Tardes de não-Lindóia

Ar de tarde é, sem alarde, o que mais arde. E era nas tardes dominicais que, passadas a eventual ida missa - que não se celebrava assim tão religiosamente, por falta de um Cura fixo; a conferência dos vicentinos; o almoço, que aos domingos perdia a condição singela de bóia pra virar almoço, tout court; e, alguma fazeção de quitanda ao forno de quintal, o povo ia pra rua.

Ruar, bater papo e pernas nas moas ao ar ou ao bar. Se não descansar, ao menos zanzar, até se cansar, naquele dia que o Senhor reservara para o seu próprio repouso - e o nosso burburinho.

Aquela estraladeira dos teares da fábrica se calava de repente. E já era um bem que valia por cem. A algazarra da moçada, que em seu lugar se fazia, no entanto, do rompante de chaminé, mal chegava ao pé.

Em torno campo de futebol, é que juntava a animação. Já na várzea, a parte mais baixa do lugarejo,virava o seu ponto alto. E não era pela bola que a moçada rolava, apesar de que, pelo menos uma vez - vi e contei - o time do Brumado ter aplicado uma sonora surra de 5 a 2 num esquadrão da Ibitira. Memorável goleada, num tempo em que Romário estava mais pra bebê. Ou beabá, ou era mesmo só o Babá?

Mas verdadeiros gols de placa se faziam era em volta do campo,nos barrancos, moitas, nas laterais, ou no rego de trás, via namoricos, que iam da inocente iniciação à devastadora consumação. Mesmo que as bolas teimassem em não entrar, domingo dia era de namorar, interpenetrando-se sol da tarde e paixão que mais arde. O que não dava pra entender era o Mozar, aquele mulato alto, sempre de olho no lance, sem nuance, ficar à volta do campo o tempo inteiro e, da silva, manter-se solteiro.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 18/01/2015
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