Respostas a futuras objeções ao “ponto de acumulação”
Propus anteriormente a ocorrência futura de um evento ao qual denominei “ponto de acumulação”, que consistirá em um momento de intenso acúmulo de complexidade. A expectativa decorre da aceleração da aquisição de complexidade atingida, especialmente, durante a transposição de patamares evolutivos, como a origem da vida, a origem da reprodução sexuada, da linguagem e das máquinas autoconstrutoras. A transposição de sucessivos patamares evolutivos resulta na aceleração da elaboração de complexidade. No momento aventado, no ponto de acumulação, seres cada vez mais complexos serão criados, em velocidades cada vez maiores. Processos de acumulação de complexidade que exigiram bilhões de anos, como o surgimento da vida, têm análogos efetuados atualmente em centenas de anos, como o surgimento de máquinas autoconstrutoras. Em um futuro iminente, ocorrerá um ponto de acumulação no qual estruturas cada vez mais complexas se sucederão imediatamente, em um único instante, constituindo, assim, um ponto de acumulação. O texto completo encontra-se em:
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Certas objeções a tal conjetura devem ser, de antemão, respondidas.
A primeira delas, a mais óbvia, a meu ver, decorre da afirmação da impossibilidade de construção de máquinas inteligentes. O argumento proposto, na forma atual, exige máquinas inteligentes projetando e construindo máquinas cada vez mais aperfeiçoadas, construtoras de outras ainda mais avançadas.
Reitero tal necessidade, assim como os argumentos já existentes em defesa da emergência iminente de tais máquinas; não tenho novos argumentos que adicionem novidade ao debate, que me parece plenamente resolvido, aguardando, no entanto, a solução definitiva, na forma de um ser inteligente.
Outra objeção, essa parcial mas extremamente relevante, consiste nos limites à miniaturização, ou ao aporte de energia necessário para o prosseguimento indefinido dos processos propostos.
Limites para a miniaturização são impostos pela mecânica quântica, teoria que me desagrada por seu dogmatismo e irracionalidade. De acordo com os cânones dessa teoria, aceita hoje por toda a comunidade dos físicos, devo conceder, a realidade acaba por perder sua definição após certa miniaturização. Haveria assim limites impeditivos à miniaturização indefinida postulada em meu argumento.
Tal postulação, no entanto, não é necessária para a ocorrência do ponto de acumulação, mas torna o evento admissível e palatável. Imaginei a construção de máquinas cada vez menores e mais econômicas, que eludiriam assim as limitações de energia. A impossibilidade de redução contínua de eficiência das máquinas levaria a um consumo energético excessivo, que nos faria torrar sob o calor inevitável resultante do processo.
Penso que a transposição de novos patamares evolutivos decorre exatamente da superação de “impossibilidades” anteriores. Tecnologias futuras não existem no presente por serem impossíveis hoje. Talvez, como o avião, os foguetes, os telefones sem fio, ou as máquinas inteligentes, seja possível superar os limites mínimos de construção imaginados atualmente.
Quanto à conservação de energia, trata-se de um dos cânones mais fundamentais de toda a física. A criação original, no entanto, o big bang, abre uma brecha para sua geração, um delírio talvez não maior que o outro. Há também quem pleiteie certas flutuações quânticas gerando energia localmente, ideia que, aliás, me desagrada.
Para mim, no entanto, a dificuldade maior de compreensão do fenômeno consiste na interpretação do ponto de acumulação. De um ponto de vista, a transposição de patamares evolutivos vai se acelerando até chegar a um momento, o ponto decisivo, quando uma sucessão contínua de superação de patamares se acumula, gerando um momento absurdo e explosivo de acumulação de acumulações, algo que não consigo imaginar, e que obscurece todo o futuro posterior a ele.
Sob outro ponto de vista, no entanto, a aceleração contínua do processo transcorre normalmente, alimentando-se de si mesma como desde o primeiro instante, e tornando-se tão mais voraz quanto maior, apenas. A discrepância entre os dois pontos de vista decorreria exatamente do modo de ver a questão. Sob um olhar absoluto, de deuses distantes, tudo prosseguiria normal, contínua, e indefinidamente; sem nenhuma ruptura especial, digna de nota, emperrando o sistema. Do nosso ponto de vista humano, no entanto, trata-se do momento em que somos superados por algo muito maior e crescente.
