem Dick Vigarista em atrapalhar a corrida dos outros. Ele sempre estar na frente, mas perde a corrida, toda vez que retarda seu trajeto para planejar o fracasso dos outros. Sempre acaba perdendo a corrida por que ao invés de cuidar do seu sucesso, cuida em garantir o fracasso dos outros. Assim age muita gente de modo consciente ou inconsciente. Ao invés de seguir o curso de suas vidas, passa o tempo todo obstruindo ou dificultando o caminho dos outros. Assim agem os grupos religiosos e políticos pois perdem tempo atrapalhando o percurso do outro, ao invés de expandir o próprio criando soluções para a sociedade e não demonizando tudo, ou “esquerdizando” tudo. Desse modo agimos todos nós sem percebermos. De olho na chegada esquecemos do percurso as suas maravilhas.

O sentimento de competitividade e escassez de recursos que desde criança nos embutem, faz com que muito cedo vejamos nossas relações pessoais como meras competições de um único vencedor onde a lei áurea dessa regra ensina que ou você elimina ou é eliminado, que não há espaço para duas pessoas ser, fazer ou ter ambas oportunidades ao mesmo tempo sem prejudicar o outro. Mera ilusão, pois só há competitividade, onde foi projetado um valor ao produto. Se não há projeção de valor, não há competitividade, apesar do produto em si agregar as mesmas propriedades. Quanto mais valor se dar a algo, mais esforço faremos para tê-lo, então maior será o seu sacrifício para possuí-lo e menos tempo você terá para si próprio ou para sua família. Assim deixamos de perceber que nem sempre o que nos ensinaram a buscar tem tanto valor enquanto as virtudes que nos tornam mais humanos, e estas são deixadas de lado. A propaganda moderna agrega valor à coisas irrisórias, para depois descarta-las no futuro. Passamos nossa vida inteira demarcando território como animais e lutando por coisas, que no fim das contas ficarão para outros, que talvez irão adquirir sem esforço nenhum, como em caos de heranças por exemplo.

Além do senso de competitividade, temos por outro lado pessoas que conservam a crença em um Deus ou diabo que serve apenas para atribuir seus fracassos ou sucessos e essa linha de pensar faz com que muita gente quando estão fazendo o mal a outro, já tenha em mente um álibi perfeito, pois dirão que o mal que praticaram foi por que teve suas faculdades mentais possuídas pelo poder das trevas e quando alcançam algum “sucesso” derrubando os outros, dirão que só estão ali por que Deus quis, e quando Deus quer ninguém impede. Esse tipo de comportamento faz com que muitos tenham desculpas para todas as suas ações na vida e se tornem cada vez mais medíocres e irresponsáveis por seus atos.

Políticos usam a difamação, calunia e perseguição alheia para conseguir sucesso próprio. Líderes religiosos demonizam a religião de outros para endeusar a sua própria. Laboratórios farmacêuticos defendem a autoria de sua patente para que somente estes produzam aquele tipo de remédio por certo tempo pelo preço que este quiser, nas condições que lhes for mais interessante. Descobertas cientificas que mudariam para sempre a face de nosso planeta e as relações humanas são silenciadas para que muita coisa não mude, para que a dependência do sistema continue e a equipe do poder fique no sistema de criar problema, observar reação para depois gerar solução, sendo heróis por resolver um problema que eles mesmo criaram. Nesses moldes a resolução geralmente consiste no início de uma dependência crônica de um outro sistema criado.

Esse padrão se repete desde uma simples relação cotidiana até as mais obscuras das tramas que são feitas às escondidas por sociedades secretas. Tirar vantagem ou manipular o outro é sinônimo de inteligência para muitos, seja numa relação amorosa traindo o parceiro, seja numa relação comercial roubando alguns gramas no produto pesado ou vendendo um produto com defeito como se fosse perfeito, seja nas relações de trabalho negando o que se deve e exigindo o que se não deve. Isso que nos ensinam diariamente. Isso que repetimos o tempo todo. Tornamos as relações conflituosas e tumultuosas, depois pedimos ajuda aos deuses e oramos ardentemente para que um messias todo poderoso venha botar ordem na casa e punir os “injustos”, esquecendo que também fazemos parte dessa injustiça por conveniência e que somos nós mesmos os causadores de muita injustiça. Acontece que acreditamos ser errado apenas aquilo que uma constituição federão diz ser mesmo sabendo que estamos causando danos a alguém. Acontece que mesmo sabendo que algo pode trazer prejuízos enormes no futuro, mesmo assim muitos arriscam tentar e dizer seja o que Deus quiser. Acontece que muitos ainda funcionam na base do “ter de filmar, fotografar e provar” para que os tais assumam que erraram contra outros, pois se ninguém viu, ninguém fotografou ou filmou então, não se tem provas. Se não tem provas não há crimes. Se não há crimes o que causou o mal se julga inocente. Acontece que muitos ainda funcionam na base de “faça escondidinho, apronte e morra negando se te perguntarem algum dia se fez”. Quanta hipocrisia...Estas são as mesmas pessoas que oram o pai nosso todos os dias e pede graça a Deus. Essas são as mesmas pessoas que lotam todo tipo de igreja para “adorar ao senhor” sem nenhum peso na consciência. Essas são as pessoas que vivem a contar suas misérias como se fossem vítimas mesmo sendo causadoras da ação. Assim vivemos um círculo vicioso de errar crendo na proteção ou misericórdia divina.

