QUE LÁSTIMA ATUAR

Que lástima...

Não poder confiar a vida a ninguém!

E no amanhecer fazer-se um para o convívio social,

e à noite,

a sós,

outro ao retomar posse do próprio rosto.

Das poucas vezes em que doei abertamente meu eu noturno,

fizeram de minhas portas abertas motivos de ferir

ou se afastaram temendo minha franqueza.

Que lástima...

Representar papéis superficiais que não me cabem,

tateando ao acaso em um palco escuro armado de máscaras,

vestindo fantasias que me afastam da auto-descoberta e do aperfeiçoamento.

Que lástima...

Saber que ao encerrar o ato da vida a terei vivida em entreatos,

como expectador do ator falso de mim,

canastrão misturando realidade com encenações.

Descobrir-se coadjuvante dos próprios enganos

em papéis superficiais escritos por outros.

Saber da inutilidade de se fazer teatro no cotidiano dos dias,

e retocar diariamente as próprias páginas imperfeitas

reescrevendo sobre as linhas do próprio livro o que se não é.

Ser somente o ator principal e legítimo ao encerrar das cortinas!

Que lástima...