LINHAGEM... (partes)
(... em construção)
PERSONAGENS :
A - Com Laços Sanguíneos Antigos
B - Com Laços Sanguíneos Atuais
C - Com Laços Sanguíneos Antigos/Atuais
D - Sem Laços Sanguíneos Antigos/Atuais*
PERSONAGENS A:
PEDRO = (Francisco: Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas)
Antes: Esposo de Elesbona, Pai de Águeda e Avô de Ana Lia.
Agora: No tempo Atual, Pedro é o esposo de Elesbona, pai de Águeda e Avô de Ana Lia, que foi sua neta antes e voltou a ser, porquanto Pedro é, novamente, o pai de Águeda.
PS:
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ELESBONA = (Francisca: Sagrado Machado-de-dois-gumes).
Antes: Mãe de Águeda, Avó de Ana Lia.
Agora: Mãe de Águeda e Avó de Ana Lia...
PS: No tempo Atual, Elesbona nasceu de Ana Lia, que foi sua neta antes e voltou a ser, porquanto Elesbona é, novamente, a Mãe de Águeda. Tudo que Ana Lia sofreu sob o jugo de Elesbona, quando sua avó, ela repetiu contra sua filha... criou um Carma(?). O trauma de Águeda quando filha de Elesbona, continuará, ainda, na presente encarnação? O sofrimento de Elesbona, enquanto filha de Ana Lia... foi sanado? O trauma de Ana Lia quando filha de Águeda, foi sanado?
1 - http://www.nemorensis.com.br/labrys.htm
2 - https://pt.wikipedia.org/wiki/Viva_pela_espada,_morra_pela_espada
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ACAUÃ = (Franklim: Acauã Caçador-de-serpentes)
Antes:
Agora:
PS:
1 - http://www.avesderapinabrasil.com/herpetotheres_cachinnans.htm
2 - http://www.wikiaves.com.br/acaua
3 - http://www.grupopas.com.br/cadastroColuna/mostraArtigoColuna.do?id=164 (sobre reencarnação)
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ACARÍ = (Elisangella: Acarí Limpador-das-profundezas)
Antes: O pai de Elesbona. O Pajé da tribo que amaldiçoou a filha, por afrontar suas decisões. Agora: Filha de Elesbona.
PS: A maldição e expulsão de Elesbona é repetida em seu pai, agora sua filha. Ou pagamos nossa divida, ou teremos renascido em vão.
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SUINDARA = (Frank: Suindara Rasgando-a-mortalha-da-noite)
Antes:
Agora:
PS:
http://www.avesderapinabrasil.com/tyto_alba.htm
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SARAPÓ = (Patrícia: Sarapó Nadando-sob-águas-rasas)
Antes: O noivo que Elesbona recusou.
Agora: Filha de Elesbona(Sagrado Machado-de-dois-gumes), irmã de Águeda e Acarí
PS:
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ÁGUEDA = (Grace: Mangangá Mãos-do-sono-sobre-os-olhos).
Antes: Filha de Elesbona e Mãe de Ana Lia.
Agora: Filha de Elesbona e Mãe de Ana Lia, e é, ao mesmo tempo trineta de uma e bisneta da outra...
PS: No tempo Atual, Águeda nasceu de Elesbona e é a Mãe de Ana Lia, e é, ao mesmo tempo sua trineta.
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_______ = (Gabriel: ) Antes: (?)
Antes: Mãe de Pedro (Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas)
Agora: Filho de Acarí Limpador-das-profundezas, que em outra vida foi o Pajé, pai de Elesbona, que a amaldiçoou e expulsou da tribo.
PS:
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_______ = (Letícia: ) Antes: (?)
Antes: Jandira, filha do primeiro casamento de Águeda com Amâncio.
Agora: Filha de Acarí Limpador-das-profundezas, que em outra vida foi o Pajé, pai de Elesbona, que a amaldiçoou e expulsou da tribo.
PS:
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_______ = (Amanda: ) Antes: (?)
Antes: Catarina, filha do primeiro casamento de Águeda com Amâncio.
Agora: Filha de Acarí Limpador-das-profundezas, que em outra vida foi o Pajé, pai de Elesbona, que a amaldiçoou e expulsou da tribo.
PS:
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_______ = (Lara: ) Antes: (?)
Antes: Manoela, filha do primeiro casamento de Águeda com Amâncio.
