A visão do Apocalipse
O livro do Apocalipse é uma obra visionária que poderia ser incluída entre os escritos gnósticos fartamente produzidos nos primeiros dois séculos de existência do Cristianismo. Essa obra foi escrita como registro de uma revelação obtida através de uma visão que o profeta João, supostamente o mesmo autor do Evangelho de São João, teve quando estava confinado na ilha de Patmos.
Por essa informação se infere que se tratava de um prisioneiro, provavelmente condenado em razão de suas crenças religiosas. É um livro escrito em forma de mensagem cifrada, dirigida ás sete igrejas do continente, a saber, Éfeso, Esmirma, Pérgamo, Tiatira, Sardis, Filadélfia e Laodicéia, cidades da Palestina, Itália e Ásia Menor, onde os líderes cristãos, principalmente Paulo de Tarso, Tiago e outros missionários cristãos haviam fundado igrejas que se encontravam em franco desenvolvimento. [1]
Essas cidades exerciam papel importante no mundo romano, já que nelas foram instaladas sedes administrativas ou capitais de províncias do Império Romano.
O Apocalipse é uma obra, que da mesma forma que defende a primazia do Cristianismo e do Cristo sobre as demais religiões e deuses do Império Romano, também evoca um sentimento de vingança contra Roma pela demolição do Templo de Jerusalém, a destruição do estado judeu e a dispersão do seu povo pelos territórios do Império. [2]
A esperança descrita nesse trabalho revela, ao mesmo tempo, uma face esotérica, representada pela vitória do Cristianismo e o triunfo do Messias, e uma face política, marcada pela ressurreição do reino de Israel a partir de suas bases cristãs.
Nesse sentido, o que o autor faz é recompor, de uma forma dramática, simbólica e com um profundo sentimento místico, “o reino da justiça, da ordem, e da harmonia”, que os ímpios romanos destruíram, com a extinção da pátria judaica e a execução do Messias cristão. Esse reino, representado pela Nova Jerusalém é, a um só tempo, material e espiritual. Não foi, portanto, sem razão, que esse livro exerceu tamanho fascínio nos estudantes da filosofia oculta nos anos que antecederam o desenvolvimento da Maçonaria moderna, o que justifica o largo uso que dele se faz na composição do catecismo maçônico dos graus filosóficos.
Um livro cabalístico
O Apocalipse é uma obra escrita e inspirada pela doutrina da Cabala e seu autor se revela um profundo conhecedor dos métodos cabalísticos de escrita. Ele faz larga utilização de símbolos e alegorias e nela se percebe, claramente, a utilização dos métodos cabalísticos de escrita conhecidos com temura, notaricon e guematria. Essas formas de escrever foram usadas na composição das estranhas descrições que ele faz do processo de julgamento do velho mundo e da composição do novo, que seria reorganizado e gerido por Jesus Cristo.
A importância da visão apocalíptica do mundo está no fato de que ela resume o destino escatológico do universo. Por isso vários profetas no Velho e no Novo Testamento se ocuparam dessas visões. É um arquétipo que está presente na história de Israel e se confunde mesmo com a sua própria saga enquanto nação. Israel é a “maquete” da nação que Deus construiu como modelo para a humanidade. Dessa forma o que vale para o seu destino vale para o destino da humanidade toda. Por isso esse tema aparece em vários escritos proféticos, como os de Ezequiel, Daniel, Amós, Zacarias. Malaquias, além do cristão João. E em vários apócrifos, como o Livro de Enoque, o Apocalipse de Abraão, o Testamento de Isaque , principalmente nos escritos da seita dos essênios, que ao que parece, foram os principais inspirdores do evangelista João. etc. Todos esses escritos são clássicos apropriados pela doutrina da Cabala.
