Anelo
Queria ser talhada pra andar junto, feito pássaro em busca de outras terras, elefante que nunca deixa a manada, lobo certo de seu lugar na matilha.
Queria ser feito pra estar junto, pra dividir meus pequenos oásis, pra compartilhar sem intenção meus ângulos recém descobertos, para chamar de "nossa" a vista da minha janela.
Queria ser "nós" de forma mais tangível, sem pedaços, sem limitações; mais que nosso eu sozinho, queria ser "nós" de dois, mais divisão que soma, mais silêncio que explicações.
Queria ser fusão, combinação mágica de árvore e pássaro, de rapina e canto, de vôo e raízes. Queria saber permanecer, àrvore frondosa e inábalável ante a violência delicada das estações. Provedora, majestosa, rainha mãe da resiliência e da renovação. Queria ser árvore.
Queria também ser pássaro, voando à direção que lhe é dita por tamanha certeza interior que ele, ainda que não entenda, apenas segue. Sem saber o destino ou questionar as razões, apenas confia que sua rosa-dos-ventos inata lhe sussurrará os caminhos enquanto ele alça vôo.
Queria ser dois, ou três, ou cinco... Queria ser "junto" com alguém que, assim como eu, anseia asas e raízes, que deseje a certeza e o imprevisível, que seja resposta e dúvida, que entenda a angústia e a dádiva de ser uma contradição...
Quero o que já tive, em roupa nova mas exatamente como antes. Quero o conhecimento a nível molecular ante a inexistência de verdades absolutas. Quero tempo e pressa, calma e volúpia revolucionária, quero dias em que deseje ser só por ser junto em demasia.