A COMOÇÃO NO LEITOR

O texto prosaico não é de minha predileção. Gosto mais dos poemas, que inclusive sempre me parecem de mais difícil composição e urdidura, daí o desafio, mesmo que aparentemente pareça o contrário. Porque a maioria dos pretensos poetas fica apenas no intuitivo – na escrita automática – e não chega ao segundo momento de criação, a transpiração revisional, aquela que dá o formato definitivo ao poema e quase que invariavelmente o torna esteticamente melhor em forma e conteúdo. Porém, esta observação do Belo só se dá quando o autor diminui o egoico e deixa de ‘babar’ sobre a peça criada num relance, embevecido pelo poder da criação artística. Para quem está vivendo o processo das descobertas e vivenciando a novidade que o poema representa no seu espiritual, o exercício da inteligência parece-me tarefa muito difícil de ocorrer. O que efetivamente percorre o corpo autoral é a emoção. E curiosamente é esta que leva o receptor a um estado de espírito diferenciado, porque poema sem a comoção do leitor é obra que não logrou atingir o objetivo. A rigor, a esta racionalmente nem o criador percebe ou vislumbra – já que a emoção corre à margem da intelecção – mesmo que ele a deseje no outro, pegando-o de jeito, deixando o leitor embasbacado, por vezes. Nos iniciantes, em regra, o poema não sai dos estritos limites do centralismo egoístico e o leitor inexiste para o construtor da peça. Só depois de se sentir à vontade nos territórios da criação é que o autor vai pensar e talvez reconhecer que a peça poética só existirá se perfizer o caminho da cabeça do autor para o terreiro intelectivo-emocional de seu receptor. A comoção é o ferrete com que o poema se tatua no espiritual de quem o lê e logo acredita piamente que é o seu possuidor. Como se fora dono dele definitivamente.

– Do livro O CAPITAL DAS HORAS, 2014/15.

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