Jirimia profecia?
Estava selada. E com meus dois olhos e sete anos, testemunhei, abismado, sua execução. Fê-la com maestria, como lhe soía, o dono do açougue, dito Jirimia.
Com o animal amarrado junto à uma árvore, Jirimia chegou com um machado à mão, com o olho ao invés da lâmina voltado para a frente, e, impenitente, desferiu o golpe na cabeça da bichinha. Foi aquele som oco, choco, um espouco bem rouco.
Ela só tremeu, menos até que tremi eu. Aí, largado o machado e de posse dum punhal alongado o Jirimia, inda na abordagem frontal, como num passo de balé, o enterrou no peito do animal que não esboçou nenhuma reação, senão cair ao chão.
Ato contínuo, o afro-moço do Isidoro, assistente executor, deu - ou simulou - uma mamada nas tetas da vaca, e deu lugar ao mestre Jirimia, agora com uma faca que até reluzia, riscar o seu couro da parte frontal do pescoço até a extremidade posterior da paciente jacente, e começar a descourá-la. Coisa duns poucos minutos tava aquele bichão vermelho inerte, pronto a ser esquartejado.
Já não me lembra agora se foi daquela peça que levei pra casa, numa travessa esmaltada, a fatia de fígado que comprei. O que sei foi que no caminho - que era até bem curtinho - um cachorrão do Nélson, quase nosso vizinho - me abordou de forma pouco cavalheiresca atrás de coisa fresca. Nada levou, a não ser o susto que me pregou e pelo chão me projetou. O fígado, empoeirado, se lhe escapou. E foi o Nélson que não deixou. E enquanto com mercúrio me medicou, da morte da vaca não falou. Mas de estumar seu til foi que me advertiu. Mundo vil...