Carta à Lúcia

Lúcia, imagine uma corda. Ela possui dois pontos. A explicação de como ela foi criada ou passou a existir não é relevante. O fato é que ela existe, e sabemos racionalmente que ela existe e não pode não-existir, posto que se ela já existe é porquê um número de causas a gerou. Poderia chamar isto de fatalismo ou determinismo se bem quisesse, porém meu foco é outro. Suponhamos que no dia que essa corda foi criada, não importa o quando, uma pessoa acende um fósforo e põe fogo nessa corda. O fogo vai consumindo pouco a pouco até que ela acaba. Há vários tipos de cordas e de vários tamanhos. Algumas queimam tão rápido que nem podemos mensurar o tempo que levou para serem destruídas.

Agora vamos supor que um garotinho ganhou uma corda e ateou fogo nela. É correto afirmar que ao passo do queimar da corda eu posso inferir que eu perdi parte da corda, pois ela nunca será a mesma. Tive uma perda e não um ganho. Posso dizer que no lugar da corda perdida eu ganhei as cinzas, mas e daí? A corda sumiu e as cinzas voam. Alguns podem guardá-la, mas não há garantias de que as cinzas da corda continuariam sempre juntas até não mais existir nenhuma corda, apenas a ideia da corda.

Agora Lúcia, é correto inferir também que a comemoração pressupõe ganhos. Ninguém comemora uma perda, a não ser que essa perda signifique um ganho, mas no final seria a comemoração de um ganho advindo da perda. E na história da corda não há ganhos, pelo menos não na perspectiva Corda-Garoto. A corda apenas perdeu, aos poucos, partes dela mesma.

Como então posso comemorar a morte de alguém? Aniversário é sinônimo de masoquismo e presente de aniversários são oferendas à Morte. Não vou ao seu aniversário, mas poderíamos tomar um sorvete, sorvete é bom.

Krabat
Enviado por Krabat em 01/12/2015
Reeditado em 13/12/2015
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