O Senhor...
...Com milhares de flores entre as mãos, me perco sem saber para quem entregar. Afogando aos poucos em um mar de luzes nem minha própria direção consigo enxergar.
Sentindo falta de algo idealizado, chorando por uma triste caminhada, fecho minhas mãos gélidas e trêmulas, e não tenho uma outra para segurar.
Absorvido por um sentimento inexplicável, estou me dissolvendo no simples ar que antes me dava a vida e agora antecipa cada vez mais a hora de desabar. De olhos fechados eu vejo o rosto de um anjo, talvez seja o rosto disto que sinto e não sei explicar, um rosto cadavérico que me psa a sensação de ser mais um anjo da morte que um anjo que veio para me ajudar.
Ele estende suas mãos e eu não sei como consigo vê-lo, as luzes continuam a me cegar e ele insiste em querer me guiar, com traços femininos este anjo coloca sua mão em meu coração e me ensina que o amor não é egoísta, me ensina que ele apenas deve fortalecer nem que seja para dar força à própria solidão. Ele me disse também que o amor é solitário, que quem ama de verdade ama o que não existe mais e completou dizendo que damos o real valor depois da perda, da derrota para si mesmo e para o orgulho.
Este anjo de traços femininos não me é estranho, lembra o único anjo que eu tinha visto até hoje. Um anjo que apareceu na minha infância, um anjo que me disse: “
- A partir deste dia você irá perder a sua pureza, perderá sua eterna felicidade a partir deste dia você deixará de ser uma criança.
Depois deste dia eu achei que aquele anjo estivesse louco, achei que aquele anjo fosse a minha imaginação ou até mesmo um subconsciente que já sentia saudades das amizades perfeitas e do sentimento sobre os próprios pais, que eram antes como super-heróis.
Por quê não confiar neste anjo agora, se aquele acertou quando eu achava que ele estava envolvido por sentimentos bobos de nostalgia?
Talvez eu confie nele e lhe dê a mão, mas para onde ele me levará? Ele ainda me assusta...
Guiando-me pela humanidade, foi me apontando lares destruídos, me apontando a infelicidade transparente e apontava também os danos que existem no mundo por as pessoas não saberem o que realmente é o amor.
Eu lhe perguntei se um dia eu esqueceria o amor, e ele me respondeu que o amor não pode ser esquecido porque não é lembrado, ele simplesmente existe como existe a raiva como existe o desprezo assim como também existe o próprio ser humano.
O anjo continuou palestrando coisas simples que a mais ignorante das pessoas deveria saber, ele falou que não existem sete pecados capitais porque o verdadeiro pecado capital é o não fazer, é o não sentir o isolar-se do mundo com muito medo de sofrer.
- Mas que estranho, se o amor é solitário por que não podemos nos isolar? – -eu perguntei com uma petulância de costumeira-
E ele com um sorriso como se já esperasse que eu fizesse esta pergunta me concluiu:
Uma pessoa que ama de verdade e não espera nada em troca nunca vai ser só como realmente se sente, ela terá sempre em sua companhia o seu amor por tudo e por todos e viverá junto de sua própria felicidade e sua realização, por que o que desejamos sempre voltará para nós e disse que é chamada de força do pensamento e da realização.
Já a pessoa que se isola poderá sentir-se bem, pois seu egoísmo estará afagado e ela não precisará partilhar de nada com ninguém, mas ela não amará nem a si mesma e morrerá de tristeza uma tristeza que é na verdade a falta de sentimentos quentes que preenchem o corpo e estimulam as pessoas a poder acordar no dia seguinte.
Com uma última pergunta eu me despedi do anjo e vi suas costas aladas sumirem ao abrir dos meus olhos, e que surpresa esta; eu estava dormindo e já passavam das 3 horas da tarde.
Hoje depois de algumas décadas de busca atrás do verdadeiro amor ainda me falta muito, mas consigo ao menos compreender a última resposta daquele sábio anjo. Como se tivesse acontecido ontem eu me recordo do sonho que perpetuei na minha memória aquelas lindas palavras.
- "Como pode você um anjo com este enorme conhecimento do que é o amor ter uma aparência tão cadavérica e assustadora?”"
E ele respondeu:
- "Eu não sou um anjo, e também não sou sábio; sou apenas uma experiência destinada a viver vagando sozinho por todo o mundo e assim como o preto é a ausência de cores eu sou praticamente a ausência de sentimentos. Esta aparência, este rosto é tudo o que eu tenho. Você foi o sábio entre nós, quando aceitou este rosto horrível como a única coisa que eu poderia lhe oferecer e aceitou que eu pudesse ao menos olhar dentro dos seus olhos. E eu pude lhe retribuir da única forma que eu tinha, que era passar a você o que eu aprendi em toda esta minha eternidade de isolamento.
Você pode me perguntar porque eu não morri, não posso morrer porque não conheço a vida. E esta aparência é a expressão do que sou.
Se isto ainda lhe importar muito prazer, meu nome é Senhor da Tristeza”.