Primeiro amor

No vago silêncio de seu quarto, Ana se deitou, e forçou os olhos para dormir. Foi em vão, já que seu coração palpitava e suas mãos clamavam por alguma palavra que a fizesse entender aquela excitação.

Ela riu suavemente, com um olhar esquivo e sedutor, achando toda aquela ideia absurda, toda aquela sensação irreal. Levantou-se, fez um cigarro com o pouco fumo que tinha, pegou o café de manhã, já frio, e pensou. Pensou demasiadamente, mas quanto mais se esforçava, menos encontrava qualquer explicação.

Reviveu momentos tristes e felizes de sua vida, e uma lágrima verteu. Uma lágrima de contentamento e de temor.

Sabia bem que dali para frente nada seria igual, sua vida tinha acabado naquele instante, e outro ser surgia, com outros desejos, outros prazeres e outros medos. Mas ela gostou da sensação.

Voltou para cada exato minuto, cada ato mecânico e os improvisos de seu dia a dia. A ideia de morte nunca lhe foi tão amiga e natural.

“Fora simplesmente um engano meu?” ela pensava inquieta. “Mas não, não!” afirmava para si mesma. E de repente entendeu o porquê de tantos poemas, tantas musicas e tantos atos ridículos e até crimes em nome do amor.

Até então, ela mal sabia o que era o amor de mãe, já que nunca o possuiu. Também não encontrava justificativas para tantas falas bobas, toda a inocência e atos pueris.

No entanto, por mais que relutasse, não tinha volta, já não podia conter essa força desmedida, sem razão, sem qualquer justa adequação.

Ela fechou os olhos apenas para sentir novamente aquele olhar e o sorriso de viés que a fizera perder o chão.

E assim, nesse sonho vivido, ela se aquietou, finalmente suspirou e se acomodou entre o edredom.

Dormiu....como quem viveu a vida inteira acordada, porém nunca teve o deslumbre de um pôr do sol.