O Ratinho das Montanhas
A vida é feita de pequenos e singelos detalhes e também de grandes feitos e realizações. Ao longo da nossa trajetória vamos conhecendo pessoas de todos os tipos, algumas mais formais e outras mais excêntricas. Nos tempos de escola conheci um garoto introspectivo de olhar distante e sorriso fácil lá do Campo Bonito que pelo seu jeito e magreza, logo foi apelidado de Ratinho. Seu nome era Ricardo Baltazar, um verdadeiro parceiro para todas as horas! O que me chamava atenção era sua propensão autodidata, sua paixão pela natureza e o desconhecido e a simplicidade com que encarava os desafios. Tinha a personalidade subversiva, rebelde e o espírito livre negando os dogmas e as convenções sociais.
Gostava de viajar e conheceu alguns países de nossa América Latina como o Chile e a Argentina, admirava e era um assíduo leitor dos clássicos da Filosofia Clássica em especial Friedrich Niestzche. Entre suas curtições estava o jogo de xadrez, o surf e principalmente escalar e estar no meio da montanha ou embretado em algum canyon da região. Se destacou como uma das grandes promessas do montanhismo brasileiro com exímia técnica e determinação, conquistando picos na Patagônia como o lendário Fitz Roy, Cerro Torre e Poincenot. Iniciou sua aprendizagem na arte de escalar com Kalu (que coincidentemente veio a falecer fazendo rapel em uma cachoeira nos canyons) esforçando-se nas vias de escalada do Morro do Farol, na Santinha, no Morro das Furnas, no Paredão e na Praia da Guarita na Torre Sul. Era sua sala de aula onde se exercitava e treinava. Mas, sua verdadeira paixão eram os Canyons que compõe os Aparados da Serra Geral, inclusive atuava como guia e resgatista por conhecer a região desde a juventude. Era um professor e mestre do canyonismo e do montanhismo ensinando e influenciando uma geração de atletas e amigos.
Ironicamente, a impetuosa natureza dos canyons pode ser o céu e o inferno... E no lugar que mais amava, Ricardo Baltazar foi encontrado sem vida na última sexta-feira, no curso de um rio, vítima de um acidente de percurso no retorno de uma trilha. Meu amigo descansou, de maneira poética envolvido no útero da Mãe Terra. Deixando um exemplo de simplicidade e desapego diante de um mundo de crises e futilidades sendo um atleta renomado que elevou nossa bandeira nos mais altos cumes. E como ele dizia: “Quando estou em casa sinto falta da montanha, quando estou na montanha não sinto falta de nada...” “Quanto menos, Mais...” “Quanto pior, Melhor”! Aguante Ratinho da Montanha, que agora escala para além das estrelas!
Publicado no Jornal Litoral Norte