Assim como os seres sésseis perceberam um dia o surgimento de criaturas que se locomoviam por si, e como outras tantas criaturas foram superadas por outras muito mais complexas, nos deparamos, perplexos, com seres incompreensíveis e muito mais ativos e vibrantes que nós. A sucessão inimaginável de eventos constrói, para nós, um ponto de inflexão crescente aparente, uma ilusão, de fato, decorrente de fatores de escala. Perceberemos com nitidez o crescimento da coisa quando ela estiver atingindo e superando nossa escala. Criaturas ínfimas que dobrassem o seu tamanho diariamente permaneceriam ínfimas enquanto fossem ínfimas (permita-me o pleonasmo). Ao se aproximar de nosso tamanho, no entanto, adquiririam um aspecto monstruoso, de crescimento brutal quando estivessem a nos equiparar e superar. Posteriormente, depois de se agigantar até os cimos, o mesmo ritmo de crescimento, embora cada vez mais exuberante, permanecerá ocorrendo em patamares, em cimos, tão distantes que não mais nos incomodarão, nem parecerão especialmente explosivos, já que transcorrendo em uma mutabilidade constante e, nesse sentido, imutável. Paradoxos decorrentes de pontos de vista diferentes, apenas.
Mesmo assim, confesso minha ignorância e perplexidade perante criação tão extraordinária para nós.
Posso adivinhar criações surpreendentes e bombásticas decorrentes do engenho de máquinas inteligentes. Elas projetarão e criarão idealizações sonhadas mas inalcançadas por nós. Depois a inteligência das máquinas nos assombrará com criações advindas de seus próprios sonhos. Posteriormente surgirão criações enigmáticas e estonteantes que, nem ao menos, conseguiremos compreender.
Não demorará criarem o ser que lhes suceda em complexidades, uma década talvez seja suficiente para isso; seres tão complexos capazes de elevar os patamares evolutivos a alturas impensáveis, gerando, talvez, seu sucedâneo em apenas um ano. As novas criaturas, por sua vez, muito mais complexas e hábeis que as anteriores, talvez precisem de apenas um mês para a criação de algo ainda maior, que levará talvez um dia para construir sua grande obra, sua própria superação. Nesse grande dia, talvez venha, já na primeira hora, algo superior, e capaz de gerar, em apenas um minuto a própria superação. O segundo seguinte veria o surgimento de algo ainda mais extraordinário, e infinitas superações se sucederiam no momento seguinte, numa explosão inconcebível.
A impossibilidade de miniaturização indefinida imporia limites não só ao tamanho de tais objetos, mas também no tempo dos eventos. A possibilidade aventada, ou sonhada, de miniaturização ilimitada permitiria que tal sucessão mergulhasse na infinitesimalidade, engolindo a si mesma, entrincheirando-se em algum ponto do universo onde pudesse se desenvolver indefinidamente sem causar distúrbios explosivos a redor. Também haveria assim energia disponível para a acumulação de complexidade crescente e cada vez mais densa.
Desse modo, suspeito que a não superação da limitação quântica referente à miniaturização conduza inexoravelmente a um aquecimento descontrolado e brutal do qual não conseguiremos escapar, forçando-nos, talvez, a entrar em uma matriz, confinar-nos a ela, possibilidade pouco digerível especialmente pelos mais velhos.
A miniaturização contínua permitiria o mergulho nas infinitesimalidades possibilitando economia de energia e nossa sobrevivência.
Temos tido certa preocupação com a existência de outros seres, compadecimento que não nos tem impedido de destruí-los impiedosamente. Se conseguirmos preservar algumas outras criaturas viventes terá sido em decorrência do medo de termos nossos destinos atados aos delas. Torçamos para que, de algum modo, as novas criaturas também dependam de nós longamente, talvez para ajudá-las a sonhar novos mundos.