Agora: Filha de Acarí Limpador-das-profundezas, que em outra vida foi o Pajé, pai de Elesbona, que a amaldiçoou e expulsou da tribo.
PS:
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ANA LIA = (Hannah: Pequena Flor-mimosa-da-campina).
Antes: Filha de Águeda e Neta de Elesbona.
Agora: Filha Águeda e Neta de Elesbona...
PS: No tempo Atual, Ana Lia nasceu de Águeda, é neta de Elesbona que é ao mesmo tempo (antes) sua tetravó.
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CONCRIZ = (Miguel: Concriz Canto-por-amor-a-vida )
Antes: Pedro/Caracará Sobrevoa-a-mata-em-chamas (?)
Agora:
PS:
1 - https://pt.wikipedia.org/wiki/Corrupi%C3%A3o
2 - http://passarossilvestres.com/corrupiao/
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PERSONAGENS B:
MARACAJÁ (mbaraka'ya/Tupi) = (Josevan: Maracajá Som-de-emboscada)
Antes:
Agora:
PS:
1 - http://www.portalamazonia.com.br/amazoniadeaz/interna.php?id=228
2 - https://pt.wikipedia.org/wiki/Gato-maracaj%C3%A1
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GUAXITE = (Jonas: Gauxite Caçador-do-por-do-sol)
Antes: O primeiro marido de Águeda e pai de Ana Lia.
Agora: Pai biológico de Ana Lia.
PS: Por quê ele a renegou? Para poupá-la de sofrer quando ele acabar de pagar sua divida?
GUAXITE = Animal temido do nordeste brasileiro
1- http://bloginteressante135.blogspot.com.br/2013/08/gaxite-guaxite-animal-temido-do.html
2 - https://pt.wikipedia.org/wiki/Cerdocyon_thous
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TIÊ = (Leonardo: Tiê Grande-plantador-de-sementes)
Antes:
Agora:
PS:
http://www.wikiaves.com.br/cardeal-do-nordeste
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JUNDIÁ = (Claudio: Jundiá Onça-dos-rios-profundos)
Antes: O primeiro marido de Águeda. Pai dos primeiros filhos que ela teve.
Agora: Companheiro de Águeda e genro de Elesbona, outra vez.
PS:
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LINHAGEM, A HISTÓRIA...
Quem viaja pelo interior de Estado de Saagola, em direção ao município de Carapacai, nas imediações do Sitio Mianqualap, nunca percebe que, em determinado trecho do trajeto, algo muda, quando se olha na direção do Leste.
Ali, as Imagens do Espelho se tornam mais claras, e se alguém muito sensível observar, há de ver, como através de um cristal translúcido, um outro lugar, com característas geográficas idênticas, mas com uma suavidade encantadora.
Diante dos olhos do observador, se descortinará a visão da Aldeia Jacundá, bela e tranquila, banhada de Leste a Oeste pelo Rio Abapiar. Aquele lugar assemelha-se a uma pequena extensão do Paraíso Bíblico, antes da queda dos primeiros humanos.
Uma peculiaridade, entretanto, remete ao relato sobre as mulheres da Amazônia... a Aldeia Jacundá é habitada apenas por mulheres, seis, ao todo!
Sua Alfa é uma senhorinha de cabelos totalmente brancos como uma nuvem de algodão. Seu nome? Sagrado Machado-de-dois-gumes. Ela é a viúva do guerreiro Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas. A história desses dois personagens é Muito Antiga.
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A história dos fundadores da Aldeia teve início quando o casal de namorados - Sagrado Machado-de-dois-gumes e Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas - foi expulso da tribo paterna. Os dois jovens enfrentaram a hierarquia da tribo quando ela se recusou casar com um jovem guerreiro que seu pai escolhera, preferindo ficar com Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas, o filho da viúva do antigo cacique.
Expulsos, os dois namorados vagaram sem rumo. A fome e a sede estavam presentes o tempo todo. Além destas companhias indesejáveis, Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas, por infelicidade, foi picado por uma serpente venenosíssima e quando já não mais acreditavam num milagre, eis que vislumbram o portal que os levou até ali.
Ao atravessar o portal mistico para outra dimensão, como por encanto, a ferida causada pela mordida da serpente, fechou imediatamente e todos os sintomas de envenenamento sumiram. Mas o jovem ainda estava muito fraco. Sagrado Machado-de-dois-gumes carregou o companheiro, nas costas, até encontrar um lugar onde pudesse colocá-lo em segurança, enquanto ela procurava uma fonte de água para saciarem a sede.
