VERMELHO DE VERGONHA
Ultimamente todos nós brasileiros aprendemos a fazer "dos limões uma limonada".
Até limonadas "suiças" e algo vergonhosas experimentamos recentemente.
E o mundo também conosco a degustou.
Trata-se dum exercício de vida super legal!
E claro, é algo que hj nos é super estimulado por todos os lados .
Somos expertises em palatáveis limonadas dos azedos limões .
Falar em crise realmente já cansou, virou lugar comum; todavia é impossível fechar os olhos para as realidades do meio.
Crises passam, é verdade.
Talvez a única dificuldade residual do aprendizado das limonadas vergonhosas, nos seja recuperar a confiança e a ética nas instituições.
Quando eu era criança me lembro que se usava a expressão "ficar vermelho de vergonha", e eu, aprendi acreditar que vergonha é um sentimento inato a todos os Homens, aos seres humanos que somos todos.
Embora não sejamos todos tão humanos assim...a ponto de sentir vergonha.
Então, me lembro que várias vezes fiquei vermelha de vergonha.
Ou porque errava a tabuada, ou porque tirava uma nota baixa, ou porque o professor dava bronca e me mandava sossegar, e sei que eu sentia vergonha de sentir vergonha por coisas bobas mas sérias, como uma olhada torta do meu pai.
Coisas de museu...
E hoje sei: nem todo mundo sente vergonha.
Vergonha não é um sentimento uno a todos. Não, não é.
E nem estou dizendo que sentir vergonha nos faça melhor, só nos faz diferentes.
Só fica vermelho de vergonha aquele que tem alguma vergonha registrada, uma ao menos.
Mesmo se tendo vergonha é preciso se sentir vergonha pré-conceituada de algo. Subliminar demais...
Como culturalmente tudo muda, para se sentir vergonha primeiramente é preciso mergulhar em si para se inquietar com o que é tido como vergonhoso dentro de si mesmo e entender que vergonha é algo que vai além dos "usos e costumes".
É de natureza mais pétrea.
Seria como se auto- remexer ao sentimento de ética na sua maior profundidade. Muito subjetivo, concordo.
Não importa se o mundo julgue a nossa vergonha como algo sem vergonha, vergonha é qualidade personalíssima...e só assim sobrevive no âmago do invisível.
Todavia já sei, aprendi por aqui, que existe um tipo inusitado de VERGONHA SEM VERGONHA.
A VERGONHA QUE SE AUTO VITIMIZA E QUE DÁ IBOPE INVERTIDO.
Seria como um advérbio de modo perene e corrente: sentir e exercitar a vergonha...desavergonhadamente.
E o mais incrível: descobri que o que causa vergonha em alguém é tido como mérito em outro alguém: É O TIDO COMO SEM VERGONHA HERÓI.
"Sem vergonha" hoje é virtude...para alguns.
Mas digo a vcs que hoje continuo sentindo vergonha por várias vergonhas que não são minhas...
Tal me alivia porque embora sejam muitas as vergonhas ao derredor, abrimos um precedente de alívio à vergonha social e nacional, porque: nada mais nos envergonha!
Pode acontecer o que for: desaprendemos a ficar vermelhos, mas só se a pauta for...sentir vergonha. Manipulamos toda e qualquer "semvergonhice" ao bel prazer das horas...
Então, sentir vergonha de quê?
E para quê, não é mesmo?
Assim, como numa resolução terapêutica pelo tempo em declínio, sigamos desavergonhados por aí, até que um novo conceito vergonhoso nos estimule a tal emoção...e nos faça novamente, sem mérito, corarmos a face coletiva e democraticamente ...mas só duma vergonha legítima, fundamentada.
Descobri também que, a despeito de se ficar vermelho de vergonha, melhor mesmo é ficar em paz por não ser ator, muito menos protagonista, de tanto teatro desavergonhado.
Mavi, em sincera dedicatória.