Nesse ritmo, um comerciante abre uma quitanda, uma bar, um salão de beleza, ou um comercio qualquer e alguns comportamento começam a modificar sua personalidade. Ele procura a todo custo fidelizar seus clientes como se este fosse a única fonte de renda em todo o globo e quando o cliente usa o serviço ou produtos da concorrência, tal comerciante pode ficar com “raivinha” tratando mal o cliente em outra ocasião ou reduzindo o próprio lucro para cativar o cliente, tornando difícil a manutenção do próprio comercio e no futuro até ir a falência. Grandes empresas por sua vez, produzem aparelhos, que geralmente só recebem concertos de qualidade na assistência autorizada, levando meses para resolver um serviço simples, tornando a vida do consumidor tediosa mediante a esse fato quando a assistência podia ser estendida a outros de uma forma bem mais simples.

Por outro lado consumidores se tornam cada vez mais exigentes e intolerantes de todos os lados. Quando percebem que há briga entre os comerciantes pela venda de seus produtos os tais se sentem como deuses a receber bajulação. Quando encontram alguma falha técnica num processo industrial querem indenizações milionárias. Como toda regra tem exceções, claro que há abuso dos dois lados. Um sentimento de tirar vantagem sobre o outro se apodera cada vez mais de nossa sociedade. Processos dos mais estupido tipos possíveis enchem as mesas dos magistrados. Alguns querendo indenizações milionárias sobre um crime que eles mesmo armaram para se fazer de vítima depois. Alguns são de pessoas que querem criar direitos onde não se tem só por que “ouvir dizer que” ... Outros querendo se esquivar de deveres que deveriam ser cumpridos sem precisar de intervenção judicial. A boca que te diz eu te amo no dia do casamento é a mesma que diz “dane-se, quero tudo que é seu” ou “morra” no dia do divórcio. A pessoa que diz hoje que o importante é apenas a sua companhia, amanhã dirá que quer tudo seu, e que vai fazer de tudo pra te deixar na miséria absoluta e ainda vai rir de sua cara.

Políticos eleitos usam o dinheiro do povo em atos de corrupção para comprar o voto do próprio povo e acha que estar saindo no lucro. O que vende o voto, mesmo sabendo que ele próprio foi a fonte pagadora, sente-se um “iluminado” naquele instante, pois acha que estar manipulando o político e levando vantagem sobre aquele que vai votar de graça e que espera apenas uma boa administração para todos em troca do voto.

Líderes religiosos fazem campanhas e mais campanhas diferentes em igrejas para atrair mais público pagante. Se o público fosse apenas de pessoas simples, de pouca condição financeira “deus” não se manifestaria tanto por meio dessas unções. Depois eles se acham donos da vida de cada pessoa que entra naquele recinto e “aceitam” a jesus, e a partir daí querem ter controle total sobre as vidas dos tais, e usa todo tipo de ameaça quando alguém anuncia que vai deixar o grupo. Por outro lado, os crentes, pagam seus dizemos e ofertas além de participar de todas as companhas criadas pela liderança, pela sutil esperança que terá vantagens financeiras e espiritual sobre aqueles que não tem dinheiro pra apostar no “cassino do senhor”. Hoje você não precisa ir até LAS VEGAS para sonhar com dinheiro fácil obtido por meio de apostas, pois em cada esquina tem um líder religioso que te ensina a fazer apostas nas campanhas financeiras de sua igreja e como sempre, o dono da casa é o maior beneficiado nessas “casas de jogos”.

Líderes militantes “patriotas” críticos da burguesia, que lutam por igualdade entre todos os cidadãos, não vê problema nenhum em ganhar 200 vezes mais que as pessoas que o elegeram acreditando nesse “patriotismo”, mas são críticos ferrenhos da iniciativa privada e faz duras perseguições, quando empresários após várias tentativas de acertos e fracassos apostaram toda sua fortuna para produzir um produto que vai atender uma grande quantidade de pessoas e por isso terá uma grande quantidade de lucro. Lucro obtido pela prestação de serviço é ser burguês na concepção desses “patriotas”. Lucro obtido manipulando “militontos” é sinal de patriotismo. Gente assim chama de burguês qualquer pessoa que cresceu por conta própria, para esconder que o mesmo é um fidalgo disfarçado de pobre, que vive as custas do voto do povo, falando contra algo que na prática o mesmo prova ser o objeto da crítica.

