O POEMA É EXCLUSIVO DO AUTOR?

Há muitas pessoas que, especialmente nos territórios da net, escrevem qualquer texto e o incensam como fora um exemplar de poema (com Poesia?), somente por estar apresentado formalmente através dos versos. Porém, só isto não basta para que estejamos frente a um espécime lavrado em Poesia. É necessário bem mais do que apenas singelos vocábulos, e, sim, que a palavra (poética) compareça em seu vestido de festa, ou seja, bem apresentada esteticamente, com suas codificações assentadas nas figuras de linguagem, especialmente através das metáforas, de modo a que cause uma sensação de “estranheza” ao poeta-leitor. E assim se perfaz o Novo através dos signos verbais. Em muitos casos, logo nos apercebemos que a "alma poética" ou o “espírito poético” veio à tona e floresceu com destacada amargura fazendo frente à hostilidade com que a vida real se apresentou ao seu autor, no entreato da criação do poema. E a peça nasce carregada desta peçonha que amarfanha o espiritual... Porém, a maledicência, com palavras carregadas de asco e pejorativos dificilmente combina com a natureza do texto poético. A arte se destina a inovar o cânone estético e não a achincalhar o pátio da criação. A diferença entre a arte poética e o pastiche de mau gosto resulta do talento de quem conhece o ofício e sabe que não escreve para si próprio, e sim para um inominado e eventual poeta-leitor. O passivo polo receptor é o destinatário que consumirá ou não a oferta gráfica, plástica ou auditiva. E é exatamente o leitor que vai dizer de sua validade ou não, a ponto de perpetuar-se como proposta estética no seio do idioma.

– Do livro O CAPITAL DAS HORAS, 2014/15.

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