As horas foram passando até que Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas sentiu-se forte o suficiente para caminhar, mesmo se apoiando na jovem, e partiram em busca de alimento. Juntos construíram um abrigo, batizando-o de Aldeia Jacundá, em alusão ao peixe que lhes serviu de primeiro alimento.
Plantaram as sementes que receberam da mãe do rapaz, antes da expulsão. Conforme o tempo foi passando eles foram colhendo suas plantações de milho, feijão, amendoim, batata doce, abobora, melancia, mandioca, macaxeira... e a vida foi acontecendo.
Seus filhos foram chegando. Quando Sagrado Machado-de-dois-gumes disse ao marido que seu primeiro filho estava a caminho, Carcará Sobrevoa-a-mata-em-chamas, escolheu seu nome.
_____ Acauã Caçador-de-serpentes... ele será um caçador muito especial. Ensinarei meu filho a caçar serpentes e levá-las para o lugar onde devem ficar, sem lhes causar nenhum mal. Se Deus as criou, tinha, com certeza, um plano bom. Meu filho não terá medo de nada, nem de serpentes, mesmo as mais venenosas.
Certo dia, durante a gestação, Sagrado Machado-de-dois-gumes acompanhou o marido numa visita ao chefe de uma Nação Além-do-espelho. Lá, durante a reunião, a jovem mulher ouviu histórias horripilantes sobre monstros assassinos que atacavam pessoas indefesas, sem que ninguém as pudesse salvar.
Apesar de haver sido criada em uma aldeia onde o ato de nascer, viver procriar e morrer era encarado como coisa sagrada, Sagrado Machado-de-dois-gumes se sentiu muito mal com as narrativas. Finda a reunião, os esposos foram levados até um quarto onde dormiriam. A mulher não conseguiu conciliar o sono.
____Tem alguma coisa errada comigo, com o bebê. Olhe isso, meu amor!!! Nosso filho alojou-se aqui e não sai. Está doendo muito... parece que alguém perfurou meu ventre com um espinho e o está torcendo, enrolando nele o meu útero, meus ovários... tudo... que dor!!!
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Cada criança que nascia, trazia o destino traçado do que seria quando crescesse.
... depois as netas e o número de habitantes de moradores da Aldeia Jacundá foi aumentando.
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Suas três filhas, a neta e uma filha adotiva são os outros habitantes da Aldeia Jacundá.
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A Xamã da Tribo é sua filha mais jovem, Mangangá Mãos-do-sono-sobre-os-olhos. Ela resolve os problemas mais intrincados, referentes à saúde e ao espírito. Mangangá se utiliza de plantas e ervas nativas para curar problemas de saúde. Maneja como ninguém o maracá, o tambor e o perfume dos incensos, fabricados por ela própria, para invocar proteção e ajuda dos espíritos ancestrais, com a finalidade de proteger sua tribo da peste, da fome e da guerra.
Quando o assunto é proteger a estrutura física da Aldeia, sua filha do meio é o General. Sarapó Nadando-sob-águas-rasas, toma a dianteira de tudo que se refere a segurança da Aldeia e de suas habitantes.
O assunto é diplomacia? Chama Acaraí Limpador-das-profundezas, sua primogênita. Ela entra em contato com os líderes das tribos das Nações Além-do-espelho, para tratar de assuntos de saúde, alimentação, educação, paz ou guerra.
Jundiá Onça-dos-rios-profundos, sua filha adotiva, é o sentinela. Ninguém consegue se aproximar, entrar ou sair da Aldeia sem que ela tome conhecimento. Autorize ou proíba.
A Mascote da tribo é Pequena Flor-mimosa-da-campina, que alegra, encanta e enternece a todas elas, com sua doçura de criança, apesar de muito cedo já haver demonstrado que será a sucessora de sua mãe, Mangangá Mãos-do-sono-sobre-os-olhos.
O tempo passava na mais perfeita harmonia, até que um dia, Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas foi convocado pelos líderes de outras tribos, das Nações Além-do-espelho, e demorou demais para retornar. Preocupada, Sagrado Machado-de-dois-gumes chamou sua filha, Sarapó Nadando-sob-águas-rasas e juntas, partiram ao seu encontro. Após várias horas de cavalgada o encontraram caído, perto de uma fonte, moribundo. Ao tentar socorrê-lo, perceberam que uma cobra coral jazia morta, ao seu lado.
Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas percebendo que sua hora havia chegado, fez Sagrado Machado-de-dois-gumes jurar que só iria ao seu encontro quando suas filhas e sua neta estivessem caminhando com as próprias pernas.
As duas mulheres conseguiram colocá-lo sobre um dos cavalos e levá-lo até a aldeia, mas era tarde demais. O veneno havia atingido seu sistema nervoso, prejudicando, de forma irreversível o funcionamento do diafragma, ele respirava com extrema dificuldade, já apresentando graves sinais de cianose.
Era 01:00 da manhã de uma sexta-feira quando Carcará sobrevoa-a-mata-em-chamas fez a Travessia do Grande Rio da Vida, deixando a esposa viúva e órfãs as três filhas e a neta, a quem amava com devotada afeição.
Desse dia em diante algo mudou drasticamente naquela Aldeia. Sagrado Machado-de-dois-gumes não permitia que homem nenhum, acessasse seus domínios. Suas filhas tentavam convencê-la de que as tribos das Nações Além-do-espelho findariam por descobrir o portal de acesso à Aldeia Jacundá e, quando isso acontecesse, elas sózinhas não resistiriam e nem sobreviveriam aos ataques por muito tempo...
____Esse lugar é inviolável. Aqui só entrará quem foi predestinado. Mais ninguém!
____Mas minha mãe, como descobriremos quem é o predestinado?
____Ele saberá, Acarí Limpador-das-profundezas, ele saberá ou... morrerá!
____Como assim? A pessoa que quiser fazer parte da Tribo terá que saber que pode fazer parte, é isso?
Sagrado Machado-de-dois-gumes olha para sua interlocutora e dispara.
____Não é justo? Você sabe qual a sua missão, aqui?
Sarapó Nadando-sob-águas-rasas, observa sua mãe e só então percebe o que ela está tentando dizer...
____Sim Senhora, Minha Mãe: "Cada seixo que compõe a estrada, cada árvore que ladeia o caminho, cada stela que demarca os limites, cada sentinela que observa e reconhece o visitante. Tanto podem nos proteger quanto nos destruir. Façamos com que tudo aconteça por um fato justo e ao nosso favor. Nunca exponhamos ao perigo o que temos de mais sagrado: nossa Aldeia é o nosso santuário! Não devermos trazer até ele o desrespeito e a profanação, sob pena de nada mais nos restar, no final, a não ser a desonra!” Minha Missão, Minha Mãe, é defender o nosso Santuário, com a minha própria vida.
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As tardes na Aldeia Jacundá são um espetáculo à parte. Após o meio dia, o sol abranda sua temperatura e a brisa mansa que sopra do leste, numa caricia refrescante, benfazeja, convida ao descanso.
Após o almoço, as moradoras da Aldeia Jacundá, gostam de se deitar em redes, na sombra das arvores e fazer a sesta. Quase sempre alguém prefere continuar seus trabalhos manuais ou contar história para Pequena Flor.
São mais ou menos 45 minutos, após as 14 horas, daquele dia 20 de abril, do ano de 2016, quando, após almoçar, a Matriarca da Tribo dirigiu-se à sombra de um frondoso umbuzeiro, com o intuito de fazer a sua sesta.
Sentada num banquinho, diante de um tear, Sagrado Machado-de-dois-gumes observa o quanto seu trabalho de tecer está adiantado. A bela manta de fios coloridos já deixa ver a cena que representa três mulheres, nas margens de um Grande Rio, tecendo o fio da Vida.
Pequena Flor-mimosa-da-campina (Ana Lia) se aproxima cantando uma canção muito antiga, aquela que sempre ouve sua avó cantar, enquanto tece.
_____"Flora maio, flora... flora já, florou... as Santas Flores de Maio... ainda, não se semeou! O inferno tremeu de medo... o céu se encheu de alegria... só por ver os milagres, do Santo Mês de Maria! As contas do Meu Rosário... são balas de artilharia, que combatem o inferno, quando eu rezo a Ave Maria!"
Um sorriso tranquilo ilumina a face da idosa. Sagrado Machado-de-dois-gumes, abre os braços, para os quais Pequena Flor-mimosa-da-campina corre e nos quais se joga sorrindo.
