Chovendo vidas fantasmas

Existem aqueles dias que chove aqui fora e tudo soa tão melancólico.

Chegam também os dias que a chuva inunda por dentro e tudo toma uma forma trágica. Abrir as janelas vira um ensaio pra dor.

Mas na correria dos dias não existe espaço pra crises, tragédias, nem dores. Não existe espaço pra nenhum de nós.

Da janela do ônibus, uma vida toda se passa na cabeça de um alguém.

As dores e decepções tomam lugar privilegiado em meio aquele frio.

Lá fora, do outro lado do vidro, a vida corre. Tem pressa. São tantas e tantas vidas que correm e escorrem pelas avenidas. Assim também seguem as lágrimas de alguém por detrás da janela embaçada pela umidade. Na cabeça uma confusão de histórias. Minha, sua, dela, dele, nossa. Histórias tantas. Todas vem e vão, em segundos, deixando rastros. E lá fora? segue exatamente o mesmo ritmo.

A pressa guia os fantasmas sem rumo pela cidade. Incomunicáveis, sem nome, sem face. Os carros continuam a passar por ruas e avenidas. E as almas perdidas continuam se fazendo existir, por ali, por toda parte. Lotam, cada vez mais, o mundo de um enorme vazio.

Lá fora tudo é sempre assim, tão real. Tão sem sentido.

Mas se por alguns minutos a gente abrisse algumas cortinas e olhasse mais de perto, talvez conseguíssemos enxergar um pouco dessa coisa chamada gente. Quem sabe, em um dia qualquer.. em uma janela qualquer, um reflexo nos apresente esse infinito de sentidos encantadoramente fora do real. Vidas reais.