No que acreditamos?

No que acreditamos?

Acredito na racionalidade e para mim é espantoso desvendar as crenças das pessoas em geral. A crença na racionalidade se baseia em convicções simples e inegáveis, compartilhadas por todos até pelos que fingem desacreditar na racionalidade, por exemplo: se você está aí, nesse momento, não está em outro lugar, no mesmo momento, ou seja, você está sempre em um lugar, e apenas em um lugar, em cada instante.

O comentário acima parece ridiculamente trivial e óbvio, no entanto, todas as racionalidades, todos os argumentos racionais são compostos de elementos tão triviais e óbvios quanto os apresentados acima, embora, frequentemente, em conjunto, eles acabem compondo complexidades enigmáticas e de difícil compreensão. Quem compreende, de fato, qualquer argumento racional percebe, no entanto, serem compostos de elementos triviais, indubitáveis. Os que acreditam na razão, nos argumentos racionais, creem, de fato, em cada um desses elementos óbvios e interligados que eventualmente compõem complexidades.

A maioria das pessoas, no entanto, age como crianças, baseando inúmeras de suas ações em crenças completamente absurdas. Isso, provavelmente, ocorre por pura ignorância; incapaz de compreender determinado argumento racional, acaba por admitir uma crença desvairada, completamente absurda, mas tão incompreensível a seus olhos quanto qualquer outra, e, possivelmente, mais simpática que as racionais.

Frequentemente, as pessoas e as crenças racionais nos parecem bem antipáticas; pessoas irracionais, no entanto, apresentam-se muito mais frequentemente de maneiras sedutoras; o motivo da diferença é óbvio: uns deles se respaldam na razão, e isso basta; outros não possuem nenhum embasamento, necessitando de estratagemas escusos, mas sedutores, para conseguir atenção e adesão.

Note, no entanto, que a irracionalidade, quando compreendida e analisada, parece incrivelmente tola; vejamos: ao jogar cartas, muitas pessoas torcem, se esforçam, e evocam preces mágicas e macumbas variadas para que saia a carta de que necessitam; caso alguém já tenha xeretado, indevidamente, a carta a ser comprada, percebe de imediato a inutilidade tola e obtusa de todo o esforço perpetrado para a obtenção da carta desejada. Faça a experiência e verá um espetáculo lamentável e incrivelmente obtuso.

Preces para que chova, acompanhadas, ou não, de danças, se revelarão também bastante idiotas após consultas às fotos de satélites. Analisando-se as fotos, descobre-se facilmente quais preces serão atendidas. Aos olhos de quem compreende qualquer assunto, todas as magias se revelam tolamente infantil. A multidão, a massa, frequentemente parece ter 5 anos de idade.

2 + 2 = 4, isso é sempre assim, decorre da definição desses símbolos. Alguém que tente negar isso parecerá tolo pelo simples fato de que a afirmação é compreendida pelos outros. Se um menino tem duas balas e ganha mais duas, ficará com 4 balas, a menos que perca uma, ou a consuma, ou algo assim; qualquer tentativa de negação por parte da criança se revelará tola. A tolice, nesses casos, só fica oculta para quem não compreende a questão. Todas as tentativas de negar a razão são igualmente tolas aos olhos de quem compreende o que se passa.

A maioria, no entanto, age irracionalmente, baseada apenas no costume, um espanto. Creio que a principal justificativa para as crenças das pessoas não seja a razão, mas o costume; quando confrontadas com possibilidades alternativas perguntam-se: o que as outras pessoas costumam pensar sobre isso? O que costumam fazer? O que costumam achar? Então, se os primeiros erram ao se deparar com determinada decisão, a multidão seguinte tenderá a incorrer no mesmo erro, estúpida e irracionalmente, mas de maneira costumeira, o que não causará estranheza.

Para a maioria, a convicção depede da repetição. Mesmo o maior absurdo, se repetido muitas vezes, por muitos, será aceito com a maior naturalidade. Não há limites nem para a mais obtusa das crenças, para a maioria, tudo é questão de costume. Salve a razão.