De poemas e da poesia - (16/01/2012)
                           Esboço de ensaio

 
        Se meus poemas são poesia, não o sei com certeza, que nem todo poema é poesia, assim como muita prosa é poesia, tal qual a prosa de Guimarães Rosa, que já a tem desde o próprio nome. Gostaria de ter sobre minha escrita “poética” a mesma lucidez que me ocorre (ou me ocorria) diante da escrita poética das outras pessoas.
         Talvez eu seja apenas portadora de uma boa antena poética que me garante a percepção de muita da poesia que flui das coisas e isto já é cota razoável de bem em um mundo de infinitas miserabilidades criadas pela nossa Espécie.
        Vejo a poesia como um bem de vocação comunitária, ao menos se avançarmos rastro atrás até a sua origem, vocação que se manteve, sob formas diversas, até ainda a Idade Moderna – falo de Ocidente – e que foi, a partir daí, se afastando cada vez mais célere dessa vocação e se tornando um exercício mais e mais solitário, para leitura de leitores apenas em seus espaços particulares. A Internet parece-me estar a trazer de volta (veja-se o espaço do Recanto) em novos moldes, a partilha da poesia, recuperando a sua dimensão social. Se ainda não é um bem para todos – nunca o foi, em verdade, em tempo histórico algum, este sonho é uma Utopia - é pão necessário para muitos, tão necessário para a vida como o são os pães, feitos de trigo; água tão imprescindível como a água que permite a sobrevivência do corpo.
         Se sou efetivamente poeta, não o sei; com certeza, nutro-me de poesia, da poesia que não se encontra só nos poemas, mas, em outras manifestações da arte. Sem a poesia, neste sentido mais amplo, eu seria um ser deveras miserável, digno só de muitíssima pena. Sem a bênção da poesia eu seria, apenas, uma completa e irremediável mendiga, mendiga de mim mesma a me pedir esmolas ao real, ao que chamamos real imediato, com o qual temos os compromissos necessários e obrigatórios, no centro do qual, sem a poesia e o sentimento poético do mundo, segundo a expressão de Drummond, eu – só posso  dar meu testemunho pessoal – morreria por falta de oxigênio.

* Este texto me foi inspirado pelo poema OS CARROS NÃO RESPEITAM PEDESTRES, de MARCELO BRAGA.
 

Manhã de 16 de janeiro de 2012.