Meios de massificação
Desde que o ser humano se pôs a pensar do ponto de vista filosófico, nunca teve a “manada” a multidão, como aferidora da medida. Malgrado o dito que, “a voz do povo é a voz de Deus”, embora útil a sentença em determinadas situações, isso nem sempre se verifica. “A multidão é ignorante”, diziam filósofos gregos.
Entretanto, o fenômeno moderno dos veículos de comunicação de massa, traz um efeito colateral à comunicação; a massificação. Somos imitadores natos. Quem sabe, faltem parâmetros imitáveis em nosso meio; e isso delegue o espelho às ditas celebridades, que se nos tornam modelos; invariavelmente ancoradas em um dom, um talento, quase nunca, em valores.
Assim, pior que a massificação em si, é a qualidade da massa que se produz. Os vencedores, amiúde, são contados por troféus, conquistas, fama, com ou sem virtudes, bastando seu talento. Esses ícones que a maioria da galera gostaria de ser, são projeções ímpares de indivíduos; contudo, ainda que, involuntariamente, acabam sendo meios de anulação dos demais que os admiram e idolatram, fantasiando nos tais, a perfeição que lhes falta. Muito “seguidores” inclusive brigam com seus ídolos, quando, se decepcionam com essa ou aquela postura.
O indivíduo, como o nome sugere, é indivisível o “átomo” metafísico. Seu potencial, suas características são únicas. A adesão de um assim a outro, posto que talentoso, não obra a realização individual, antes, anulação do ser, a perda do “eu” no coletivo.
Qualquer um que ouse ter uma postura não “ortodoxa” como a Jornalista Raquel Sheherazade, por exemplo, enfrenta duras restrições, afinal, não fala nem pensa como “todo mundo”. Embora não concorde necessariamente com tudo o que ela diz, admiro pessoas que entram no mar e não viram peixe, digo, não se contaminam pelo meio, antes, preservam a individualidade e as opiniões, quer sejam pacíficas, quer, polêmicas.
Mesmo no meio espiritual, muitos acreditam que a Vontade de Deus seja produzir uma “massa” santa. Ora, basta apreciarmos um minuto o que nos cerca para vermos como O Criador ama a diversidade. Aliás, quando Pilatos usou o peso coletivo como argumento contra o Salvador, Ele devolveu a responsabilidade ao indivíduo. “Pilatos respondeu: Porventura sou eu judeu? A tua nação e os principais dos sacerdotes entregaram-te a mim.” “...Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz...” Jo 18; 35 e 37
Isso de diluir responsabilidades funciona nos meios sociais, políticos; ante Deus, não, como disse Paulo: “Porque está escrito: Como eu vivo, diz o Senhor, que todo o joelho se dobrará a mim, toda a língua confessará a Deus. De maneira que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus.” Rom 14; 11 e 12
Até os de fora questionam a diversidade denominacional dos cristãos como se isso fosse prova de confusão, erro. Em Seus dias na Terra o Salvador disse: “Quem não é contra nós é por nós.”
Claro que há muita confusão, heresias no seio do cristianismo; isso advém da mistura de salvos e não salvos, obedientes e rebeldes, nada tendo a ver com nomenclaturas, ou, mesmo método de evangelização. A unidade dos salvos é espiritual. Pertencemos a um mesmo Espírito e somos indivíduos.
Nosso “ícone” não massifica; antes faz crescer, santifica. “Até que todos cheguem à unidade da fé, ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo, para que não sejam mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente.” Ef 4; 13 e 14 Essa unidade, invés de massa, forja adultos espirituais.
Cada cristão conhece a Vontade de Deus para si parcialmente; uns mais, outros menos. A medida de nosso conhecimento é nossa luz; segundo ela, Deus espera que andemos. “Mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os outros e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado.” I Jo 1; 7
Como todo ser vivo tende a crescer, igualmente a luz dos salvos; “Mas a vereda dos justos é como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito.” Prov 4; 18
Alguém disse: “Quando todos pensam o mesmo, ninguém pensa grande coisa.” Se observarmos com atenção os profetas, nunca foram aves de bando, antes, águias solitárias arrostando tempestades.
Embora saibamos que a lisonja faz mais mal que a crítica, a maioria prefere esta, pelo conforto, àquela, dado que é um remédio amargo. De certo modo, é inevitável que estejamos na massa; mas, mesmo estando, podemos não ser massa, como as passas do Panettone. Se, Maria vai com as outras, pelo menos, que as outras saibam pra onde vão.