Alzheimer - Um Depoimento
Sou hoje uma estrela solitária ilhada no universo da solidão. Vivo o último clarão de licidez pela penumbra de minha janela.
Já não diviso a linha da verdade ou da pura imaginação.
É isto: Uma herança que perde seu testamento, relíquias de minha história.
Das lembranças mais antigas, restam-me lampejos de uma boneca de pano deformada.
Nesse momento as portas se fecham e me resta procurar linhas coloridas para bordar o meu sudário.
Vejo o rosário a minha frente, mas não vejo a cruz para iniciar, mas eu creio!
Sei que na conta seguinte da bolinha se reza o Pai-nosso; Nas três contas seguintes, três Ave-Marias....o restante é no momento um mistério, uma lembrança apagada.
Restaurar na velhice a adolescência é para mim sobre-humano. Queria atar as duas pontas da vida, contudo algo esfacelou minha memória em labirintos esquecidos.
Mas tudo isso me parece confuso; talvez o fim.
Aqueles que tinha ao meu lado, são apenas sombras sem rosto. Não sei mais os seus nomes. Desapareceram sem ao menos dizer adeus ou qualquer coisas que me fizesse lembrá-los.
O tempo é curto, o relógio anda, o mundo não dá voltas redondas, tenho que bordar o meu sudário e um dia voltar ao pó, lugar de toda a pobreza humana.