Pequeno Ensaio Sobre Questões de Filosofia - parte 22
Desta feita, não há maior felicidade na vida do que aquela proporcionada pelo uso apropriado da riqueza material. Se o objetivo primordial de alguém for ganhar dinheiro pensando exclusivamente em satisfazer os desejos proporcionados pelos sentidos carnais, sua vida será um mar de limitações. Na verdade, não terá sentido algum, pois satisfazer os desejos da carne não é o objetivo final do homem verdadeiro. Sendo o homem espírito, o anseio que clama satisfação dentro de toda e qualquer pessoa é elevar-se espiritualmente. Quando há dedicação sincera no sentido de satisfazer os reais anseios da alma, aqueles que brotam do fundo da consciência, a vida adquire outro significado. Não há peso na consciência resultante da busca ilusória de coisas efêmeras, mas uma sensação da missão verdadeira a que foi enviado. Não é difícil distinguir essa sensação. Quando trabalhamos em prol de uma causa comum, que visa o todo, sentimos uma alegria infinita, que não tem preço; somos realmente felizes vendo o outro feliz pelo trabalho que realizamos. Nesse caso o que conta não é o tipo de trabalho ou se houve ou não a remuneração, mas o objetivo final que foi satisfazer o anseio do todo com a nossa contribuição, posto que, afinal, somos extensão dele e ele está em nós.
É por isso que o bem material acumulado sem um objetivo supremo é causa de conflito, pois está calcado no egoísmo. A disputa acirrada entre membros de uma mesma família por uma herança é um exemplo típico da cegueira causada pelo materialismo. O apego excessivo à matéria é causa de sofrimentos. O desprendimento das coisas materiais indica espírito evoluído. Para adquirir esse desprendimento é preciso compreender que a matéria em si é o nada, que ela é transitória e efêmera. Tudo que surge e desaparece de acordo com as circunstâncias não possui existência verdadeira; não passa de uma ilusão.
A Existência ilusória
Desde que nasce o homem já traz, incrustada em sua alma, uma carga de pecado, própria da consciência de todos os seus antepassados e é exatamente esta a razão de todo o sofrimento do mundo. O hábito da ilusão afeta a todo e qualquer ser humano, mas não afeta a existência verdadeira por não fazer parte dela. As religiões que falam no pecado, abominando-o e dando a ele um caráter mais real do que aparenta inflige terror em seus seguidores. Tudo aquilo que reconhecemos como verdadeiramente existente acaba por influenciar nossa vida porque é assim que funciona o subconsciente. Não é porque o pecado existe e cessará de existir se deixarmos de acreditar nele. É uma questão de limparmos nossa lente mental em relação a pensar que existe aquilo que realmente inexiste. Se Cristo extinguiu o pecado e deu o seu corpo à cruz para que todo o pecado da humanidade morresse junto com ele, por que então achar que o homem continua sendo um pecador? É uma questão de encarar os fatos como eles realmente são e não como se apresentam aos nossos olhos iludidos. Iludir-se é achar que existe quilo que não existe na realidade e isto não se refere ao pecado exclusivamente, mas a tudo na vida.
Muitos deixam de pertencer a uma religião em função dos exageros e dos erros nas pregações. Há como um fanatismo, uma imposição exacerbada de fatos e de valores que, com frequência, não correspondem à verdade. Por trás da exposição da palavra se encontra o desejo egoístico de cooptar adeptos sem consultá-los sobre seus pontos de vista; o que querem é aumentar o rebanho, pois isto significa lucro e projeção. Nas reuniões mostram a palavra, que expõe, de fato, as verdades da vida, mas tropeçam nas interpretações, querendo verter para a sua classe o sedento de sabedoria. É por isso que vemos aos montes religiosos cegos, aferrados ao que proclamam seus líderes, incapazes de manifestar uma opinião própria a respeito da fé ou mesmo da fé que professam; eles são levados a repetir, acreditar e seguir ponto por ponto aquilo que lhes bombardearam os seus dirigentes. Não que isto seja de todo errado, mas induz ao fanatismo e, não raro, ao medo. O homem possui o livre arbítrio para sua auto conduta. O mais indispensável para uma vivência próspera e uma mente saudável é ver-se livre da ilusão. Dor e prazer são os dois opostos da trilha humana.
Estamos sempre entre um e outro e, na maioria das vezes, iludidos. Por mais delicioso que seja um alimento não conseguiremos saboreá-lo além de certo limite sem o risco de passar mal; ou seja, de ver o prazer ser transformado em sofrimento. Este é apenas um exemplo. A compreensão desse ponto e a atitude em praticá-lo resultam no verdadeiro prazer de viver porque dá noção de limites, desperta o sentimento de gratidão pela consciência do equilíbrio.
De um modo geral, a procura por felicidade resume - se em adquirir bens e estabilidade. Há os que se suicidam ao perderem suas fortunas, os que matam e morrem pela fortuna do outro e os que caem em doenças e desgraças porque perderam tudo o que tinham. O conceito básico na mente de qualquer um que se encaixa no perfil citado acima é de que a vida é material e a morte tudo leva porque é o fim de tudo. A crença na existência da matéria, que é ilusória superou a consciência da vida espiritual e da real natureza do homem, que é espírito. Por ver felicidade única e exclusivamente na aquisição e no acúmulo de bens materiais, chega a ser óbvio que o desaparecimento destes significará o desaparecimento da felicidade. No entanto, estavam dominados por uma felicidade aparente, produto da ilusão do materialismo.
Todo ensino moral ou mesmo religioso que possui por base não mais do que uma natureza curricular tende a ser enfadonho se não estiver alicerçado na verdade universal de que a natureza do homem é espírito. Essa consciência precisa ser despertada na criança já nos seus primeiros anos de estudo e, além disso, fomentada pelo exemplo dos seus superiores a que siga adiante com afinco na busca espiritual, pautando seus estudos e sua carreira nesse conceito de vida. Dessa forma surgirão países realmente vigorosos e indestrutíveis porque indestrutíveis serão seus habitantes.
Chega ser espantoso o fato de não haver ensino religioso em nossas escolas e mais espantoso ainda a retirada dessa matéria do currículo escolar. Isto prova a propensão do homem ao materialismo. O alvo de todo estudo não passa então do acúmulo de conhecimentos práticos para se ganhar dinheiro. O jovem já deixa os bancos escolares imbuído desse propósito. Não é de estranhar a procura frenética por profissões que ofereçam as maiores vantagens salariais, secundadas por aquelas que realmente brotam do interior do afeiçoado por corresponderem aos anseios deste. Então isto faz o mundo ser o que é; o que é natural, pois somos o resultado dos nossos pensamentos e de nossas convicções.
As empresas acolhem os mais capacitados tecnicamente. Isto não deixa de ser positivo para a evolução econômica, mas imagina em que mundo não viveríamos se tivéssemos como objetivo uma base espiritual firme e inabalável. Seria juntar o açúcar com o mel e a sociedade compor-se-ia de seres felizes e realizados em sua totalidade, pois desapareceriam todas as tragédias e poderíamos considerar o planeta uma estação paradisíaca. É alarmante a gama de doenças incuráveis que tem assolado o mundo em todas as épocas; extinguem-se ou controlam-se umas e outras ainda mais graves e perniciosas surgem, quando não recidivam as que foram temporariamente dominadas. Que prova maior pode existir contra este fato do que a insistência do homem em tentar resolver tudo de forma calculista e material?