Nossa Pobre Educação
Nossa pobre educação...
Jorge Linhaça
Que me perdoem os eruditos e os não eruditos, mas escrever sobre educação é complicado.
Por uma lado, falar de forma clara e quase informal afasta, para muitos, a credibilidade de um texto não recheado de palavrório acadêmico, por outro lado, criar um texto recheado com jargões ou palavras técnicas impede a compreensão justamente daqueles que deveriam ser o alvo principal de nossas reflexões. Em assim sendo, tentarei não sucumbir a nenhuma das duas dinâmicas de escrita para, talvez, e apenas talvez, adentrar os dois mundos.
Nossa educação pública é absolutamente caótica e relegada a um mero depósito de crianças e adolescentes que não possuem, por sua vez, qualquer respeito pela escola ou seus agentes (professores e funcionários). Tais agentes, por sua vez, tornaram-se, em parte por sua própria omissão, em parte pelas imposições de “cargos” superiores, e ainda, em parte por conta do descaso da própria sociedade, meros joguetes em uma trama politico-econômica baseada em uma meritocracia ilusória e mal compreendida pela sociedade em geral, acostumada a criar conceitos baseada apenas e tão somente em frases de efeito ou textos de 120 caracteres.
Os atuais alunos, apoiados por um discurso permissivo dos pais e da sociedade como um todo, frequentam a escola como patrões ou coronéis de antigas fazendas, ao passo que os professores e funcionários são tratados como meros dependentes dos mesmos, como escravos sobre o lombo dos quais a chibata “cantará solta” caso não se submetam à vontade de alunos e pais.
O papel dos professores, que antes eram encarados com respeito e admiração pela sociedade em geral, passou a ser de “babás” de crianças e adolescentes para que seus pais possam desfrutar de momentos de lazer ocioso ou agregar renda ao núcleo familiar, dependendo da camada social em que habitem e transitem. Hoje, ser um professor deixou de ser uma honra e passou a ser sinônimo de falta de opção profissional.
Junte-se a isso o sucateamento dos salários e o precário investimento em recursos humanos ou físicos e, pasmem, governadores, eleitos com esmagadora maioria de votos, que pretendem fechar centenas de escolas em seu estado com a desculpa de economizar alguns trocados no orçamento, e teremos um quadro digno de um file de terror de baixo orçamento.
Na verdade, sucatear a escola pública serve para atender aspirações políticas de duas maneiras:
A primeira é manter a população alienada em virtude da incapacidade de analisar textos e fatos, já que, há décadas se formam alunos semi-analfabetos ou analfabetos funcionais.
A segunda é fortalecer grandes grupos “de educação” particular através de uma migração constante de alunos para aquelas entidades, o que também tem duas causas/consequências:
A primeira e a mais clara e perceptível é manter o “status quo” das classes com maior poder aquisitivo pois, com uma educação básica melhor, as suas oportunidades no mercado de trabalho e de ingresso a universidade de ponta se tornam infinitamente melhores que a se um aluno oriundo de escolas públicas.
A segunda, menos perceptível, é o fomento para campanhas políticas através de doações de campanha.
Enfim, não se trata de ter ou não ter recursos para propiciar uma educação pública de qualidade, trata-se de manter o poder nas mãos dos mesmos grupos através de décadas e séculos.
Os filhos das classes C, D e E, são premiados ( quando conseguem apesar de todo esse quadro disforme superar o ensino fundamental) com cursos técnicos ou universitários de baixas expectativas, acalmando assim o clamor social.
Os cursos voltados para a educação são cada vez menos procurados nos bancos universitários, a formação desses profissionais raramente é das melhores e, hoje em dia, os professores formados já são fruto dessa “escola” que desensina, que deforma o indivíduo ao invés de forma-lo. Instalou-se um ciclo vicioso cruel e canibalista, onde a escola, antropofagicamente, alimenta-se de restos humanos, sejam estes professores e funcionários ou alunos e responsáveis.
Só como forma de exemplificar o que digo, recentemente participei de um concurso público para Agente de Organização Escolar, em uma diretoria de ensino do Estado de São Paulo.
Estou fora dos bancos escolares há décadas, o cargo exigia segundo grau completo, não estudei 5 minutos sequer para a prova. Alguns parentes que cursam faculdade ou recém saíram do segundo grau prestaram o mesmo concurso, embora em diretorias de ensino diferentes.
Resultado, a classificação deles ficou entre as posições 400 e 500 quando saiu o resultado, eu passei em 13º lugar e ainda assim me senti frustrado por não ter uma colocação melhor.
O que quer dizer isso? Quer dizer que a educação pública atual é tão ridícula que e deformante que um senhor de 54 anos, longe dos bancos escolares, sem estudar uma linha sequer, já entra com larga vantagem em qualquer concurso que vá prestar.
Resta à sociedade dizer se é essa a educação que deseja para seus filhos e netos, se esse tipo de educação acadêmica, tocada por governantes repletos de má-fé deve ser o caminho para a nossa sociedade futura. Há mais de 20 anos o meu estado, São Paulo, se tornou refém de governantes que tratam a educação com descaso e como curral eleitoral a fim de se manterem no poder indefinidamente. A população, feliz da vida com o fato de seus filhos serem aprovados automaticamente, evitando assim a “ vergonha” de dizer aos amigos que seu filho foi reprovado, aplaude este estado de coisas a cada votação nas urnas.
E não se iludam aqueles que acham que por que podem pagar uma escola particular estão isentos das consequências nefastas do quadro atual. Estão aí as drogas, a permissividade, a desagregação familiar, a violência o vandalismo e etc, para mostrar para onde caminha a sociedade segmentada e de oportunidades desiguais para os nossos jovens.
Quem quiser que entenda...quem não quiser que sofra as consequências calado e não se ache no direito de reclamar por melhor segurança, saúde ou o que quer que seja, pois qualquer profissional, de qualquer área que seja, inicia sua vida social justamente nos bancos escolares. O resto é consequência. Se formamos alunos irresponsáveis, eles continuarão irresponsáveis por toda sua vida profissional, independente de qual carreira sigam.