observando Gaia

E no deslizar das pálpebras, em intraduzível permanência interior, sou eu quem observo o movimento intimo das coisas. Não se pode prescrever como receita o inusitado caminho da alma, embora se possa enchê-lo de trevos e esperar a sorte lhe surpreender no caminho. Do caule, do espinho e da flor vai se consolidando a existência, aportando as estações dos sentimentos em afetações ou conquistas diárias. A sabedoria nos cabe em respirações profundas no conter sensorial do mundo e das histórias escritas sobre o cardíaco.

Eu te observo, e vejo a chuva agora, o manto verde é a acolhida, absorvendo das brumas o tempo passado, o tempo presente e o tempo futuro. O pássaro não voa com as asas de chumbo e os felinos miadores são os maiores consumidores da melancolia. Tento explicar-te meus sonhos, mas a realidade assinala que o surreal é um devaneio como o vento que sopra estas palavras. A ruptura do ninho das formigas passa a ser motivo de tese elucidatória dos motivos e dos momentos, de toda a vida celular e espiritual do ser. É difícil descrever a aniquilação de uma estrutura forjada a vapor, como as lesões da carne elas também deixam marcas.

No sorrir para todas as manhãs, sempre haverá uma renovação, uma esperança, um novo céu sobre nossas cabeças. Descrever todas estas coisas que eu vejo não é saber delas a essência, nem sempre eu sei onde está a chave para abrir as portas, ou mesmo o controle da vida. No encurvamento de todas as palavras ditas e não ditas, eu apenas consigo ver as retas de ligação entre o beija-flor e a flor. Entre o sublime e o grotesco existe a dobra que oculta a minha visão ainda amadora sobre o sentir. Eu percebo que tudo aqui tem a essência de algo muito novo, algo que transpira desdobramentos de algo muito antigo.

Olhar-te é descobrir-me parte do teu oculto pensamento verde, é saber-me existir no teu transpirar de forças raras, acolhendo-me ao ventre que eu tanto amo, na plenitude de horas urgidas pelo sorrir e pela ternura sincera. Sou parte de ti, ave emplumada que ensaia voo distante, alimentando-me de tuas outras vidas, minúsculas e grandiosas fontes de renovação. Sempre haverá um recanto teu em que eu habite no glorioso renascer de nossas vidas, de nossas verdes vidas.

(30 de abril de 2012)