A Maçonaria e o tema do Apocalipse
Essa temática foi apropriada pela Maçonaria no desenvolvimento de um de seus temas rituais. Mais propriamente, na decoração da Loja do grau 19 do Rito Escocês, encontraremos uma tela de formato quadrado, representando uma cidade. Essa cidade simboliza a Jerusalém Celeste com suas três portas de cada lado, tendo no centro a Árvore da Vida, produzindo doze frutos diferentes. A Jerusalém Celeste parece baixar do céu, conforme mostrada no painel do grau. Nesse sentido, esse painel reflete a visão do profeta João. Ela é chamada de Templo da Verdade ou Templo da Razão. Significa que a sabedoria divulgada neste grau é o apostolado da razão. Por isso, a pergunta básica que ali é feita: “ Que seria dele (o homem), apesar da consciência e da inteligência, sem a Razão? Viveria perpetuamente no erro e só a casualidade lhe proporcionaria algum progresso.” [3]
A Jerusalém Celestial da visão profética tinha “um muro alto e grande com doze portas; e nas portas doze anjos, e uns nomes inscritos, que são os nomes das doze tribos de Israel”. Clara alusão a temas cabalísticos, ligados á mística do povo judeu. Pois o número doze é sagrado para o povo de Israel. Ele representa a estrutura do universo perfeito, que se revela nos doze signos do zodíaco e reflete no modelo perfeito da humanidade sobre a terra, que seria a nação de Israel, com seu modelo de estado dividido em doze tribos.
No painel desse grau pode ser visto uma escada elevatória que representa a luta pelo auto-aperfeiçoamento espiritual, que deve ser buscado pelo maçom. Essa escada é uma alusão à Escada de Jacó, que sobe do piso da Loja e serpenteia elipticamente pelos doze signos zodiacais. E para reforçar ainda mais as influências cabalísticas que permeiam as instruções desse grau, ali encontraremos também a Árvore da Vida.
Por fim cabe dizer que no ritual do grau 19, a Jerusalém Celeste é o símbolo correspondente ao Éden bíblico e ao Reino de Deus pregado por Jesus. Nesse reino mítico, só entrarão os “eleitos”, ou seja, não os espíritos que foram julgados puros no Juízo Final, mas sim, aqueles que serão os representantes, perante Deus, da nova humanidade. O Apocalipse diz que serão 144.000 mil “eleitos”, fórmula resultante da multiplicação da base 12, a qual, como se vê, é a fórmula estrutural da nação de Israel
Lembrando que a Árvore da Vida tem trinta e dois caminhos pelos quais a energia criadora se distribui entre as sefirot, a Jerusalém Celeste também têm trinta e duas “portas” e “caminhos, as quais são conotativas das etapas que um maçom deve percorrer para fazer parte desse grupo de “eleitos”.
Analogamente, a cadeia iniciática da Maçonaria do Rito Escocês (REAA) se distribui por trinta e três graus, sendo trinta e dois de aperfeiçoamento e um (o grau 33) de apoteose. Assim, o grau 33 implica na realização plena da escalada iniciática da Maçonaria e significa a integração final do espírito do Irmão no Centro Irradiante de Luz, que na Maçonaria é representada pela letra G e na Cabala pela sefirá Kether.
Fecha-se, dessa maneira, o simbolismo do tema do Apocalipse, no que concerne ao ensinamento maçônico. Por fim é importante lembrar que para os maçons, assim como os cabalistas, o Apocalipse não representa um cataclismo final, no qual a atual humanidade desaparecerá num mar de sangue e fogo, para dar lugar á uma nova humanidade toda espiritual, como ensina a teologia cristã. Para a Maçonaria e para a Cabala, o Apocalipse é um evento finalístico ( ele tem uma finalidade) e não uma consumação final. Nesse sentido, ele representa um evento evolucionista, no qual a humanidade realizará o seu Tikun, no dizer da Cabala, ou a chamada Ordo ab Chaos, na linguagem da Maçonaria.[4] Portanto, o Apocalipse faz parte de um processo de aperfeiçoamento da cepa espiritual da humanidade e, desse ponto de vista, ele será muito bemvindo.
A Jerusalém Celeste- Painel do grau 19
O livro do Apocalipse é uma obra visionária que poderia ser incluída entre os escritos gnósticos fartamente produzidos nos primeiros dois séculos de existência do Cristianismo. Essa obra foi escrita como registro de uma revelação obtida através de uma visão que o profeta João, supostamente o mesmo autor do Evangelho de São João, teve quando estava confinado na ilha de Patmos.