Poderia ser diferente se desligássemos um pouco nosso piloto automático. Difícil é fazer isso. Quanto mais agitada for a vida de uma pessoa, menos tempo ela terá para pensar na vida pois passa tempo demais opinando sobre a vida dos outros ou correndo como burros atrás de cenouras amarradas em sua própria cabeça.

Então nos perguntamos: para onde vamos com tanta pressa? Por que corremos tanto? A linha de chegada é mais importante do que o trajeto a ser percorrido? E se o prêmio não for o que nos prometeram? E se não conseguirmos chegar até o final? Será que o que nos espera na linha de chegada justifica certos comportamentos que temos em relação ao nosso semelhante? O prêmio a ser conquistado é tão importante assim a ponto de custar a vida, a carreira e a moral de outros para construirmos a nossa, que por sinal será tão sólida como um castelo de areia? Geralmente o prêmio tão sonhado não passa de um conjunto de valores apreciados em nossa cultura ou época e desprezados em outras ou entre outros povos. Só no final da carreira é que muitos percebem que correram em vão, que viveram a vida perseguindo apenas conceitos. Tudo não passa de conceitos. Tanto o material quanto o imaterial. O que pra uns valem fortunas, pra outros não passa de lixo podre.

Em busca de fama e glória própria passamos metade de nossas vidas correndo como tontos, para cima e para baixo, para acumular teres, conquistar títulos e se encaixar no perfil do grupo em que estamos inseridos. Em busca de evitar críticas ou a agradar a opinião alheia passamos uma outra parte de nossa existência fazendo ou sendo o que não gostamos, para sermos aceito no grupo. Como papagaios de pirata, passamos toda nossa vida, apenas repetindo frases e padrões comportamentais o tempo todo, sem nem pararmos para calcular a escala de valores inseridas em nós desde a infância e perceber que não vivemos nossas vidas, e sim vivemos uma vida que foi desenhada para vivermos, qual fomos inseridos e tivemos que simplesmente nos adaptar. Os sistemas políticos e religiosos são os nossos principais senhores, regentes do comportamento de quase toda sociedade organizada.

Nessa corrida maluca que vivemos tem hora que precisamos parar e refazer o trajeto. Outras vezes precisamos reduzir e apreciar a paisagem. Em algum momento devemos contornar e pegar o sentido oposto. Se pudermos ajudar outros que estejam com algum problemas na estrada tudo bem, se não pudermos não atrapalhar ninguém já é uma boa ajuda.

A solução para os problemas da humanidade não estar em descobrir meios para aperfeiçoas as nossas relações com os deuses, seja de que crença for. A solução para nossos problemas consiste em aprendermos nos relacionar uns com os outros, livres da ideia de tirar sempre vantagens, livre da falsa ideia que possuímos algo. O máximo que possuímos é o ar que circula em nossos pulmões no presente momento. A vida é o momento. E no momento isso é o máximo que possuímos. Todas as outras coisas estão fora de nós apesar de criarmos o conceito que são nossas. As outras coisas são partes das relações e não a razão da vida. Vale lembrar que praticamente todo grupo religioso se considera escolhido por algum ser especial e que esse ser vai levar esse grupo, e destruir todos os demais que não fazem parte daquele grupo. Se levarmos em consideração o conceito do Deus judaico-cristão interpretado nos dias de hoje segundo a própria bíblia, perceberemos que entre conversar e mandar uma praga pra destruir todo mundo, ele prefere a segunda opção. Então pouca opção nos resta senão aprendermos a convivermos uns com os outros já que todo grupo se auto denomina escolhido. Enquanto gastamos fortunas para dar honra, louvor, gloria e adoração ao que se diz ser onipotente e que de nada precisa, bem debaixo do nosso nariz, os que realmente são necessitados nós os ignoramos.

Enquanto o combustível do nosso “veiculo” estiver queimando, estamos nessa corrida maluca. Quando a centelha que gera a combustão acabar é que muitos irão perceber que agiram como um Dick Vigarista o tempo todo e que nem viveram suas vidas e ainda atrapalharam a de muitos.

Um brinde a sanidade e a reflexão.

Escrito em 26/11/2016

*Antônio Ferreira é Bacharel em Teologia, estudante de Religião, Filosofia e Capelão Evangélico (não filiado a nenhuma igreja desde 2013).

Ferreira Bispo
Enviado por Ferreira Bispo em 26/11/2016
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