Projeto Quelônios do Guaporé
O rio Guaporé nasce no município de Pontes e Lacerda no Estado do Mato Grosso, entra no estado de Rondônia, fazendo a divisa natural entra Brasil e Bolívia, e deságua no rio Mamoré no município de Costa Marques.
O vale do Guaporé constitui-se como zona de transição do Pantanal Mato-grossense e Amazônia, uma região riquíssima em biodiversidade e belezas naturais, com grande abundância de orquídeas, borboletas, ariranhas, aves, botos, jacarés, peixes e quelônios.
Costa Marques é um cidade histórica do período Colonial que vivenciou o auge dos ciclos econômicos da borracha. A sua volta existem inúmeras comunidades ribeirinhas, quilombolas e descendentes de indígenas que vivem da pesca e caça de subsistência, da coleta de frutos silvestres, criação de pequenos animais e produção agrícola em pequena escala.
É um verdadeiro paraíso que atrai todos os anos milhares de visitantes em roteiros turísticos que combinam atrativos naturais, culturais e históricos.
Foi nesse cenário que, em 1999, surgiu o “Projeto Quelônios do Guaporé” com objetivo de garantir a preservação das populações de tartarugas e tracajás dessa região.
As ações seguem a metodologia do Projeto Quelônios da Amazônia que o IBAMA desenvolve em diversos estados da Região Norte, mas com um diferencial, pois, nesse caso, ao invés de funcionários do governo, quem executa os trabalhos de preservação da fauna aquática são as próprias populações tradicionais que vivem na área, por meio da Associação Comunitária Quilombola e Ecológica do Vale do Guaporé (ECOVALE), que tem como coordenador o ambientalista José Soares Neto (mais conhecido como Zeca Lula).
Além do IBAMA, inúmeros órgãos federais, estaduais e municipais colaboram, como: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), Agência de Defesa Sanitária Agrosilvopastoril (IDARON), Secretaria de Desenvolvimento Ambiental (SEDAM), Centro Universitário CESUMAR, Prefeitura de São Francisco do Guaporé e Prefeitura de Costa Marques.
As atividades são desenvolvidas de julho a dezembro, período da reprodução do tracajá (Podocnemis unifilis) e da tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa). As fêmeas de tracajá iniciam seu ciclo reprodutivo algumas semanas antes, mas os filhotes nascem na mesma época , pois o tempo de incubação de suas ninhadas é maior do que da tartaruga.
Todos os anos uma quantidade enorme de tartarugas desova nas areias brancas, criando um verdadeiro espetáculo natural. Durante a madrugada, as fêmeas começam a sair dos rios em busca dos melhores lugares. No auge da temporada é possível ver dezenas, centenas, até milhares de fêmeas disputando espaço para escavar seus ninhos. Essa aglomeração intensa de animais é algo relativamente raro, que ocorre em poucos locais da Amazônia, o que torna ainda mais especial esse lugar.
Um verdadeiro congestionamento se forma nas praias, com fêmeas por todo lado, escavando seus ninhos, jogando areia em cima umas das outras. Quem tem o privilégio de assistir nas primeiras horas da manhã esse curioso e belo ritual fica realmente encantado. É uma experiência para se carregar na memória e no coração por toda vida!!!
Entretanto, o Projeto não é feito só de encanto e magia; também exige muito esforço e suor. Nessa fase o trabalho de fiscalização se intensifica para evitar que caçadores cheguem às praias para capturar as fêmeas e seus ovos.
Cada tartaruga põe de 50 a 150 ovos, e os filhotes só começam a nascer cerca de 60 dias depois. As tracajás nidificam de 10 a 25 ovos, e o nascimento acontece entre 70 e 90 dias de incubação.
Nos meses de novembro e dezembro as praias se transformam em uma espécie de maternidade para milhões de tartaruguinhas. A eclosão é outro momento emocionante, quando inúmeros voluntários participam do recolhimento dos recém-nascidos.
Os filhotes são transferidos para berçários, onde permanecem por 20 dias para perderem o “pitiú” (cheiro forte característico dos recém-eclodidos) e para crescerem um pouco e se tornarem mais fortes.
A soltura dos filhotes é o momento mais alegre. Tudo acontece em clima de celebração, sempre com a participação de moradores locais, estudantes, autoridades, pesquisadores, jornalistas e turistas.
Durante 16 anos de atividade, o Projeto Quelônios do Guaporé devolveu mais de 10 milhões de filhotes para a natureza.
Vale destacar que esse trabalho de monitoramento e proteção das praias rondonienses não beneficia unicamente aos quelônios, pois elas são utilizadas por outras espécies, como lagartos e diversas aves (gaivotas, viuvinhas, cangapara, tetéus etc.), que tem sido alvo das ações conservacionistas da ECOVALE.
Por essas e outras razões que o Projeto Quelônios do Guaporé tornou-se um exemplo de amor à natureza que serve de inspiração para ecologistas e defensores do meio ambiente. É certamente um ótimo modelo de conservação ambiental que envolve as comunidades locais e órgãos públicos em busca do desenvolvimento sustentável.
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Palmas - TO, Janeiro de 2016.
Giovanni Salera Júnior
E-mail: salerajunior@yahoo.com.br
Curriculum Vitae: http://lattes.cnpq.br/9410800331827187
Maiores informações em: http://recantodasletras.com.br/autores/salerajunior