Comentando Joaquim Moncks
A AUSÊNCIA NO OUTRO
Texto de Joaquim Moncks
Não esqueças de que a vida corre célere, e a Poesia não deve ser o relato vivo da realidade, e sim a proposta de transfiguração do real para que o seu autor possa encontrar a felicidade não realizada no mundo dos fatos. A farsa é da natureza da arte poética. Nesta musa dos nortes perdidos, a fantasia é a verdade materializada. Pra que chorar o que passou..., diz a canção popular. Olha para o horizonte e toca pra frente, amadinha, porque és muito importante para os teus afetos, e eu sou um deles. Dos que te admiram independente de distâncias físicas e falta do abraço amoroso. Assim, a libido se enfia nos espaços não visíveis, mesmo que se não queira. Logo estaremos juntos para dar risada, beber uns vinhos à memória do que já se foi, curtir a invernia à luz da lareira e saudar o amor diluído nos ladinos e escafedidos afetos. Juntos para nos entregarmos ao vezo inútil de abrir o doce colo maternal para as incompreendidas ausências. Por ora, vai o meu coração confrangido e desejoso de que possas sublimar a perda na voz do vento. Nestes períodos, os enlouquecidos neurônios provocam a momentânea sensação de que a vida não tem sentido, então, oferece o teu rosto ao sol tímido da manhã e procura descobrir que sempre há um novo dia de esperanças. Porque sem o amar dentro da gente tudo é tempestade nos móveis da casa de Deus.
– Do livro O CAPITAL DAS HORAS, 2014.
MEU COMENTÁRIO: Vejam só, eu li este texto, através de uma amiga que curtiu um quadro meu, no Facebook. Cliquei e abri o Recanto das Letras. E, à medida que lia, eu dizia: mas este texto parece ser do Moncks. Fui até o fim, imaginando como alguém poderia escrever parecendo ele. E lá no fim estava o nome do autor: Joaquim Moncks. A identidade de um autor é a sua escrita, no estilo, em tudo! Também fiquei contente comigo mesma, pela minha lucidez em identificá-lo no texto.
Minha Mãe era uma descendente de pai espanhol, e, no batuque, filha de Ogum com Iansã, bastante geniosa, de mínimas letras, mas cultivava todas as artes populares práticas que podia, como a profissão de modista e ainda dotada de expertisse em arte-culinária da Península Hibérica. Ela abria todas as janelas, deixava o vento encanado passar e faxinava a casa, cantando "Para que chorar o que passou... Lamentar perdidas ilusões". Nunca me esquecerei desta canção, que foi citada pelo escritor comentado, num momento em que estou chorando ausências na minha vida, neste planeta. Uma delas é de minha mãe. A ausência que semeou em mim este verso universal que diz, parecendo dar-me a entender que a humanidade é coletiva e se realiza mais como raça humana do que de modo pessoal: "Se o ideal que sempre nos acalentou, renascerá em outros corações" (da mesma canção "Luzes da Ribalta", da citação no texto). Um consolo de que alguém vai viver o que não tive, depois que eu passar? Ou eu mesma viverei, numa futura reencarnação. Os escritos deste autor sempre me instigam. A arte, segundo Selma Nerung (poetisa, grato e saudoso afeto amigo que se escafedeu) é mesmo "o caminho mais curto de coração a coração".