Os elementos mais marcantes de cada geração
Vou usar conceitos do meio empresarial e midiático diante da ausência do debate geracional nos meios intelectuais de esquerda ou acadêmicos, pelo menos é o que me parece. O interessante é que desde a contracultura e os movimentos estudantis da década de 60 que se pode falar em uma consciência etária e de um conflito de gerações mais intenso, sendo, no entanto, esse debate ainda marginal. Isso se deve a uma série de preconceitos. O fato de se elencar o antagonismo de classe como o prioritário não quer dizer que não se possa abordar outras relações sociais que influenciam a dinâmica social. O stalinismo sempre nutriu RESERVASem relação aos debates sobre gênero, racial/étnico e orientação sexual por acreditar que isso desviaria o foco da análise da luta de classes, o que é totalmente falso. Acredito que o mesmo se aplique ao debate de gerações, que fica restrito a certos meios do movimento que não os tradicionais ou é apropriado pelo capital na construção de uma identidade alternativa a de classe. Na verdade, entender uma geração é entender o "espírito de uma época" e conseguir compreender as mudanças subjetivas decorrentes da luta de classes e do desenvolvimento das forças produtivas que atuam no todo social. Cada geração teve uma marca. A chamada Geração Belle Époque (nascidos de 1920 a 1940) teve como marca a família, a dedicação à família, o trabalho como meio de sustentá-la e a família como meio de realização e grupo social básico. Isso tinha uma importância para a sociedade, tanto num sentido regressivo, porque se tratava da família patriarcal, tradicional, e, portanto, reprodutora do modo de vida burguês, como também num sentido progressivo, como oposição ao Estado e a outras instituições sociais burguesas menos dialéticas e que não permitiam a formação da personalidade forte e autônoma que as contradições da educação familiar permitiam. A Geração dos Baby Boomers (nascidos de 1945 a 1960) teve a política como sua marca, a realização pessoal na coletividade mais ampla, em grupos políticos e em grupos sociais unidos por interesses intelectuais em comum, homens e mulheres da pólis e da participação ativa na sociedade, mais influenciados pelas instituições extra-familiares que os seus pais. A chamada Geração X (nascidos de 1960 a 1980) teve como sua marca o trabalho, a realização profissional, a realização material no mundo burguês, por meio do dinheiro e de uma boa colocação no mercado de trabalho, secundarizando a família em muitos casos e tendo uma postura mais cética em relação à política, talvez tenha sido a geração em que as mulheres foram de forma mais permanente para o mercado de trabalho e não para complementar só a renda da família, mas para ter uma carreira de fato. Deve ter contado com muitos workaholics também. A Geração Y ou Geração do Milênio (nascidos de 1980 a 1999) tem como marca os estudos, é a geração mais bem educada da história, com maior nível de formação, de escolarização e qualificação, mas muitos chegam à fase adulta em plena crise econômica e não se pode dizer que o sucesso profissional será bem a sua marca. A participação política também é muito influenciada por um ressentimento diante das promessas não cumpridas pelo neoliberalismo, talvez isso explique a adesão de muitos ao fascismo, à extrema-direita, porque não são contra o status quo como as gerações dos seus pais e avós, mas contra um estado de coisas que lhes é desfavorável; de qualquer forma, pode ter um potencial positivo se aqueles dessa geração que são herdeiros de uma tradição de luta, seja por relações familiares, seja por experiências concretas de militância ainda na escola ou na universidade, aderindo a uma visão de mundo mais progressista, conseguirem que essa visão de mundo prevaleça por meio de uma ação consciente e firme e de um debate teórico e político consistente. Ainda assim, os estudos são uma marca de todos e talvez isso tenha uma grande importância cultural para o futuro, não tanto num sentido econômico, mas no sentido de um novo impulso na produção do conhecimento e de novas teorias e respostas originais para os problemas do mundo atual. A chamada Geração Z (dos nascidos de 2000 em diante) não pode ser bem avaliada ainda, mas vem esboçando como sua marca a diversão, dando uma centralidade ao prazer, à gratificação constante. Essa é uma tendência que já vem se desenhando desde os baby boomers e que se expressou de forma bastante intensa na geração do milênio, educada diretamente pela sociedade, já que a família sem pai se tornou praticamente sem mãe também no sentido de que os pais se tornaram praticamente nulos na formação moral e intelectual de seus filhos, perdendo sua autoridade, sendo o processo de socialização prioritariamente por meio da escola e da televisão. Se a diversão se afirmar como o valor principal e o centro da atividade vital dos indivíduos dessa nova geração de jovens, isso representará a vitória da moral hedonista e do consumismo e também um impulso mais acelerado para a catástrofe, para a barbárie, pois, se a moral ascética traz infelicidade para o indivíduo, ao menos ela tem uma importância social tanto para a dominação social, por meio da submissão, quanto para a mudança social, por meio do senso de sacrifício e dever, de responsabilidade e disciplina que moveu muitos dos melhores lutadores contra o nazifascismo no passado, por exemplo. O forte individualismo pode até trazer satisfação pessoal, mas é uma felicidade ilusória, porque essa alegria momentânea se esvai com a degradação social e ambiental do mundo em que se vive. O exemplo de luta e as conquistas políticas, culturais e sociais dos baby boomers e a riqueza produzida pela geração nascida entre 60 e 80 constituíram a sociedade atual. Aqueles da geração Y que hoje se tornam pais e mães recuam na vida profissional, no tempo dedicado ao trabalho, e nos possíveis ganhos que possam vir disso, para se dedicar novamente à família, assim como os nascidos em 20, 30 e 40, mas não é o resgate da família tradicional, mas uma renovação da vida familiar em que pais não são meros provedores, mas tão ativos e parceiros na criação dos filhos quanto as mães, e com a constituição de famílias formadas de diferentes tipos de relações amorosas. Esse é um aspecto muito positivo e se os jovens pais e mães da geração Y não tentarem comprar o amor de seus filhos como muitos pais da geração X fizeram, farão um enorme bem à humanidade com o resgate da família como reserva de resistência ética num mundo de homens e mulheres já plenamente socializados e conectados espiritualmente, intelectualmente, representando uma esperança para a civilização e o progresso.