Pequeno Ensaio Sobre Questões de Filosofia - parte 28

A matéria é uma manifestação da mente. Não é a origem, mas o que se originou de uma ideia primeira. O princípio de todas as coisas repousa numa inteligência impossível de ser totalmente penetrada. Até mesmo nossa intuição encontra limites para a compreensão do processo de criação da vida e do mundo. Melhor do que procurar atingir o inatingível seria auferir as dádivas deste intrigante universo. Nem mesmo a filosofia, por mais atraente que procure se apresentar, orgulha-se de abiscoitar esse conhecimento que transcende o raciocínio formal. Para ter esse entendimento que transcende é necessário transcender também os atos triviais, pelo menos em algum momento do dia e procurar focar a mente no universal captando, dali, a sabedoria. Este hábito de entrega ao desconhecido traz, juntamente com uma sensação de ligeira insatisfação, uma leveza espiritual descritível somente por quem já o experimentou. A continuidade disso fará nascer um interesse muito maior pela vida e pelas coisas do espirito, que é o que realmente vale a pena. Toda busca resulta em algum esclarecimento; este não é privilégio de seres especiais. Todos possuímos esse dom natural de lucubrar; simplesmente não damos a ele a chance do desenvolvimento. Preferimos o conforto produzido pela valorização dos cinco sentidos carnais, embotando-nos com essa ideia herdada a o longo das gerações; mas é perfeitamente possível romper esse grilhão do tempo a adentrar um mundo de muito maior liberdade.

E é justamente a insatisfação que traz o progresso. Desta simples colocação adveio todo o progresso alcançado pela filosofia até os dias de hoje. Foram os grandes homens, insatisfeitos com suas condições de vida, sedentos de sabedoria que, ao não aceitarem as ideias medíocres de suas épocas, nos trouxeram luz e entusiasmo ao desvendarem um pouco do mundo que captaram pela intuição. A filosofia não responde nem traz soluções, mas reflete e faz refletir. O exercício mental da ponderação e da análise contribui para o desenvolvimento da inteligência; é esta que procura diferenciar o filósofo medíocre do coerente. Penso que, impregnadas em quase toda a totalidade das ideias filosóficas, encontram-se as frustrações, as angústias e as inclinações do estudioso. Falar ou não em Deus, acreditar ou não na Sua existência, rejeitá-lo ou mesmo culpá-lo pelas mazelas do mundo faz parte do estado d’alma daquele que se diz filósofo. Ele reflete, nas letras, seu estado psicológico, suas experiências de vida e procura passar para o leitor um cenário equivalente, usando argumentos e teorias dignos de dubiedade e, quando não, de desconfiança.

Partindo desse argumento, tornar-se filósofo cabe a qualquer um que queira respostas satisfatórias quanto a sua própria vida. Se não conseguimos viver sem pensar, por que não pensar inteligentemente? O mundo material, como uma projeção do mundo mental d’Aquele que o criou fornece ao homem, detentor primaz dessa criação, miríades infinitas de oportunidades a um desenvolvimento mais significativo na escola da vida. Somos e continuaremos a ser aprendizes nessa busca incansável do desconhecido. Se Deus é um ser infinito tudo o que Ele criou vem a ser infinito também. Nesse ponto, angustiar-se, impacientar-se ou entristecer-se na busca da compreensão dos Seus mistérios não traz vantagem alguma, pelo contrário, dificulta e enfraquece a criatividade necessária a uma busca eficaz, que traga respostas satisfatórias e, como prêmio, a felicidade. Penso que, na felicidade, mais do que entender Deus está aceitá-Lo com alegria e gratidão, da mesma forma que aceitamos um filho sem questionarmos suas imperfeiçoes, porque o amamos acima de tudo. Questionar Deus é duvidar da vida. Crer nas ações do bem, na sinceridade dos religiosos é ver Deus manifestado. Descrer de Deus não é um defeito, não é um mal, mas a declaração de um vazio existencial que ainda não foi preenchido.

Tudo aquilo que a mente é capaz de reconhecer torna-se realidade. Tanto a predominância da matéria quanto do espirito podem ser reconhecidas. O que dá valor a cada uma delas é a nossa convicção. Nada que possua vida consegue, por força própria, manifestar e manter essa vida porque a vida é algo que independe do esforço ou da vontade. A vida existe por ela mesma, mas tudo aquilo que possui vida não existe por si só senão por uma vontade superior que comanda todas as existências. Reconhecer a força do espirito é valorizar a vida além daquilo que os órgãos sensoriais conseguem sentir. Admitir Deus como espirito inteligente, criador de toda manifestação material é dar um passo importante para a auto evolução. Alguém já afirmou que não chegamos a utilizar ¼ da nossa capacidade mental. Não há evidência maior quanto a nossa limitação como seres humanos e continuaremos assim caso não procuremos avançar um pouco mais. O ápice vida, se é que seja correto utilizar esta expressão, encontra-se na descoberta de que nada sabemos, de quanto ainda vagamos na penumbra do conhecimento. A vanglória das descobertas científicas cai por terra ao nos darmos conta da nossa pequenez espiritual e isso por nossa própria culpa e desleixo. Reconhecemos e valorizamos aquilo que nos diz respeito enquanto preenche nossos anseios imediatos e mesmo isto é descartado quando julgamos não mais necessário. Por isso, realidade vem a ser o resultado da visão pessimista da maioria, que vê a vida como um palco lúgubre de contendas intransponíveis.

Se Deus é espírito e Sua criação é espiritual, não há, em última análise, aquilo que denominamos matéria segundo o conceito vigente. A matéria não possui, por si só, autonomia nem força; ela é a própria mente, no caso, a Mente de Deus que a projetou para a criação do universo. Entender isto é entender a vida em toda sua simplicidade. Não há necessidade de explicar o inexplicável criando termos e expressões difíceis de serem assimilados. Deus existe porque existe; o espirito existe porque existe. Se é a aceitação do bem e sua prática que trazem a paz e a felicidade, a harmonia entre as ideias e os ideias é que trarão a paz mundial. Isso supera, de longe, todas as tentativas de oposição. Se retornarmos aos primórdios da criação e entendermos a vontade de Deus ao criar o mundo, só isto já é o suficiente para que se concretize a paz. A filosofia que caminha ao lado da aceitação de um Deus de bondade e amor é uma filosofia inteligente que congrega o ideal dos homens. Não é impondo princípios e ideias inovadoras que obteremos um mundo melhor, mas compartilhando um conceito de mundo que admite um criador e uma criação que têm por inerência a perfeição.

Professor Edgard Santos
Enviado por Professor Edgard Santos em 01/07/2015
Reeditado em 01/07/2015
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