_____Vovó, conta uma história. Conta... conta... por favor, sim?!
O cheiro agradável de chá de Capim Santo enche o ar ao redor. Voltando-se para o lado de onde o vento sopra, avó e neta veem Mangangá Mãos-do-sono-sobre-os-olhos caminhando em sua direção com uma bandeja nas mãos. É o lanche da tarde, tapioca e chá.
A jovem mulher junta-se a dupla. Coloca a bandeja sobre a esteira de palha de coqueiro, oferece uma tapioca a mãe, outra a filha, serve a cada uma, uma canequinha de chá, se servindo logo após.
_____ Pequena Flor-mimosa-da-campina está me pedindo para contar uma história...
_____Boa idéia. Apenas deve se lembrar filha, que ainda falta responder uma tarefa da escola. Você prometeu, e... promessa é divida.
_____ ... e qual é o dever de quem deve Pequena-flor-mimosa-da-campina?
A garotinha fez menção de se levantar.
_____Pagar, vovó. Já vou.
Mangangá Mãos-do-sono-sobre-os-olhos (Águeda) segurou a mão da filha, sorrindo.
_____Não precisa ser agora. Agora, vamos ouvir a história que a vovó vai contar. Sente-se. Pode contar mamãe, estamos lhe ouvindo.
O olhar de Sagrado Machado-de-dois-gumes parece se perder na linha do horizonte. Lá, onde o sol brilha forte, por entre as folhas do umbuzeiro, atingindo os fios brancos que cobrem a cabeça da idosa, dando ao seu rosto o brilho irreal de um ser feérico. Lá, onde o céu se une a Terra, as palavras parecem brotar e voar na sua direção, tecendo um recontar de vidas que já foram e... que ainda são, agora, no presente. Bem antes de Sagrado Machado-de-dois-gumes (Elesbona) começar a contar a história, Sarapó Nadando-sob-águas-rasas, Acarí limpador-das-profundezas e Jundiá Onça-dos-rios-profundos se aproximaram, silenciosamente, e se sentaram sobre a grande esteira de palha de coqueiro, para apreciar a narrativa da mãe...
"____Era uma vez, há muitos e muitos anos, uma família, onde as mulheres eram maioria e se auto-sustentavam trabalhando na lavoura.
Os maridos, quase sempre fugiam das responsabilidades ou morriam cedo demais, deixando-as com a dura e dupla função de ser mãe e pai de uma prole numerosa.
A Matriarca mais Antiga dessa Linhagem, chamava-se Elesbona Maria Indalino Poção, ou simplesmente Boninha, como era chamada carinhosamente pelos netos, ou ainda, Madrinha Morena, pelos afilhados.
Elesbona não tinha a pele escura, ao contrário, era demasiadamente branca, ou melhor, sem nenhuma melanina. Isso lhe dava um tom de pele quase transparante. Por conta dessa peculiaridade, Elesbona não podia sair de casa durante o dia, sob pena de ficar com a pele repleta de queimaduras do sol. Algumas pessoas a chamavam de Filha da Lua, apelido que vez por outra lhe deixava irritada.
Dizem que o marido, Pedro, era um homem alegre e paciente e a amava demais. Boninha não era de fácil convivência. Adquirira, ninguém sabia por quê, o desgraçado hábito de consumir bebida alcoólica. E, quando isso acontecia, ela ficava muito brava. Batia em quem a enfrentasse e quebrava o que topava pela frente. Pedro, quase sempre findava por levar algum desacerto. Ele nunca reclamava ou revidava. Sua paciência parecia ilimitada. Talvez por conta disso ele nunca se separou de Boninha.
Tiveram uma única filha. Águeda Maria Indalino Poção, que, por motivo de um casamento desgraçado, passou a chamar-se Águeda Maria da Conceição. Boninha odiava esse sobrenome. Odiava o genro. Um sujeito, como se diz no popular - lascado - sem eira e nem beira, tendo por profissão cuidar da linha férrea e por conta disso era chamado "cassaco de linha".
Foi esse tal por quem Águeda tomou-se de amores, fugiu e casou com ele. Boninha queria ver o diabo e não queria ver a filha, o genro e nem os netos, quatro ao todo, três meninas e um menino.
Contam que Águeda, acompanhava o marido, carregando um filho no ventre, um nos braços, um agarrado em sua saia e outro montado nas costas do marido, sobre o "matulão".
Ambos, ela e o marido, carregavam víveres, tais como café, açúcar, farinha, feijão, sal, candieiro, querosene, fósforo, tecidos, sabão, panelas, pratos, canecas e colheres... tudo envolto em "esteiras de caboclo", amarradas por cordas que eles colocavam ao redor dos ombros. A tiracolo, ele, o marido, levava suas ferramentas de trabalho.