Por essa informação se infere que se tratava de um prisioneiro, provavelmente condenado em razão de suas crenças religiosas. É um livro escrito em forma de mensagem cifrada, dirigida ás sete igrejas do continente, a saber, Éfeso, Esmirma, Pérgamo, Tiatira, Sardis, Filadélfia e Laodicéia, cidades da Palestina, Itália e Ásia Menor, onde os líderes cristãos, principalmente Paulo de Tarso, Tiago e outros missionários cristãos haviam fundado igrejas que se encontravam em franco desenvolvimento. [1]
Essas cidades exerciam papel importante no mundo romano, já que nelas foram instaladas sedes administrativas ou capitais de províncias do Império Romano.
O Apocalipse é uma obra, que da mesma forma que defende a primazia do Cristianismo e do Cristo sobre as demais religiões e deuses do Império Romano, também evoca um sentimento de vingança contra Roma pela demolição do Templo de Jerusalém, a destruição do estado judeu e a dispersão do seu povo pelos territórios do Império. [2]
A esperança descrita nesse trabalho revela, ao mesmo tempo, uma face esotérica, representada pela vitória do Cristianismo e o triunfo do Messias, e uma face política, marcada pela ressurreição do reino de Israel a partir de suas bases cristãs.
Nesse sentido, o que o autor faz é recompor, de uma forma dramática, simbólica e com um profundo sentimento místico, “o reino da justiça, da ordem, e da harmonia”, que os ímpios romanos destruíram, com a extinção da pátria judaica e a execução do Messias cristão. Esse reino, representado pela Nova Jerusalém é, a um só tempo, material e espiritual. Não foi, portanto, sem razão, que esse livro exerceu tamanho fascínio nos estudantes da filosofia oculta nos anos que antecederam o desenvolvimento da Maçonaria moderna, o que justifica o largo uso que dele se faz na composição do catecismo maçônico dos graus filosóficos.
Um livro cabalístico
O Apocalipse é uma obra escrita e inspirada pela doutrina da Cabala e seu autor se revela um profundo conhecedor dos métodos cabalísticos de escrita. Ele faz larga utilização de símbolos e alegorias e nela se percebe, claramente, a utilização dos métodos cabalísticos de escrita conhecidos com temura, notaricon e guematria. Essas formas de escrever foram usadas na composição das estranhas descrições que ele faz do processo de julgamento do velho mundo e da composição do novo, que seria reorganizado e gerido por Jesus Cristo.
A importância da visão apocalíptica do mundo está no fato de que ela resume o destino escatológico do universo. Por isso vários profetas no Velho e no Novo Testamento se ocuparam dessas visões. É um arquétipo que está presente na história de Israel e se confunde mesmo com a sua própria saga enquanto nação. Israel é a “maquete” da nação que Deus construiu como modelo para a humanidade. Dessa forma o que vale para o seu destino vale para o destino da humanidade toda. Por isso esse tema aparece em vários escritos proféticos, como os de Ezequiel, Daniel, Amós, Zacarias. Malaquias, além do cristão João. E em vários apócrifos, como o Livro de Enoque, o Apocalipse de Abraão, o Testamento de Isaque , principalmente nos escritos da seita dos essênios, que ao que parece, foram os principais inspirdores do evangelista João. etc. Todos esses escritos são clássicos apropriados pela doutrina da Cabala.
A Maçonaria e o tema do Apocalipse
Essa temática foi apropriada pela Maçonaria no desenvolvimento de um de seus temas rituais. Mais propriamente, na decoração da Loja do grau 19 do Rito Escocês, encontraremos uma tela de formato quadrado, representando uma cidade. Essa cidade simboliza a Jerusalém Celeste com suas três portas de cada lado, tendo no centro a Árvore da Vida, produzindo doze frutos diferentes. A Jerusalém Celeste parece baixar do céu, conforme mostrada no painel do grau. Nesse sentido, esse painel reflete a visão do profeta João. Ela é chamada de Templo da Verdade ou Templo da Razão. Significa que a sabedoria divulgada neste grau é o apostolado da razão. Por isso, a pergunta básica que ali é feita: “ Que seria dele (o homem), apesar da consciência e da inteligência, sem a Razão? Viveria perpetuamente no erro e só a casualidade lhe proporcionaria algum progresso.” [3]
A Jerusalém Celestial da visão profética tinha “um muro alto e grande com doze portas; e nas portas doze anjos, e uns nomes inscritos, que são os nomes das doze tribos de Israel”. Clara alusão a temas cabalísticos, ligados á mística do povo judeu. Pois o número doze é sagrado para o povo de Israel. Ele representa a estrutura do universo perfeito, que se revela nos doze signos do zodíaco e reflete no modelo perfeito da humanidade sobre a terra, que seria a nação de Israel, com seu modelo de estado dividido em doze tribos.
