Sobre economias reais e bolhas
Pode-se construir uma fábrica: erige-se um prédio, contratam-se funcionários, produz-se algum bem. Tudo isso é real.
Pode-se, em seguida, colocar essa fábrica à venda sob a forma de ações. Os acionistas potenciais nada entendem do ramo, compram ações diversificadas, de bancos, indústrias, companhias petrolíferas, baseados apenas na estimativa de seus valores de compra e venda.
A entrada de uma companhia no mercado acionário é um grande feito que tende a valorizá-la imensamente; assim, se uma companhia vale, digamos, 1 milhão, será colocada à venda no mercado acionário por um valor que corresponde a algo como 10 milhões, numa valorização astronômica imediata, verdadeira mágica!
Note que o valor de uma companhia comum, a padaria da esquina, por exemplo, é estabelecido com base em indicadores reais, no valor patrimonial da empresa, em sua produção e seus lucros. O valor de uma ação, no entanto, é dado, fundamentalmente, por expectativas futuras desse mesmo valor, ou seja, se os acionistas supõem, por qualquer razão, que determinada ação será valorizada eles tenderão a comprar essa ação, elevando o seu preço e justificando assim a própria crença. Se supõem que determinada ação tende a baixar, tratarão de tentar vendê-la. O aumento da oferta reduzirá o preço, conforme a expectativa. Desse modo, o mercado acionário alimenta-se de si mesmo, de seus próprios sonhos, trata-se de uma imensa bolha. Exposto da maneira acima, o mercado acionário se assemelha a um grande golpe: vendem-se ilusões. Isso é um fato, mas como as ilusões podem ser revendidas com lucro todos compactuam com o esquema.
Mas existe também o lado mágico e sedutor da coisa. Pode-se criar, do modo acima, uma imensa fortuna do nada! Verdadeira mágica! Note que as companhias colocadas no mercado acionário podem se valorizar em um ritmo impensável de outra maneira, na velocidade de um sonho.
Assim, se uma companhia avaliada em 1 milhão é posta à venda no mercado acionário por 10 milhões caso haja uma expectativa de valorização dessa ação, seu valor poderá chegar a 100 milhões. Nesse caso, a reinversão de uma quantia residual desse valor, apenas 1% dele, será suficiente para a construção de uma nova companhia semelhante à primeira. Ou seja, magicamente, uma companhia de 1 milhão estaria valendo 100 milhões e já teria gerado outra similar. A expectativa de que a magia continue funcionando pode injetar ainda mais combustível no processo, aumentando mais e mais o valor das ações, tornando-as cada vez mais lucrativas e desejáveis, realimentando o processo de criação de novas empresas e fomentando o crescimento da economia real. Os sonhos, de fato, interferem no mundo.
A magia descrita acima impulsionou todas as economias desenvolvidas, gerou inúmeros milionários. Trata-se, no entanto, de uma grande bolha. Os valores atribuídos às companhias, perdem a vinculação com o mundo real, assemelham-se a um balde de espuma. Mas a mágica é sedutora e lucrativa.
Por razões diversas, algumas companhias vão se tornando famosas. Um determinado fabricante de tênis, por exemplo, pode alcançar uma posição vistosa, e ter seus produtos cobiçados pelos consumidores. Desejosos dos produtos dessa companhia, passarão a comprar mais deles, aumentando seu preço e sua produção. O preço de seus produtos, então, desvincula-se do seu custo de produção, talvez os gastos da companhia se dirijam mais à propaganda que à produção. A companhia pode se transformar então em uma companhia de marketing; seus produtos terão um custo real irrisório, parcela ínfima do preço.
Tem sido lucrativo para as empresas cuidar apenas dessa etapa, entrega-se a produção para um terceiro, ao final do processo marca-se o produto e aufere-se os lucros, magia encantadora. Tendo adquirido consumidores fieis e cobiçosos de seus produtos, o "fabricante" precisa apenas cuidar para que sua marca continue a ser cobiçada. Tem sido assim, os fabricantes entregam a produção para outros, frequentemente na Ásia, compram deles seu próprio produto, atribuem-lhe sua marca e auferem o lucro, dinheiro fácil. Tem sido assim, os asiáticos trabalhando, produzindo os bens, americanos e europeus cuidando das marcas e recolhendo os lucros.
Os grandes fabricantes foram se tornando, assim, grandes bolhas, extremamente lucrativas, mas vazias. Tornaram-se fábricas de lucro, mas vazias. Por que não deixar o trabalho pesado para outros e se concentrar apenas na parte lucrativa? Foram se tornando imensas bolhas, enquanto transferiam as fábricas, a produção real, para a Ásia. Hoje a economia real está quase toda lá, na Ásia. A maior parte dos lucros ainda está fora de lá, nas bolhas.
Por que os chineses dominarão o mundo? Porque são cultos.
Ao levar as fábricas para a Ásia tiveram que ensinar os asiáticos a fazer os produtos. Por serem cultos, não só aprenderam, como aprimoraram produção e produtos. As marcas chinesas ainda têm pouco valor; são produtos tão bons, ou melhores, que os que eles entregam para as marcas estrangeiras; quando isso for descoberto pelos consumidores ocidentais, mais uma bolha desvanecerá.
Mas afinal, o que são as bolhas e por que elas existem? As bolhas são ilusões trazidas do mundo dos sonhos para o mundo real. São mágicas financeiras capazes de gerar fortunas instantaneamente; são feitas de sonhos. Sustentam-se apenas em desejos, em crenças. Acredite em uma bolha e ela passa a existir, desacredite e ela desvanece. Acredite no valor das ações, e elas serão valorizadas; acredite no valor de uma marca... mas a descrença tem o impacto inverso; todo o dinheiro existente no mundo é apenas um número.
O mundo real, ao contrário, independe de nossas crenças; sempre é bom lembrar que ele existe.
As bolhas existem e têm dominado nosso mundo porque são extraordinariamente lucrativas. Bolos imensos, inundados de fermento têm dominado o cenário mundial, e encoberto nossa visão. Muito em breve o mundo real gritará, clamando por sua existência, será a virada da mesa. As bolhas então explodirão, uma a uma, e um novo mundo se descobrirá. Vivemos um momento de enorme efervescência, os próximos anos descortinarão as maiores revoluções de toda a história. Nossas crenças se renovarão, serão outras. Nosso mundo mudará drasticamente, será como acordar de um sonho.