Era uma vida dura, aquela. Boninha não aceitava que a filha, a quem ela criara com tanto zelo, lhe desse tamanho desgosto, vivendo como retirante, "estrada acima, estrada abaixo" passando necessidade, frio e exposta a doenças terríveis, acompanhando um João-ninguém.
Certo dia, Águeda voltou para o Sítio. Sozinha. Sem marido e sem filhos. Pedro recebeu a filha numa alegria de passarinho. Boninha gadunhou um cinturão e esperou a filha, sentada em sua rede, na varanda.
____Veio buscar o quê?
Águeda respeitava a braveza da mãe, mas não temia a agressão. Aproximou-se, se ajoelhou reverente, baixou a cabeça e estendeu a mão direita em direção a Boninha.
____Sua benção, minha mãe!
Boninha estremeceu. Águeda sempre fora calada. Em casa, ficava a maior parte do tempo em silêncio. Entretanto, quando resolvia falar, o som de sua voz tinha o Dom de desarmar a mãe. Mesmo assim Boninha demonstrou que, dessa vez, não se desarmaria, tão fácil.
____Minha Benção? Você por um acaso tem mãe?
A jovem mulher, ergueu a cabeça e seus olhos, de um azul puríssimo, fitaram atentamente a face da mãe. Ambas sabiam que o sentimento que as unia era mais forte do que qualquer coisa, nesse mundo. Sabiam que não era só o laço de mãe e filha. Era, antes de tudo, um compromisso anterior.
____ O que houve? Cadê seu sapo encantado? Cadê seus filhos?
Águeda continuou ajoelhada, a mão estendida para a mãe.
____Sua benção, minha mãe!
Boninha percebeu que se não abençoasse a filha ela não lhe contaria nada.
____Deus lhe dê vergonha. Levante-se. E então, onde estão todos?
A resposta de Águeda é curta. Contundente.
____Mortos.
A velha senhora funga incomodada, como se quisesse parar o assunto. Tarde demais. Os olhos da jovem mulher estreitaram-se mas deles não escorreu uma lágrima sequer. Pedro puxou uma cadeira e tocou no braço da filha, gesticulando para que se sentasse.
____Obrigada pai.
Boninha retornou ao assunto.
____Mortos? Todos? Como?
____Terçã Maligna, minha mãe! Morreu primeiro o bebê. Joaquim tinha somente dois meses de vida quando adoeceu... cuidei dele, como pude, na beira da linha do trem... sob uma apertada barraca de lona. Ele melhorou um pouco... dois dias se passaram e no terceiro dia ele piorou, era tardinha de uma segunda-feira... madrugada da terça-feira... meu filho morreu dormindo, em silêncio feito um passarinho. Depois foi a vez das gemêas... Catarina e Manoela... partiram segurando minhas mãos, olhando para mim. Quando Jandira adoeceu, eu já sabia que o próximo a cair seria o pai deles... não deu outra! Um dia, depois de enterrarmos Jandira, Amancio piorou. Febrão de cheirar a ferro em brasa. Meio dia a pino ele se sentava nos dormentes, tremendo de frio... não demorou muito e eu me vi cavando mais um buraco, junto das outras quatro covas e... enterrando o pai, ao lado dos filhos. Cavei outro buraco e enterrei todas as coisas que a gente carregava, e junto, as ferramentas de trabalho dele. Finquei uma cruz sobre cada cova e parti, sem olhar para trás. Eu sabia o caminho de volta para a minha casa. E aqui estou, minha mãe!
Elesbona ficou calada, olhando a filha. O tempo pareceu cristalizar-se. Pedro que até então só ouvira, calado, pigarreou meio tímido, tentando tirar as duas mulheres daquela espécie de letargia inquietante.
____Vou fazer um café. Você deve estar com fome...
Águeda sorriu para o pai e voltou a olhar para sua mãe, numa angustiante espera. Sabia que ela nunca fora de perdoar, sem antes dizer o que a machucava por dentro. Elesbona sabia que sua filha estava ali, pedindo, silenciosamente, o seu perdão. Ela estranhava sempre o fato de que a filha parecia nunca perceber o quanto suas escolhas a magoavam. Então, a Matriarca se endireitou dentro da rede, como tentando se colocar na devida posição de Senhora da Casa.