No painel desse grau pode ser visto uma escada elevatória que representa a luta pelo auto-aperfeiçoamento espiritual, que deve ser buscado pelo maçom. Essa escada é uma alusão à Escada de Jacó, que sobe do piso da Loja e serpenteia elipticamente pelos doze signos zodiacais. E para reforçar ainda mais as influências cabalísticas que permeiam as instruções desse grau, ali encontraremos também a Árvore da Vida.
Por fim cabe dizer que no ritual do grau 19, a Jerusalém Celeste é o símbolo correspondente ao Éden bíblico e ao Reino de Deus pregado por Jesus. Nesse reino mítico, só entrarão os “eleitos”, ou seja, não os espíritos que foram julgados puros no Juízo Final, mas sim, aqueles que serão os representantes, perante Deus, da nova humanidade. O Apocalipse diz que serão 144.000 mil “eleitos”, fórmula resultante da multiplicação da base 12, a qual, como se vê, é a fórmula estrutural da nação de Israel
Lembrando que a Árvore da Vida tem trinta e dois caminhos pelos quais a energia criadora se distribui entre as sefirot, a Jerusalém Celeste também têm trinta e duas “portas” e “caminhos, as quais são conotativas das etapas que um maçom deve percorrer para fazer parte desse grupo de “eleitos”.
Analogamente, a cadeia iniciática da Maçonaria do Rito Escocês (REAA) se distribui por trinta e três graus, sendo trinta e dois de aperfeiçoamento e um (o grau 33) de apoteose. Assim, o grau 33 implica na realização plena da escalada iniciática da Maçonaria e significa a integração final do espírito do Irmão no Centro Irradiante de Luz, que na Maçonaria é representada pela letra G e na Cabala pela sefirá Kether.
Fecha-se, dessa maneira, o simbolismo do tema do Apocalipse, no que concerne ao ensinamento maçônico. Por fim é importante lembrar que para os maçons, assim como os cabalistas, o Apocalipse não representa um cataclismo final, no qual a atual humanidade desaparecerá num mar de sangue e fogo, para dar lugar á uma nova humanidade toda espiritual, como ensina a teologia cristã. Para a Maçonaria e para a Cabala, o Apocalipse é um evento finalístico ( ele tem uma finalidade) e não uma consumação final. Nesse sentido, ele representa um evento evolucionista, no qual a humanidade realizará o seu Tikun, no dizer da Cabala, ou a chamada Ordo ab Chaos, na linguagem da Maçonaria.[4] Portanto, o Apocalipse faz parte de um processo de aperfeiçoamento da cepa espiritual da humanidade e, desse ponto de vista, ele será muito bemvindo.
A Jerusalém Celeste- Painel do grau 19
[1] As “sete igrejas” refletem o simbolismo das sete esferas concêntricas do espaço cósmico cabalista. Pois na concepção cristã, o mundo cristão, com o sol no centro, representado pela Nova Jerusalém, seria o novo mundo que surgiria após o Apocalipse.
[2] Essa dispersão aconteceu no ano 70 da era cristã, com a invasão de Jerusalém pelas tropas romanas e ficou conhecida como Díáspora.
[3] Cf. o Ritual do Grau 19.
[4] Tikun, na doutrina da Cabala significa reordenação cósmica. Os cabalistas (especialmente a chamada corrente luriana (Isaac Lúria) ensinam que o pecado de Adão provocou uma desordem cósmica no processo da Criação. Nesse sentido, Deus escolheu o povo de Israel para realizar a missão re reconstituir essa ordem violada. A missão de reconstituição da ordem cósmica será realizada por Israel, comandada pelo Messias. Dela participará toda a humanidade. Nesse mesmo sentido os maçons dizem que o objetivo da Maçonaria, com as suas divisas iluministas Liberdade, Igualdade e Fraternidade é colocar Ordem no Caos (Ordo ab Chaos) da sociedade humana, realizando a utopia política e social que o homem tem sonhado desde os primeiros tempos da sua civilização.