Um mundo quase perfeito
Um mundo perfeito, sem corrupção, doenças, fome ou miséria; onde impere a solidariedade, e a cultura da verdadeira solidariedade seja de fato permanente. Desde que o homem se entendeu como tal sobre a Terra sonhou e pensou um mundo assim, sem suas agruras peculiares. Alguns deram até a vida por esse ideal. A história da humanidade está cheia de homens e mulheres que irrigaram a terra com seu sangue por acreditarem que um mundo melhor seria possível.
O sonho ancestral e romântico de um mundo perfeito continua vivo e movendo corações. Louvemos e saudemos em versos e prosas os homens bons da Terra, incluindo os que já se foram e viraram até Santos, pelo legado deixado em seus tempos e que têm servido de base para que esse ideal, embora difícil, não morra jamais.
]Ao redor desse ideal se desenvolveram, e se desenvolvem, ideologias, religiões, dogmas, tratados filosóficos, músicas, ensaios e ficções; sociedades secretas, e ou discretas, comunidades alternativas nas cidades, florestas, vales e montanhas.
Em A intermitência da morte, o português José Saramago imaginou um mundo até sem a morte. Bem atrás, muito lá atrás, em A República, Platão imaginou a cidade de Calípole (cidade bela) e já falava sobre a ordem justa e chegava à conclusão de que a Justiça é preferível à corrupção. Thomas Morus, mais adiante, veio com sua obra prima Utopia, onde pensou uma sociedade quase perfeita. Uma sociedade que, por se tratar de irrealizável com o passar dos anos, transformou a palavra utopia num neologismo sinônimo de projeto irrealizável, fantasia, quimera, delírio; lugar que não existe.
Não custa nada também lembrar que a Bíblia, lá no Gênesis, fala do Paraíso, e no Êxodo, na “Terra Prometida”, onde correria o leite e o mel. O livro menciona ainda o paraíso dos paraísos, o Céu, para onde serão arrebatados os puros e os crentes no Senhor.
Na clássica What a Wonderful World (Que mundo maravilhoso), o americano Louis Armstrong canta um mundo com árvores verdes, rosas e vermelhas florescendo “pra mim e você” e não só para ele. Na mesma canção, o astro americano canta além da partilha, o respeito ao outro, a solidariedade e o amor quando em um dos versos diz que:
As cores do arco-íris, tão bonitas no céu
Estão também nos rostos das pessoas que se vão
Vejo amigos apertando as mãos, dizendo: “como você vai?”
Eles realmente dizem: “eu te amo!”
Sentimentos simples que na visão do artista tornam “o mundo maravilhoso”.
É esse desejo por um mundo, ou uma sociedade perfeita, que tem permeado a história da humanidade até nosso tempo e que durante as gerações ganhou diversos contornos e nomes; gerou guerras e períodos de paz, gerou esperança, produziu e projetou líderes.
Cada um, egoística ou coletivamente, lá no seu íntimo, tem seu ideal de mundo. Um mundo ideal para alguns é o que venha satisfazer suas necessidades e desejos individuais ou de seu grupo, tornando-o “senhor das razões” com todos aos seus pés. Sendo feliz, se é que alguém pode ser inteiramente feliz pensando só na sua seara, o resto que se exploda. São os chamados falsos líderes; ao inverso, temos os verdadeiros líderes, aqueles que põem o outro e a coletividade como metas, como centro de todas as coisas.
Há homens e mulheres, sociedades inteiras que ainda sonham com um mundo perfeito. Eu também sonho. O problema, penso, como diria Carlos Drumond de Andrade, é que no meio do caminho tem uma pedra. Tem uma pedra no meio do caminho. E essa pedra chama-se homem.