____Sabe o quanto você errou Águeda? Sabe o quanto me feriu? Não foi a primeira vez e creio que não será a última... então preciso lhe dizer umas quatro palavrinhas. Você não pode judiar das pessoas e sair por ai, de nariz empinado, como se não tivesse feito nada... existe uma Lei da qual não escapamos, filha! Tudo o que você faz nessa vida, retorna para você, cedo ou tarde... cuidado com o que você atira para cima... pois sempre vai cair na sua cara, antes que tenha tempo de se proteger! Não posso lhe dizer que não fique, aqui, conosco... mas também não posso deixar passar a necessidade que você tem de pagar por seus atos... a dor que me faz passar, você terá que sentir para me entender! Só lhe digo uma coisa: Atrás virá quem me vingará!
Pedro se aproximou das duas mulheres... e ao ouvir a última frase de Elesbona, derrubou, com estrépito, a bandeja que carregava nas mãos, quebrando as xícaras, derramando o açúcar e o café recém coado. Correu para a esposa e ajoelhou-se ao seu lado, segurando suas mãos.
____Não Minha Morena. Não. Não condene nossa filha a pagar um preço tão alto! Perdoe ela Minha Boninha... perdoe!
____Pedro, qual o dever de quem deve?
____Pagar, mas... ela é a nossa menina, você esqueceu?
As feições da senhora se contraíram. Águeda sabia que a mãe estava tentando conter sua fúria e abaixou a cabeça aguardando a sentença.
____A Justiça pra ser correta, começa dentro da nossa casa! Não fui eu quem esqueceu... foi ela, e creio que você também, Pedro! Ela fica, por sua causa... mas vai pagar tudo que deve... nem que tenha que viver mais três vidas. Você se lembra do que o meu pai nos disse quando fugimos da aldeia e ele nos encontrou? Ninguém foge do seu credor e fica impune. E você, já que a defende... volte e cuide dela, nesses três retornos. Faço questão de estar presente, para ampará-la... sei que também errei e tenho que pagar!
O homem se apavorou. Ele sabia que Elesbona era o oráculo da tribo da qual fugiram, para não morrer. Sua mulher carregava consigo, além da maldição de haver nascido albina, a maldição que recebeu por contrariar o Pajé, seu pai, ao recusar se casar com um jovem guerreiro que lhe haviam arranjado, preferindo ficar com ele, Pedro, o filho da viúva do antigo cacique.
____Minha Morena... devemos ao seu pai, ao noivo que lhe arranjaram. Devemos a sua mãe que morreu de tristeza por nossa causa... devemos a minha mãe... eu era o guardião dela e a deixei sozinha! Está nos condenando Minha Boninha. Por caridade, não faça isso!
Elesbona não volta atrás em suas palavras. Pedro sabe que o destino daquela família está selado: Renascer até que suas dívidas espirituais estejam pagas.
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Um silêncio incômodo acompanha o final da história. Sagrado Machado-de-dois-gumes, ainda fitando o horizonte, finaliza.
____Dizem que aquelas pessoas renascerão, na mesma família, ou se reunirão de uma outra forma, quantas vezes forem necessárias, até que todos os sentimentos ruins sejam exterminados de suas Almas. Ai, entrou pela perna do pato e foi cair no indês, Senhor Rei mandou dizer que você contasse três...
Quando Sagrado Machado-de-dois-gumes finda a história um suspiro coletivo parece aliviar a tensão do grupo familiar. Como sempre, Pequena Flor-mimosa-da-campina é a primeira a quebrar o silencio.
____Então vovó, eles voltaram no tempo, para pagar suas dividas?
____Voltaram sim, Minha Flor... na mesma linhagem!
____Como assim? Você os conhece?
Sagrado Machado-de-dois-gumes olha para a neta sentada no colo da mãe e sorri.
____... digamos que sim.
____... e a senhora sabe o que acontece com quem termina de pagar o que deve?
____Quem já pagou suas dívidas, Pequena Flor, está livre... os outros... ainda não!
____Isso me deu uma idéia, vovó. Vou terminar a minha tarefa da escola para ficar logo livre. Com sua licença.
Beija os cabelos da avó e antes de deixá-la, lhe segura a face entre as mãozinhas, sorrindo.
____... bigadinha pela linda história vovó! Vou estudar, pois quero escrever uma história assim... sobre a nossa linhagem.
F I M
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