Estórias de cantador/cordelista
Francisco Agripino de Alcaniz era potiguar de Ipanguaçu, poeta cordelista, repentista, conhecido em todo Nordeste brasileiro pelo apelido de "Chico Traíra (Traíra é um peixe de água doce muito comum nos rios, lagoas e açudes da terra nordestina) viajando em cima da carroceria de um caminhão juntamente com seu colega igualmente poeta repentista chamado "Patativa" (Patativa é nome de um pássaro de canto melódico e suave) escutou aquele companheiro reclamar da viagem em razão da trepidante estrada esburacada, dizer a frase adiante: "Traíra. Eu acho que a nossa viagem não vai ser muito sublime!” Chico Traíra pegou na deixa, dizendo no melhor da sua criatividade poética:
Se o amigo não está
Achando a viagem boa
Você é pássaro, eu sou peixe
Eu mergulho e você voa
Você volta para o ninho
E eu volto à minha lagoa.
De outra feita, na cidade de Areia Branca (RN) cantando com outro afamado poeta violeiro chamado Manoel Calixto, cantoria realizada na casa de um amigo, Traíra fora desafiado por Calixto com a seguinte estrofe:
Aviso ao dono da casa
Que não vá fazer asneira
Tenha cuidado em Traíra
Que ele tem uma coceira
Se não quiser que ela pegue
De manhã queime a cadeira.
Chico retrucou:
Você é que tem coceira
Dessas que rebenta a calça
Está tomando por dia
Dezoito banhos de salsa
Quando a coceira se dana
Num dia acaba uma calça.
Certa vez, Câmara Cascudo recebendo homenagens na UFRN, Chico Traíra, "o mestre do repente e da viola" presente, homenageou aquela figura [que se tornou, por merecimento, o escritor potiguar mais conhecido no mundo] com os versos seguintes:
Eis o doutor Cascudinho.
Que valoroso tesouro!
Lá no sertão também tem,
Cascudo, aranha e besouro.
Os de lá não valem nada.
Mas este aqui vale ouro.
Fernando Caldas